Grandes Figuras — Parte 1
Nico e Léo eram inseparáveis como o fogo e a fumaça. Se acaso encontrasse um dos dois sozinho, era certo que o outro logo apareceria. Nico havia acabado de completar nove anos e se achava quase um adolescente. Léo era um ano mais velho e tinha plena certeza que já adentrara a puberdade.
O mais jovem era magro e esguio, porém dono de uma agilidade e velocidade impressionantes para a idade. Léo, por sua vez, possuía um pouco mais de massa muscular, e uma altura bem superior à media, ao ponto de sempre ser o primeiro escolhido nas peladas da várzea. Contudo, o que lhe sobrava em força, faltava em inteligência. Nico sempre fora o mais esperto da turma, e usava dessa habilidade para aplicar trotes nos amigos.
Sua mais recente peripécia, e também a mais ousada, ficou conhecida dentre os moradores do município como a Caçada do Aruá. Até hoje não se sabe como Nico conseguiu levar um jacaré para dentro daquela cabana e, mais ainda, como convenceu todos os amigos a entrarem lá ao mesmo tempo. Morar próximo ao Rio Negro tinha suas vantagens, pensava o moleque travesso. Léo, como bom gato escaldado, preferiu observar de longe toda a movimentação em torno da pequena construção de madeira.
Assim que descobriram onde haviam se enfiado, criou-se naquela cabana um silêncio tão profundo que era possível distinguir apenas um punhado de respirações; os demais prendiam o fôlego, tamanho o pavor que sentiam. Menos de um minuto depois, seguiu-se uma gritaria generalizada e a corrida ensandecida de uma dezena de garotos em fuga, assustados e machucados após pularem as janelas e arrombar a porta da cabana.
Ao tomarem ciência do ocorrido, os pais das vítimas queriam esganar o pobre do Nico, e oferecê-lo como lanche para as piranhas. Ahh, mas ele nem era tão grande assim, pouco menor que uma jaguatirica. — disse Nico na tentativa de amenizar o ocorrido, mas aquilo apenas aumentou a ira tanto dos adultos, como das crianças. Sua mãe teve que pedir clemência, mas não sem antes ouvir uma hora de sermão, e obrigá-lo a se desculpar com os coleguinhas, agora já refeitos do susto.
Para Nico, o resultado da empreitada trouxe como prêmio um mês de castigo sem sair de casa para brincar, coincidentemente o exato período que faltava para o fim das férias escolares. Durante esse período, Léo foi o único garoto a visitá-lo. O cárcere forçado terminou por fortalecer a amizade dos dois meninos, que passavam as tardes conversando e imaginando mil aventuras fantásticas.
Após cumprida a pena de reclusão, Nico voltou a aprontar pequenas travessuras com a turma, que já havia esquecido a raiva que sentiam por ele, e acabaram por se divertir junto com o amigo. Entretanto, nada disso diminuiu o seu ímpeto aventureiro. E, acima de tudo, aquelas peraltices já não lhe satisfaziam. A curiosidade da infância queimava-lhe intensamente o coração, e nublava-lhe os pensamentos. Nico queria mais, muito mais. Ele queria voar…