SOCIEDADE

O racismo à la jeitinho brasileiro

Das favelas ao asfalto: a violência policial e a súbita comoção da elite brasileira com a população negra

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Elânny Vlaxio, especial para o LabF5

A cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil, totalizando uma média de 63 mortes por dia. Esse é apenas um dos dados registrados pela campanha Vidas Negras, lançada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2017.

Até poucos dias atrás, o mito da democracia racial ainda era questionado. A crença do somos todos iguais, empurrando o “moreno” e o “mulato” para o silenciamento do negro e sua história. Não é difícil enxergar o que está escancarado: num lugar onde a raça e a cor são fundamentais para entender que no país do futebol, a violência já elegeu uma pele-alvo.

Foi necessário o assassinato de George Floyd, homem afro-americano de 46 anos, para a elite branca brasileira se comover ao que parece ser cotidiano nos noticiários do país. As manifestações antirracistas que no momento tomam conta da imprensa mundial, em paralelo à pandemia de Covid-19, resultaram em uma onda de protestos e hashtags, entre elas o Vidas Negras Importam.

Segundo dados do Atlas de Violência de 2017, o negro lidera com 23,5% a mais de chance de ser assassinado em relação a brasileiros de outras raças. A luta antirracista não é apenas um momento no qual, de uma hora para outra, você posta uma foto com um quadro preto — a exemplo do blackouttuesday — nas mídias sociais e de repente tudo se resolve.

O racismo mata: ontem nas senzalas e hoje nas periferias, na falta de saneamento básico das favelas, na insuficiência de leitos do Sistema Único de Saúde (SUS), e naquilo que é chamado pelo filósofo Achille Mmembe de necropolítica , isto é, o poder do Estado de julgar quem deve morrer e quem deve viver. Já se passaram 19 anos, e o trecho “olha quem morre e veja você quem mata”, da canção “Negro Drama” do grupo Racionais Mc’s, ainda é realidade no Brasil, evidenciada semanas atrás pelo assassinato e sequestro de João Pedro, no Rio de Janeiro. Foram mais de 70 tiros na casa do adolescente, disparados por um agente do estado. Quantos mais precisarão morrer? Corpos atingidos por balas, por doenças, contaminados por patrões que não os dispensaram do trabalho.

De acordo com o Instituto de Segurança Pública, houve um aumento de 13% nas mortes por intervenção policial no Rio nos dois primeiros meses marcados pelo coronavírus em comparação com o mesmo período de 2019. Casos como o de João Pedro se repetem todas as semanas, e são apenas a ponta de um iceberg bastante antigo.

Dados sobre a violência contra Negros no Brasil (Divulgação/Internet)

Embora o Brasil não tenha sofrido com leis de segregação tão rígidas como nos EUA, a história marcada pela escravidão e o racismo estrutural é compartilhada em ambos os países, resultando em um sistema que diariamente exclui e banaliza corpos negros. Em uma nação na qual o atual presidente já foi denunciado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sob acusação de racismo contra quilombolas e indígenas, as manifestações e a luta antirracista devem ser fortes e mais frequentes do que nunca.

A mudança deve acontecer de dentro para fora, e não pode se limitar a postagens de efeito nas mídias sociais contra o genocídio da população, posto que o problema é estrutural na sociedade e não apenas midiático. Nesse sentido, torna-se imprescindível reconhecer os privilégios de quanto mais clara a cor da pele mais oportunidades terá o indivíduo e, sobretudo, entender que durante muito tempo direitos foram negados para a população com as peles mais escuras.

Seja antirracista, é bem simples! Escute artistas negros, consuma filmes produzidos, dirigidos e atuados por negros, leia autores negros, incentive e apoie negros. Na dúvida, pesquise mais informações confiáveis, procure conhecer a história de heróis e heroínas do seu país, e, acima de tudo, nunca se cale diante do racismo.

Em memória de: Evaldo, Christian, Kauan, Marielle, Anderson, Amarildo, Ágatha Félix. Kauê dos Santos, Jennifer Gomes, Kauã Rozário, Kauã Peixoto, João Pedro, Miguel Otávio e tantos outros que nem sequer saberemos seus nomes pois viraram números.

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