Mary Katrantzou e a Bauhaus: 100 anos de fundação da escola alemã

Kaiqui Macaulay
KAIQUI MACAULAY
Published in
4 min readMar 29, 2020
Mary Katrantzou outono-inverno 2018

Em 2019 a escola alemã de design, Bauhaus, completou 100 anos de fundação. Ao longo de uma década a simplificação das formas, o uso expressivo das cores primárias e formas geométricas, a funcionalidade e o carácter industrial que caracterizava a produção artística dos seus integrantes vêm influenciando designers de vários campos da criatividade como a arquitetura, as artes gráficas e a moda.

Em 2018 a estilista grega Mary Katrantzou se inspirou na Bauhaus para o desenvolvimento da coleção outono-inverno daquele ano, apresentada na London Fashion Week. Intitulada The Interior Lives nessa ocasião a estilista contrapôs a estética modernista da Bauhaus com um oposto complementar: a era Vitoriana.

A partir da antítese Ornament is crime vs. ornament is everything, Katrantzou explora dois universos esteticamente imiscíveis em busca de um novo elemento híbrido, totalmente novo. A estilista não se inspira somente na moda que caracteriza cada período, mas também em todos os elementos característicos das artes aplicada e decorativa de cada época.

As semelhanças entre cada período também são exploradas, como no caso dos vestidos inspirados na técnica do pontilhismo, criada em 1886 pelos franceses Paul Signac e Georges Seurat. A técnica de pintura é análoga ao processo de impressão CMYK (ciano, magenta, yellow & black) que marcará as artes gráficas desenvolvida pelos alemães na prodigiosa escola de design.

A Bauhaus (em alemão, casa da construção) foi uma escola de design, fundada em 1919 pelo arquiteto alemão Walter Gropius na cidade de Weimar. Foi a primeira escola de design que propôs a união do ensino de artes, design e arquitetura como uma única expressão criativa, uma ideia utópica que respondia aos desejos do seu fundador que estava inspirado pelo movimento artístico inglês arts and crafts. A Bauhaus foi responsável pelo desenvolvimento da vertente alemã do movimento artístico mais influente do século XX: o modernismo.

Nomes conhecidos dessa escola são o pintor russo Wassily Kandinsky, o arquiteto estadunidense Marcel Breuer e o pintor suíço Paul Klee. Apesar de nascer com a intenção de ser uma escola de ensino multidisciplinar a Bauhaus é mais conhecida por suas contribuições ao desenvolvimento da arquitetura moderna.

Cartaz da exposição da Bauhaus em Weimar (1923) Joost Schmidt; Tensão suave nº 85 (1923) Wassily Kandinsky e Wassily Armchair (1925) Marcel Breuer.

Sendo uma das disciplinas criativas, a moda frequentemente revisita a estética modernista alemã desenvolvida na Bauhaus como já havia feito Mary Katrantzou na coleção primavera-verão 2011, Jonathan Saunders na primavera-verão 2005, Hugo Boss no outono-inverno 2015 e a Roksanda na primavera-verão 2013.

Mary Katrantzou primavera-verão 2011

Mary Katrantzou é conhecida principalmente pelo trabalho que desenvolve com estampados digitais. Em 2018 o museu de arte contemporânea de Dallas (Dallas Contemporary) dedicou uma exposição retrospectiva a sua carreira intitulada Mary, Queen of Prints.

Exposição Mary, Queen of Prints (2018) Dallas Contemporary

As 180 peças que integraram a exposição celebravam os 10 anos de fundação de sua marca homônima. Sobre a técnica que utiliza para desenvolver as estampas que lhe fizeram reconhecida Katrantzou afirma, “o print pode ser tão definitivo quanto um corte ou a forma e permite que uma mulher filtre a beleza encontrada no design de maneira subversiva. Todas as minhas impressões são desenvolvidas digitalmente. A impressão digital me permite experimentar a impressão de uma forma que as belas artes e outros métodos não puderam”.

A princípio a coleção outono-inverno 2018 se tratava de uma investigação sobre o mundo do interiorismo. Tapetes, carpetes, papéis de parede e outros padrões gráficos que caracterizam o design de interiores levaram a estilista a se inspirar exclusivamente na Bauhaus devido a semelhança dos padrões, assim como a funcionalidade que caracteriza a estética modernista da Bauhaus. Um dos elementos mais notórios ao longo da coleção são as formas geométricas, os textos e a diagramação característica dos cartazes das exposições da Bauhaus desenvolvidos por Joost Schmidt.

Sobre a relação da Bauhaus com a era Vitoriana Mary Katrantzou explica, “as raízes do modernismo estão na era Vitoriana, pois alguns estilistas como o inglês William Morris começaram a abordar nesse período a estética com uma ideologia abrangente que a Bauhaus chamaria de gesamtkunstwerk — uma obra de arte total”.

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Kaiqui Macaulay
KAIQUI MACAULAY

Journalist, master's degree in History of Art and Visual Culture (Universitat de València). Areas of interest: Contemporary Art | Queer | LGBTQIA+ | Fashion