Marcella Azevedo
JuX — Grupo de Pesquisa
5 min readSep 28, 2020

--

Pílula #8 — Tão famosos que você provavelmente nunca ouviu falar

Por Amanda Antunes e Marcella Azevedo

(…)

Números recentes apontam que há atualmente seis milhões de influenciadores digitais no mundo sendo que 313 mil deles são brasileiros. Estima-se que no país há pelo menos 84 empresas, entre agências, redes e plataformas, que atuam na promoção e gerenciamento de relacionamento entre marcas e influenciadores digitais (Quinalia, 2017). Um grande influenciador digital no Brasil ganha entre 50 mil e 150 mil reais por campanha no YouTube. Canais com menos seguidores chegam a conseguir entre um mil e cinco mil reais pelo mesmo trabalho (Caldas, 2017). A Celebryts, plataforma on-line que dá suporte às empresas na busca por influenciadores digitais junto a seu público consumidor, foi lançada há pouco mais de dois anos (a versão beta foi ao ar em dezembro de 2016) e já conta com mais de 50 mil influenciadores digitais brasileiros cadastrados e mais de 2000 empresas clientes e agências (Celebryts, 2018). Dados como esses apontam o crescimento e ganho de importância dos influenciadores digitais, agentes cada vez mais relevantes no marketing de influência.

Sem dúvidas, a celebridade exerce influência sobre o público que consome sua imagem, mas não somente por isso ela se enquadra no que vem se chamando de influenciadores digitais. Tampouco estes, por sua relevância e certa “fama” no universo digital, com alcance amplo ou restrito, podem ser conceitualmente caracterizados como celebridades. Fama e potencial de influência não são os únicos balizadores de tais fenômenos. Conforme já afirmou Alex Primo (2009b, p. 3), “não há nada errado em utilizar tal termo [celebridade] livre e informalmente, até mesmo como metáfora. Contudo, quando exige-se rigor na reflexão, como é o caso da discussão acadêmica, urge delimitar-se bem o conjunto conceitual”.

Sendo assim, o objetivo deste artigo é discutir as rupturas e continuidades na concepção e na prática desse fenômeno midiático que são os influenciadores digitais. Percebidos como “nova” categoria de sujeitos, eles vêm ganhando significativa relevância, tanto no discurso midiático, como nas práticas do marketing, disputando estes espaços com outras figuras notórias, como as tradicionais celebridades. Analisar as dinâmicas que caracterizam a atuação dos influenciadores digitais, assim como as relações simbólicas envolvidas em sua interação com o público pode se revelar profícuo para entender a procura cada vez maior das marcas por se atrelarem a esses agentes, na busca por um processo de endosso de produtos e humanização da marca, além de vínculos mais fortes com seus consumidores. Como pano de fundo, revelam-se questões de visibilidade, autenticidade e influência, em um contexto social transformado pela intensa presença da tecnologia nas práticas comunicacionais contemporâneas.

(…)

A proposta de analisar rupturas e continuidades entre essa ainda “nova” categoria dos influenciadores digitais e as já tradicionais celebridades, passa ao largo da simples oposição entre elas, ou mesmo da tentativa contrária, de “encaixar” os influenciadores digitais no rótulo das celebridades. O interesse, de fato, foi tentar entender aspectos e características intrínsecos a cada uma delas, assim como pontos de contato entre ambas, de modo a compreender o grande poder de sedução dos influenciadores digitais junto ao público e, mais ainda, perante as marcas, que estão cada vez mais migrando seus investimentos de comunicação dos grandes veículos da mídia de massa para canais e páginas de influenciadores que abrangem um público na internet bem mais restrito, porém de maneira mais engajada e duradoura.

Celebridades e influenciadores digitais, grosso modo, são indivíduos que se destacam diante do público em geral, formado por sujeitos comuns. Apresentam, portanto, um caráter de excepcionalidade, são peças de um sistema que explora tanto sua imagem quanto sua identidade. Possuem notoriedade, seja ela por meio da presença na mídia de massa ou a partir de uma audiência mais concentrada que, de qualquer forma, assegura certo poder de influência. Normalmente compartilham atributos positivos, que despertam a admiração do público e o interesse das marcas por se associarem a eles.

As celebridades midiáticas tradicionais costumam mobilizar grandes e concentrados investimentos de mídia de massa, de amplo alcance. Sua imagem é construída com base em sua personalidade midiática, despertando no público uma identificação de nível aspiracional. As campanhas de marketing das quais participam costumam ser permeadas por várias etapas de produção, cada um a cargo de um especialista diferente, o que leva a um maior tempo necessário para ir ao ar. A celebridade participa dando um depoimento sobre determinado produto ou marca, a partir de um script pré-determinado e de uma encenação que tem lugar em frente às câmeras. Ela se encontra em um lugar distante do público, como se ocupasse um pedestal imaginário, sendo alvo de grande admiração, que por vezes pode chegar à idolatria.

Já os influenciadores digitais atuam a partir de parâmetros diferentes. Individualmente, a maior parte deles recebe investimentos relativamente menores, uma vez que pulverizados entre diversos influenciadores. De modo geral, não se dirigem a um público amplo e massivo, mas a nichos específicos e coesos. Sua audiência é, sem dúvida, menor, porém seu poder de comunicação com ela é grande e com alto potencial de engajamento. Ao falar sobre determinada marca ou produto, o faz a partir de um depoimento tido como mais autêntico, que soa mais verdadeiro, porque, como se espera, é ele o principal responsável pela criação da mensagem, com sua linguagem e jeito próprio de ser. O influenciador digital concentra em si mesmo as diversas etapas da produção de uma campanha, é o criador do conteúdo que, por sua vez, será veiculado em canal próprio, o que ajuda a lhe conferir um caráter de verdade e de autenticidade e, também, assegura uma agilidade muito maior para uma campanha ir ao ar. Sua imagem perante o público é construída a partir de uma pessoa real, bastante próxima das pessoas comuns, despertando em sua audiência uma identificação de nível inspiracional.

A chave, portanto, que nos dá caminhos para uma maior compreensão do crescimento e ganho de importância dos influenciadores digitais parece ser sua grande proximidade com o comum, o ordinário, o cotidiano. Isso desperta a admiração do público, que o olha não em um pedestal, mas em um lugar, sem dúvida também cobiçado, mas onde se entende ser bastante possível a qualquer um chegar. Longe de despertar uma admiração pelo excepcional, o faz pelo autêntico, verdadeiro e real, mais próximo e acessível, ele é inspiração, que mostra que pode estar logo ali, a tão desejada realização.

--

--