A letra e o lettering
Uma breve história da tipografia no cinema
A tipografia sempre ajudou o audiovisual a enriquecer suas narrativas. Seja nos títulos e sequências de abertura ou nos letterings incidentais, as duas artes andam de mãos dadas desde os tempos do cinema mudo. Uma união que não para de produzir imagens e sequências incríveis.
Nessa edição do La Scena, vamos acompanhar como que se deu a sua evolução.Vem com a gente!
No princípio ninguém falava nada
O cinema em sua fase muda precisava da tipografia para ambientar seus espectadores. Uma cartela logo no início de cada filme informava o título da obra. Repare nos exemplos abaixo que a escolha/concepção da fonte já dava pistas do tipo de história que viria a seguir.
Incidentalmente, cartelas substituíam as falas dos personagens, assim como serviam para contextualizar algumas cenas dentro da história do filme.
Mas, como sempre em qualquer campo da história, algumas pessoas pensavam além e, por serem assim, criavam novas técnicas que mais tarde se tornariam linguagens.
É o caso de James Stuart Blackton, cujas experimentações no início do século XX levaram ao desenvolvimento das animações, incluindo suas sequências de aberturas.
De repente todo mundo começou a falar
Com o advento do cinema falado, saíram de cena as cartelas que representavam as falas dos personagens, mas nenhum grande avanço na animação das sequências de abertura propriamente ditas foi feitas nos filmes dos anos 1920, 1930 e 1940.
A tipografia estática, por sua vez, se sofisticou e acompanhou várias das tendências da época, como art déco, expressionismo, modernismo, entre outras escolas artísticas que surgiam e ganhavam destaque.
E tudo ia seguindo essa mesma toada até que, em meados da década de 1950, algo aconteceu e mudou para sempre a forma como os filmes seriam apresentados.
Seu nome era Saul Bass
Lançado em 1955 , o filme O Homem do Braço de Ouro contava com Frank Sinatra e Kim Novak em seu elenco e com uma trama envolvente baseada em escolhas. Mas o que garantiu sua entrada na história do cinema não foi nem o desenlance dos conflitos de seu personagem principal, nem a direção precisa de Otto Preminger. Foi a sua abertura.
Desenvolvida por Saul Bass, sua animação simples (aos olhos de hoje) abriu novas perspectivas, criando quase que uma espécie de nova forma de arte — da qual ele se tornou seu maior mestre — e que chamou a atenção de ninguém menos que Alfred Hitchcock.
E a parceria Hitchcock/Bass rendeu as sequências de abertura de três dos maiores clássicos do cineasta inglês: Um Corpo Que Cai, Intriga Internacional e Psicose.
Mas Saul Bass, que frequentemente trabalhava com sua esposa Elaine, também emprestou seu talento para diretores como Billy Wilder, Stanley Kubrick, Martin Scorsese, entre outros.
A porta então se abriu
E depois de Saul Bass, as aberturas de filmes nunca mais foram as mesmas. Seu contemporâneo Maurice Binder fez história criando nada menos que 14 aberturas dos filmes de James Bond. A começar por 007 Contra o Satânico Dr. No, de 1962.
Em parceria com Arcady, Maurice Binder desenvolveu também as letras dançantes na abertura de Barbarella, de 1968.
Outra abertura que merece destaque é a do filme O Sol É Para Todos, de 1962, desenvolvida por Stephen Frankfurt.
E independentemente do gênero do filme, as aberturas passaram a ser consideradas parte essencial da narrativa cinematográfica.
Aí chegaram os computadores
A década de 1990 testemunhou o começo de um processo irreversível no universo cinematográfico — a digitalização. E as inúmeras possibilidades criativas que a dupla hardware e software trouxeram para designers abriu um novo capítulo na história das sequências de abertura.
Que o diga a abertura de Seven — Os Sete Crimes Capitais, de 1995, considerada pelo New York Times como uma das mais emblemáticas da história do cinema.
Prenda-me Se For Capaz, de 2002, utiliza animação 2D minimalista como base para um verdadeiro balé de nomes e funções que impressiona até hoje.
Já Obrigado por Fumar, de 2005, explorou o design dos pacotes de cigarro para apresentar seus créditos iniciais.
A tipografia pode também cumprir outros papéis em uma narrativa audiovisual. Em Mais Estranho Que a Ficção, de 2006, os letterings no início do filme reforçam a voz da narradora e ainda geram imagens bacanas, que dialogam com o que está acontecendo na tela.
O filme Scott Pilgrim Contra o Mundo elevou esse conceito à enésima potência, trazendo para dentro do filme as estéticas dos games e dos quadrinhos, pontuando diversas situações vivenciadas por seus personagens.
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Bom, para finalizar, um vídeo que resume tudo isso que a gente falou aqui em pouco mais de dois minutos. Só apertar o play ;)
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