Afinal, O Que É Um “Bom” Esperma?

O Tabuleiro
O Tabuleiro
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7 min readNov 4, 2015

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por Lucas Alves

Estiquei o braço esquerdo e, com a ponta do dedo indicador, toquei a tela do celular para desativar o alarme que me acordava às 9h30. Estava ansioso. Não era por menos: foram alguns dias de abstinência até aquela data. Durante a semana, tive de desviar meus pensamentos de qualquer coisa que pudesse me deixar excitado. Não podia bobear. Qualquer deslize me custaria caro.

Zarpei rumo ao centro da cidade de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, naquele sábado nublado de 24 de outubro. Desci do ônibus debaixo de um viaduto, subi um escadão cinzento e cheguei ao meu destino, a Avenida Lucas Nogueira Garcez. Lá fica um laboratório de análise particular. Naquela manhã, eu iria fazer um espermograma, que é um nome diferente para uma análise de sêmen.

Na maioria das vezes, quem faz esse tipo de exame está tentando engravidar há algum tempo e tem dificuldade. Se essa tentativa de gravidez é feita com acompanhamento médico e o casal já sabe que a mulher não tem nenhum problema de fertilidade, pode ser que o homem tenha alguma condição adversa. É necessária abstinência sexual de 3 a 5 dias, para o organismo “entregar” o esperma nas condições normais. A maioria dos centros médicos que realizam exames oferece a análise do espermograma. A minha saiu por R$ 70.

Cheguei ao local e entrei na primeira fila que vi. Uma atendente perguntava, pessoa por pessoa, qual era a finalidade da visita. Quando chegou a minha vez, tentei falar baixinho para ser bem discreto. Indiferente, ela me encaminhou a outra fila, na qual ganhei a senha P 259.

Fiquei constrangido ao ter que explicar para mais duas atendentes o porquê de eu estar ali. Era o mais breve possível na explicação: “Quero saber se sou fértil”, eu mentia enquanto colocava a mão sobre a bancada com a aliança prateada. Namoro há dois anos mas tenho só 20, nem passa pela minha cabeça a chance de ter filho. Tentei evitar o máximo de contato visual possível com as funcionárias. Um silêncio incomum pairava naquela sala de espera lotada de gente.

Como é um exame rotineiro e não exige nenhuma urgência, fui aguardar nas cadeiras com o resto do pessoal. Cada uma com o smartphone na mão. Fiquei tranquilo. Os olhares indiscretos que tentam imaginar o porquê da outra pessoa estar ali tinham sido suprimidos pela tecnologia. Eu lia uma revista até que gritaram meu nome.

Quem me recebeu no box 4 da ala de exames foi o jovem enfermeiro Damiã, branco, de barba cerrada e óculos preto. A área de coleta de exames em geral para adultos era separada da ala infantil, o que me pareceu bem sensato levando em conta o que eu estava prestes a fazer. Ele tentou jogar conversa fora para deixar a situação menos embaraçosa, mas não tinha como. Ambos sabíamos o que eu teria que fazer dali a pouco.

Damiã me entregou o pote no qual eu deveria gozar dentro e um outro pote para não deixá-lo visível. Ele caminhou comigo até o local de coleta, um banheiro ao final do corredor. Abriu a porta, me mostrou as instalações e se despediu. Quantas pessoas ele já não deveria ter levado até aquele recanto obsceno…

Grandes atrações. Foto: Lucas Alves

Quando entrei no banheiro e olhei em volta, fiquei decepcionado. Era pouco iluminado, com um espelho grande e uma cadeira confortável — claro, além do vaso sanitário. Minha única inspiração era uma lástima: um televisor de 21 polegadas que exibia o DVD da Playboy “Melhores Making Offs — Volume 13”. Não havia um controle remoto para que eu pudesse dar play no vídeo. Também não era algo que despertava tanto o meu interesse. Mas, sabendo que poderia encontrar dificuldades, fui preparado. Saquei o smartphone do bolso. A internet é um poço de perdição. Rodei cuidadosamente com os dedos da mão esquerda a fechadura para garantir que não haveria perturbações e tranquei a porta.

Quatro dias depois saiu o resultado do exame. Meus garotos sabem nadar.

Foto: Reprodução

Tudo dentro do considerado “normal”, que é estipulado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) desde 2010. A cor (cinza opalescente!), o volume que deveria ser acima de 1.5 ml ficou em 4, e uma quantidade que em um breve cálculo me fez concluir que só naquela brincadeira foram impressionantes 280 milhões de espermatozoides. Sorte que eles não contaram um por um (a análise é feita por amostragem, com apenas algumas centenas deles). Quanto à motilidade, que significa a capacidade de locomoção, bom desempenho de 80% (o normal é igual ou superior a 40%) e na morfologia, que é o aspecto físico, tive 47% deles ovais, considerada a forma normal (o certo é ter 30% ou mais).

