Ser publicitário e virar designer não é começar do zero.

Fernando Pereira
Jusbrasil Design
Published in
5 min readApr 24, 2020

Essa afirmação só veio depois de muitas dúvidas. E a principal delas era se eu deveria esquecer tudo o que aprendi até agora e começar do zero.

E isso me gerou insegurança. Uma insegurança não pela transição para a carreira que escolhi — que, aliás, nunca me senti tão seguro com ela. Mas por não saber se toda a minha experiência profissional anterior seria usada ou jogada fora. Anos investidos trabalhando, conhecendo o mercado, aprendendo, errando, acertando também… Esqueço tudo e começo do zero?

Enquanto eu pensava sobre esse “começar do zero”, em paralelo eu tentava sair dele quando o assunto era design, procurando aprendizado em livros, cursos, artigos, mais cursos, vídeos, workshops e… já falei cursos? Mas nada me respondia claramente se eu poderia ingressar na carreira de designer sem começar do zero.

Mas aí vai um “um a zero” pra você que está, como eu já estive, na fase de trocar a carreira na publicidade pela de design, e tem sido acompanhado dessa insegurança: Você não precisa esquecer tudo o que já sabe e começar do zero.

Esse ponto pra gente, não vem por uma fórmula ou framework mágico, que é só aplicar e dá certo. No meu caso, ele vem pelo que vivo no dia a dia, no meu papel de product designer do Jusbrasil e pela mudança do meu mindset de “eu vou começar do zero”, para “eu tenho muito mais do que zero pra poder começar”. Isso me levou a fazer alguns paralelos sobre o que eu exercia na direção de arte dentro de uma agência, com as etapas necessárias para um processo de design.

Aqui eu listo alguns desses paralelos que esse meu mindset me permite fazer.

O paralelo entre: discovery e entender o briefing.

Qual publicitário nunca reclamou de algum briefing? Sem culpa para os amigos do atendimento, mas isso acontece por vários fatores. O erro do cliente, a incoerência com o planejamento, a distração do atendimento, a falta de compreensão da própria criação…

Seja qual for o erro no meio do caminho, se isso aconteceu com você, o briefing teve que ser solucionado, de uma forma ou de outra, certo?! E pra isso, você usou seus recursos como: buscar contexto com quem está no job, qual o tom da marca, quais as características do produto e quem é o público-alvo. Você foi descobrir o que precisava. Você fez um discovery.

Em produtos digitais, possivelmente você vai precisar de um discovery maior, como conhecer o produto, o usuário, os concorrentes e outros diversos fatores desse processo. Mas aplicar o processo que você, em algum momento, já fez, não te faz começar do zero quando precisar resolver um desafio de design de produto.

O paralelo entre: benchmarking e buscar referências.

Algum dia você já recebeu um briefing e buscou referências para ter ideias de como solucioná-lo, em sites mais hype de design gráfico, no Oneshow, Cannes Lions, D&AD, os incríveis anuários do CCSP, ou qualquer outra fonte de referência que você usou, pense que esse exercício se assemelha muito à prática de benchmarking.

Essa é sim uma busca por melhores práticas, viabilidade de solução e conhecimento de como outras empresas solucionam o que você tem como desafio e aprendizado, o que é a base de um bom benchmarking. E você já fez isso. Não deixe essa prática para trás quando tiver que fazer um benchmarking voltado a produto digital.

O paralelo entre: insights e pensar em várias “ideias soltas”.

Se você trabalha em agência que tem o ritmo mais puxado, sabe que “não existe ter somente UMA ideia, pra nada” (já me disse um publicitário, dos bons). Você pensou em vários conceitos da campanha, possibilidades de como ela pode se comportar nos diferentes formatos, em roteiros… Se você fez isso, você exercitou uma etapa importante no processo de design: o insight.

Essa é uma etapa de olhar para toda a informação obtida até agora, pensar em vários caminhos, possíveis ou não de se implementar, a ponto de explorar o máximo de possibilidades, que poderão ser gatilhos para a sua ideia. É uma das etapas do processo criativo e você deve levar contigo e os Note Taking e os Crazy 8’s podem te ajudar bastante a aprimorar esse processo.

O paralelo entre: ideação e colocar as ideias no papel

Sua etapa de pensar em várias ideias soltas já passou e agora você tem os gatilhos para gerar ideias que podem atender ao briefing. Se você, assim como eu, pegou a fase da publicidade em que a aprovação de ideias com o diretor de criação e atendimento era por meio de rascunho do visual, dos títulos e conceitos, tudo na folha A4 e lápis, a ideação em design não vai ser problema pra você. Porque é assim que funciona o processo de ideação em design: colocar as ideias no papel para estimular a criatividade e mitigar tempo, antes de partir para uma concepção final da solução. Colocar as ideias no papel pode sim ser traduzido como desenvolver sketches.

E caso você não tenha pego essa fase na propaganda das aprovações em A4 e lápis, aqui tem um ótimo artigo que fala sobre como os sketches te ajudam a colocar as ideias no papel, no processo de design.

O paralelo entre: conversa com stakeholders e aprovação das ideias

O diretor de criação, o atendimento, o dono da agência, o cliente… todos esses que têm algum interesse e contribuição na solução criada para o briefing, você pode considerar como os stakeholders do seu projeto. E se você troca informações com essas pessoas sobre as decisões dos seus projetos na agência, saiba que você tem uma experiência na conversa com stakeholders.

Possivelmente, algum designer pode pensar que essa não é uma etapa obrigatória no processo de design, que ela não está mapeada em etapas de design thinking, etc., mas o meu dia a dia me faz discordar. Em cada projeto e em cada decisão de design, a conversa e o alinhamento com stakeholders é essencial. Não para aprovar uma ideia, mas para, juntos, trazermos informações que vão deixar a solução mais coerente com o desafio. A sua conversa com pessoas de diferentes backgrounds e áreas, vai contribuir com o alinhamento de expectativas e mais assertividade para o projeto. Leve isso contigo.

Mas trabalhar com design de produto é só isso?

Assim como o meu dia a dia me mostra esses paralelos, ele também me mostra que o design de produto é muito mais do que isso. Várias maneiras do processo de discovery, desenvolvimento de persona, cerimônias de design, métricas de produto e uma infinidade de novos frameworks, são coisas que você, pode ter certeza, vai ter pela frente. Mas a outra certeza (pelo menos pra mim) é que você não precisa esquecer de tudo o que sabe e começar do zero.

Se o design tem como um princípio ser centrado no ser humano, isso significa que o processo consiste em conhecer a pessoa pra quem você está desenvolvendo uma solução. E se tivermos um autoconhecimento e aplicarmos o que sabemos a favor desse processo, esses paralelos podem nos dar mais segurança e ajudar a construir soluções melhores.

E quais outros paralelos a gente pode fazer? Me conta. :)

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Fernando Pereira
Jusbrasil Design

Designer passionate about creating better services, digital projects and products for people.