Investimento de impacto conquista espaço no mercado

Frederico Plass Rizzo
Kria
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4 min readApr 3, 2017

Recentemente almocei com um empreendedor brasileiro aprovado para a próxima turma do mais disputado MBA do mundo, o de Stanford, na Califórnia. Ele me contou que uma enquete feita pela universidade com seus futuros 200 colegas revelou que quase metade quer trabalhar com negócios relacionados a empreendedorismo social ou a investimento de impacto depois do curso. Vindo do metro quadrado mais inovador do planeta, o dado põe em evidência uma classe de ativos ainda pequena, mas ascendente — cresceu 18% ao ano de 2013 a 2015 e, segundo o banco J.P.Morgan, pode ultrapassar o equivalente a R$ 1 trilhão em ativos sob gestão em 2020.

Segundo pesquisa anual do banco americano, mundialmente os setores mais representativos em investimentos de impacto são habitação (24% do total), microfinanças (14%) e energia (13%). Os aportes, ainda conforme o trabalho do J.P.Morgan, são feitos majoritariamente via instrumentos de dívida pura, em negócios em estágio de crescimento ou venture capital. A expectativa de retorno médio em operações de dívida em mercados emergentes é de 8,6% e para equity chega a 15,1% — e 81% dos fundos reportam performance em linha ou acima da expectativa.

No universo do crowdfunding de investimento, em vias de regulação pela Comissão de Valores Mobiliário (CVM) no Brasil, também não é novidade o fato de que uma grande parte dos investidores procure negócios que não apenas proporcionem retorno financeiro, mas também gerem retorno social. Pesquisa sobre o tema feita no ano passado por Kria e Din4mo mostrou que 54% dos investidores acreditam que o impacto social positivo é tão importante quanto o ganho financeiro.

Em 2016, R$ 2 milhões foram investidos no país por meio de plataformas eletrônicas em pelo menos seis startups que se enquadram na definição cunhada em 2007 pela Fundação Rockfeller — empresas, organizações e fundos com a intenção de gerar impacto social e ambiental mensurável juntamente com retorno financeiro. Entre elas estão empresas como o Programa Vivenda (de reformas para residências populares), que levantou R$ 450 mil com 52 pessoas em janeiro de 2016, quadriplicou sua receita trimestral ao longo do ano e iniciou neste mês de março uma rodada follow-on de até R$ 750 mil por “debêntures” conversíveis.

Mas não são apenas as startups ou os jovens privilegiados de Stanford que se preocupam com seus impactos na sociedade: também empresas de capital aberto, como Natura, Etsy e Triodos Bank, integram um movimento presente em 50 países e composto de cerca de 2 mil organizações conhecidas como “empresas B” (B-corps ou benefit corporations). Trata-se de um novo padrão societário que obriga os administradores a considerar interesses não financeiros entre suas responsabilidades fiduciárias. Na prática, em estados americanos como Delaware, essas organizações podem até ser processadas caso não cumpram sua missão social ou ambiental.

http://sistemab.org/

No Brasil, pelo menos sete fundos investiram um total de R$ 330 milhões em negócios de impacto nos últimos anos. Agora, também organizações sociais começam a utilizar parte dos recursos anteriormente dedicados exclusivamente à filantropia ou aplicados em instrumentos tradicionais de mercado (CDBs e afins) para investir em ativos alinhados com sua missão. Em outubro do ano passado, por exemplo, representantes de 17 dos principais institutos e fundações sociais do País criaram um grupo de trabalho para estudar como alocar R$ 1 milhão em empresas com metas sociais, mas fins lucrativos.

A iniciativa foi criada a partir da Força Tarefa de Finanças Sociais (FTFS), outro movimento global, iniciado na Inglaterra em 2000, que tem o objetivo de aumentar a atração de capital, o empreendedorismo e a inovação dirigidos à resolução de problemas sociais. Liderado mundialmente por sir Ronald Cohen, para quem “o investimento de impacto será o novo venture capital”, o movimento existe desde 2014 no Brasil, sob direção do Instituto de Cidadania Empresarial (ICE) e da plataforma Sitawi Finanças do Bem, e estabeleceu 15 recomendações para o desenvolvimento do campo das finanças sociais até 2020 — entre elas, o fomento a fundos de investimento de impacto, a regulação de estruturas inovadoras de investimento e o apoio ao progresso de um mercado de contratos de impacto social, em especial dos chamados social impact bonds.

Há certamente muito o que se avançar no campo das finanças sociais, mas as metas brasileiras para 2020 já foram traçadas pela FTFS, com destaque para R$ 50 bilhões em investimentos, 200 novos negócios sociais acelerados por ano e dez fundos de investimento dedicados ao setor. Espera-se que a CVM não deixe também de olhar para esse setor emergente, permitindo que organizações sociais liderem investimentos por meio de sindicatos — possibilidade hoje restrita a pessoas físicas — e recebam recursos via dívida pura — o que atualmente só é autorizado a empresas limitadas e a sociedades anônimas.

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