Quando vamos acordar? ou Como vamos sair da Normose?

Angela Schmidt
La durabilité
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5 min readOct 26, 2020

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Foto de Gerd Altmann por Pixabay

Hoje escrevo sobre um termo que ilustra a percepção que tenho já há um tempo, mas que agora, neste momento de pandemia está mais evidente — Normose. Termo criado por Jean Yves Leloup na França, e por Roberto Crema, no Brasil.

Segundo Roberto Crema, Normose pode ser descrita como:

“uma patologia da normalidade (1*) que se traduz por um conjunto de comportamentos, atitudes e hábitos dotados de consenso social e patogênicos em diversos graus de gravidade.”

A reflexão que faço a partir da normose faz parte do seleto grupo de “Coisas que realmente importam na Vida”, e nos leva na direção da resposta àpergunta do título: Quando vamos acordar?

Olhando mais de perto, podemos também tratar da questão através das seguintes perguntas:

Imagem de stokpic por Pixabay

Quando vamos perceber e romper a normose que estamos imersos, e de onde seguimos anestesiados e desacordados para tudo que dá o real valor a nossa preciosa Vida?

Como podemos romper esta anestesia e mudar o rumo de nossa caminhada de despertar individual e coletivo?

Onde buscar conhecimento e suporte para encarar de frente este enorme e desconfortável desafio?

Um primeiro passo certamente é entender mais a fundo o que está sendo falado quando usamos o termo normose. Para isso indico o artigo de Roberto Crema que apresenta conceitos e referências: Além da Normose, a Patologia da Normalidade.

Indico também a palestra de Lama Padma Samten que fala sobre os desafios pessoais e coletivos do momento de transição que vivemos: Um novo começo? Desafios da transição: quatro pontos de vista sobre recomeçar.

Na prática, quero partilhar algumas ações que trago para minha vida ,e que podem ilustrar e inspirar você encontrar a suas soluções para caminhada no processo de despertar. Acredito que a solução sempre começa por dentro, pelo meu mundo interno. E é a partir desta visão que construí ao longo do tempo um kit de primeiros socorros, ao qual recorro sempre que percebo me afundando no torpor e alienação. Tenho na minha maletinha coisas como:

1 — Encontrar a ação que posso fazer imediatamente, que tenho em mais alto valor e que me faz sentir realmente fluindo na direção do Cuidar Da Vida. Para mim, em geral isto envolve salvar vidas de animais próximos ou de plantas. Algo do tipo, ajudar aquele inseto preso em minha janela conseguir sair para a rua… simples entende? Mas totalmente significativo para aquele ser que acabou de ser libertado… Ou então, plantar no canteiro mais próximo uma semente e seguir cuidando da planta… Ou ficar um dia sem comer carne… Cada um pode encontrar o que lhe toca mais.

2 — Ainda na direção do Cuidar Da Vida, por vezes busco alguma iniciativa que eu possa contribuir de forma online, seja com meu tempo, seja financeiramente.

3 — Busco por ações do que chamo de arte engajada. Intervenções artísticas que através da poderosa linguagem artística jogam luz em temas humanitários, ambientais ou de desenvolvimento humano, contribuem para quebrar nosso dia a dia distraído. Quando encontro algo assim, primeiro eu me nutro, depois eu espalho a inspiração….. para que outras pessoas também tenham este momento de respiro, de luz, em seu dia a dia por vezes pesado e sombrio….

4 — Mantenho atenção nos meus hábitos pessoais e domésticos e estou sempre expandindo para formas mais sustentáveis de vida. Coisas tipo cuidar dos resíduos, estar atenta a forma de produção e impacto socioambiental dos meus materiais de limpeza e uso pessoal; consumir de produção local de preferência orgânica ou de agricultura familiar, e toda esta lista de micro-revoluções que já são muito bem documentadas na internet…

5 — Coloco em prática da melhor forma possível meu caminho de evolução pessoal, no meu caso, meu caminho espiritual, fruto de anos de busca criteriosa. E, para quem não tem um caminho identificado, recomendo que reserve um tempo de qualidade para pensar e pôr em prática os ensinamentos que falam de amor, compaixão e sabedoria.

É claro que, somente as micro-revoluções não são suficientes para uma transformação sistêmica e ampla. É preciso também voltarmos nossa mais alta inteligência para construir a transição do todo o sistema capitalista para outras formas em prol da vida e do viver coletivamente. Temos de encontrar outra forma de sermos e vivermos enquanto espécie que partilha seu lugar com muitas outras formas de vida. Isso não pode ser algo legado a dimensão de uma opção pessoal, de um adendo para quando der tempo ou vontade. Ou seja, nosso melhor e mais inteligente olhar tem de abraçar a dimensão política (no sentido da arte de se relacionar) e econômica, do micro ao macro sistema. Dentro do meu kit de primeiros socorros também tenho este tipo de ferramenta.

Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

No entanto a inspiração hoje me levou na mesma direção das orientações de segurança que escutamos nos aviões: em caso de emergência coloque primeiro a máscara em você, depois ajude quem mais puder. Ou seja, hoje trouxe um pouco do que considero urgente e essencial para que cada um de nós esteja apto a sobreviver ao perigo que nos encontramos. Para que além de sobreviver tenhamos condições de ser suporte a quem mais necessitar!

Encerro citando novamente o escrito de Roberto Crema (1*) que chama atenção para o ponto de partida a transformação em prol da vida que necessitamos:

O que nos evoca os heróis da mitologia universal é o percurso iniciático indispensável em direção a uma plena realização do potencial humano. Lúcida coragem de transgredir a enfermidade do trivial e da mediocridade, ou seja, a normose. Confrontar-se e ousar um voo além da normose é imprescindível e representa o desafio árduo da aventura evolutiva, no processo iniciático do indivíduo assumir a condição de autoria, como sujeito da própria existência.

Referências (1*)

Weil, Pierre; Leloup, Jean-Yves; Crema, Roberto. Normose, a patologia da normalidade. Campinas: Verus, 2003; Petrópolis: Vozes, 2011.

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Angela Schmidt
La durabilité

Mediadora e facilitadora da sustentabilidade em todas as dimensões, materializando-a em ações no cotidiano de pessoas, grupos e empresas.