O mundo lá fora
É uma pequena janela que existe aqui em casa. Nunca a vi fechada. Mesmo quando querem esconder nosso mundo do que existe lá fora, ela nunca cerra-se por completo. Parece até ter vida e decisões próprias, se é que realmente não as tem. E escolhe ser pra sempre aberta.
Todo o verde aqui da rua mora nela. E a luz que sempre entra, seja da manhã ou colada aos poste da noite. E o barulho urgente que insiste em ficar. Já ouvi quase de tudo de vozes sem rostos. Alegria, fofoca, drama, raiva, amor. A dor que jamais se apaga quando a razão vai embora. Dos que já foram dois. Dos que preferiram se deixar para depois.
Já ouvi o fundo do poço da mãe, entregue ao alcoolismo, choros na súplica do filho para que retornasse à vida com ele. A mulher que cansou das tantas vidas do marido. Os atrasados que tentam se encontrar vagando madrugadas. Meias conversas que preenchem o silêncio. E o matam com palavras vazias.
Assim, nesse lugar onde cabe o mundo todo, fico protegido, quase alheio. Qualquer hora sou eu quem passo por uma janela qualquer, invado-a com um riso espaçoso, e mantenho o encanto com que elas fantasiam a vida.