Ainda assim, cheio de curiosidade, resolvi contatar um mestre na área que soubesse de tudo sobre esperma. Foi então que encontrei o Dr. Augusto Barbosa Reis, membro do Departamento de Reprodução Humana da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) desde 2003, ele também é professor de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Nascido e criado em Belo Horizonte, o doutor tem 46 anos e é pai de um menino.

A medicina sempre esteve na família. O pai, Paulo, herdou a farmácia do avô, e quando criança Augusto passava boa parte do tempo dentro desse ambiente cercado por remédios de todos os tipos.

Hoje, professor desde 2007, Augusto gosta de dar aula e de ser pesquisador. Senti firmeza quando disse a ele que eu poderia fazer alguma pergunta que soaria fácil demais. “Falo para você igual falo para os meus alunos, não tem pergunta boba”.

“O sêmen é um meio de proteção e nutrição para manter o espermatozoide vivo”

Primeiro, o doutor me explicou a verdadeira função do esperma. “O sêmen existe porque é um meio de proteção e nutrição para manter o espermatozoide vivo. Ele é o veículo que vai conduzi-lo até a vagina”. Ele também contou que o líquido seminal possui vários nutrientes, como açúcares, proteínas, aminoácidos e cálcio. Mas de onde vem tudo isso? Segundo ele, os três líquidos que compõem o esperma vem da vesícula seminal, da próstata e dos testículos, e se misturam na hora do orgasmo. Diariamente, um homem produz uma média de 20 milhões de espermatozoides.

Augusto afirmou que o homem que tem as características do esperma dentro dos critérios da OMS tem potencial para ser fértil. No entanto, há uma queda ao longo das últimas décadas na produção de espermatozoides que a entidade aceita como “normal”. Isso seria resultado da mudança das condições de vida, como atividade de trabalho e alimentação, de acordo com o urologista.

“O homem é responsável por metade das causas de infertilidade”

Segundo ele, o homem é responsável por metade das causas de infertilidade. “Não existe a cultura do jovem que começa a vida sexual de procurar um urologista pra avaliar se é fértil ou não. O mais comum é que casal que comece a tentar engravidar e tem dificuldade venha procurar”, contou. O doutor Augusto considera o espermograma um exame obrigatório para se fazer antes do casamento.

Questionei o doutor Augusto se existe algum problema caso o homem ejacule várias vezes em uma mesma relação, mas ele disse que a única coisa notável é que o volume vai diminuindo a cada vez. Aliás, o professor disse que qualquer problema relacionado ao esperma, como baixa contagem de espermatozoides, não é uma doença, e sim um sinal que o urologista vai procurar depois qual a condição que está levando a essa alteração. (ver box ao lado).

O doutor Augusto acrescentou que a espécie humana tem uma fecundidade muito baixa comparada a outras. Enquanto nós temos 20% de chance de engravidar em uma relação comum, roedores e bovinos possuem, respectivamente, 80 e 90% de chance. Ainda assim, um casal de pessoas só é classificado como infértil se após um ano de tentativas, não conseguirem engravidar.

Uma última curiosidade tinha ficado na minha cabeça. Será que algum homem que já fez o espermograma teve uma reação positiva ao descobrir que não consegue engravidar uma mulher e que poderia transar sem ter essa preocupação? Diz o doutor que nunca viu tal reação. “Geralmente os homens se sentem frustrados, o que tem muito a ver com a questão da masculinidade. No primeiro momento eles sofrem muito com essa notícia. No caso do jovem também, há um desejo de ser pai no futuro”.

5 hábitos que interferem na qualidade do esperma

1. Notebook no colo

A exposição do corpo do homem a uma rede próxima de wi-fi danifica a qualidade do esperma. A pesquisa foi divulgada pela revista científica Fertility and Sterility. Consultado, o doutor Augusto Barbosa Reis disse que o calor provocado pelo contato do aparelho no colo interfere na temperatura do escroto, o que prejudica a produção de espermatozoides.

2. Alimentação

O que se ingere é muito importante para garantir um bom sêmen. Checamos pelo menos três tipos de comida que podem melhorar a qualidade do esperma: peixe, devido ao Ômega 3; nozes e ostras. Nada muito barato, mas vale a pena o investimento.

3. Cigarro

Fumantes tem 10% mais chances de serem inférteis do que não-fumantes. O fumo também pode causar dano ao DNA do esperma e por em risco a vida do bebê.

4. Álcool

Alcoólatras gozam menos, com menor qualidade, motilidade . Se deseja ter filhos, já sabe: é melhor deixar a bebida de lado.

5. Estímulos diferentes

Uma pesquisa feita neste ano por pesquisadores do estado de Ohio, nos Estados Unidos, pediu que 21 homens se masturbassem para o mesmo vídeo pornô durante uma semana. Após as coletas, no último dia da pesquisa, foi solicitado que eles se mastubrassem novamente para um vídeo pornô com uma atriz diferente. Resultado: eles gozaram mais e com qualidade maior.

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