Onde “cê” vai BH: retratos da agenda cultural da cidade
Por Hiago Martins, Lara Moreno e Yasmin Lombardi
Quem define o que é o Jornalismo?
O futuro já está aqui. É inegável que os “jornalismos” não estão mais retidos entre as paredes das tradicionais redações. A mídia é o palco principal, a construção de imagens, sentidos e significados são mediadas por ela. Os meios de comunicação em massa acompanham o desejo da sociedade pela transmissão de informações, interação com os conteúdos e com seus produtores, além da possibilidade de gerar conteúdos. É neste ponto que a junção entre a mídia e o jornalismo é um tanto quanto curiosa e diversa, manifestada, principalmente, na versatilidade dos profissionais da área. Dentro desse cenário, há aqueles que buscam formas de mostrar a vida cultural de Belo Horizonte, como o PulaBH, Sou BH e AdoisBH.
Sobretudo após o período pandêmico, a relação das pessoas com a internet se intensificou devido ao isolamento e falta de interações sociais. Mas o ambiente digital já ganha espaço a mais tempo, gerando inclusive a migração de muitos profissionais do jornalismo das redações para outros meios de divulgação de seus trabalhos, sobretudo o Instagram. A expansão da atuação para fora dos meios tradicionais possibilita que a informação seja mais acessível para públicos que cada vez mais se distanciam das mídias tradicionais e se aprofundam nas redes sociais. Mas isso não significa que todas as redações foram abandonadas, elas ainda coexistem com esse aspecto da modernidade, como no caso do SouBH. Apesar disso, já existem veículos que sobrevivem inteiramente no ambiente das redes sociais, como é o caso do AdoisBH e outros que coabitam no Instagram e em site próprio, mas que não necessariamente contam com uma estrutura robusta característica dos escritórios tradicionais, como é o caso do PulaBH.
Assim, utilizando-se da diversidade de elementos possíveis para se construir uma narrativa, as conceituações dos “jornalismos’’ se expandem para um segmento em crescimento ao mostrar o que está acontecendo em Belo Horizonte através tanto de meios tradicionais, como de meios em ascensão. Nesse desafio, os produtos apresentam particularidades, semelhanças e diferenças ao mostrar a capital mineira. A partir disso o objetivo é entender como eles funcionam e conseguem se manter vivos.
Diversidade de estruturas na agenda cultural
Diversas são as formas de falar sobre a cena cultural ao redor da cidade, as possibilidades de enquadramentos e abordagens, além da diversidade de eventos acontecendo simultaneamente. Para tantas variações há diferentes produtos de agenda cultural a fim de agradarem qualquer tipo de público.
Um modelo de produto existente para essa finalidade é o Sou BH. Desde 2010, o SouBH vem fomentando a cena cultural de Belo Horizonte. Um dos maiores projetos de agenda cultural da cidade, começou de forma independente, tomou grandes proporções e hoje faz parte do maior conglomerado de comunicação de Minas Gerais, sendo parceiro do Portal UAI. Com mais de 250 mil seguidores no Instagram e mais de 1 milhão de pageviews, o produto busca atingir um público mais abrangente, que varia desde a população com menor poder aquisitivo até pessoas que frequentam lugares mais requintados e caros. Desta forma, seu conteúdo varia entre temas culturais, de lazer e entretenimento.
Além disso, há também o Pula BH, que aposta em uma proposta diferente para abordar os eventos ao redor de Belo Horizonte. Os primeiros esboços datam de 2014 quando Paloma Morais, a idealizadora e atual responsável pelo projeto, estava cursando jornalismo no Centro Universitário UNA. A página surgiu como um trabalho acadêmico, em que foi proposto aos alunos que acompanhassem alguma manifestação cultural, que estivesse acontecendo naquele momento, em Belo Horizonte. Paloma escolheu o carnaval, acompanhava os blocos e postava no perfil do Instagram onde ela estava e o que estava acontecendo naquele local. A aderência do público foi imediata e uma hashtag #PulaBH foi criada e, com isso, os seguidores contribuíram com o crescimento da página, e futuramente com a continuidade do projeto. Atualmente, o PulaBH reúne mais de 60 mil seguidores no Instagram, além de um site com domínio próprio.
Há também o estilo desenvolvido pelo AdoisBH, muito presente em diversas páginas na internet atualmente. Uma das pioneiras no ramo de divulgação da cena gastronômica da cidade, data do início em abril de 2015, sobrevivendo desde lá até os dias atuais através exclusivamente do Instagram. Antes com postagens voltadas somente para a culinária japonesa, agora já abrange os mais variados tipos de cozinhas para o público de casais e famílias. Ao longo dos anos, o retorno positivo do público fez com que novas categorias surgissem para além de dicas de bares e restaurantes em BH e região, passando a abranger também outros tipos de passeios e até viagens.
Site x Instagram
Os projetos de agenda cultural da capital mineira utilizam as plataformas digitais como uma forma de divulgação dos eventos e principais locais de interação social espalhados na cidade. Ao aproveitar as redes sociais como parte da divulgação de um eventos, restaurantes e projetos ao redor da cidade, proporcionam ao público a experiência de acompanhar os acontecimentos e formalizar, mesmo que parcialmente, suas opiniões antes mesmo de comparecer aos locais presencialmente. Essa curadoria representa exatamente a necessidade contemporânea da comunidade por informações já prontas.
O PulaBH explora mais de um formato para divulgar as recomendações apuradas, sendo utilizados tanto no Instagram como em um site próprio. Hoje a quantidade de publicações diárias feitas na rede social oscila entre 2 a 3 por dia e trazem consigo uma identidade visual característica, com edições de fundo em vermelho a cada duas imagens postadas. Todas as informações necessárias para conhecimento dos eventos são disponibilizadas na legenda dos posts e são de fácil entendimento por todos que acessam o veículo.
Já o formato aderido no site contém uma divisão dos temas em tópicos, sendo eles eventos, dicas do pula, carnaval, exposições, dentro do bolso, cinema, publi, teatro, música e oportunidades. A produção neste veículo por sua vez é feita em formato de textos discursivos, que abordam com uma camada de profundidade extra o espetáculo divulgado, apesar de não ser o meio mais acessado pelos internautas para adquirir a informação que buscam.
Devido à velocidade com que se acessa uma página de rede social e também pela leitura mais dinâmica, característica do imediatismo que permeia as sociedades atuais, o Instagram é o principal meio de divulgação do trabalho que Paloma desenvolve no Pula BH. Em entrevista com ela, contou que sua visão comercial para desenvolvimento da página começou quando foi premiada e percebeu a magnitude que estava tomando.
“Eu não tinha noção das coisas, demorou muito para essa ’fichinha’ cair e agora que ela caiu, eu tento ter um olhar mais comercial. Eu consigo ver as pessoas como números, como métricas, e antes eu não conseguia ver isso e acho que isso hoje em dia me ajuda a vender o Pula”, conta Paloma.
Não só para ela funciona dessa maneira, o AdoisBH com sua origem diretamente no Instagram, sobrevive desde 2015 na plataforma devido a essa visão mais comercial da produção de conteúdo, e por isso, o site não teve continuidade. Os posts possuem uma linguagem mais coloquial, com muitos emojis e chamadas atrativas, tudo para que seus seguidores sintam-se sempre convidados a participarem dos eventos e locais divulgados, sempre pensam na acomodação das famílias e de seus amigos. Mas, é importante ressaltar que não abandonaram totalmente o conteúdo para casais, ocasionalmente são publicados restaurantes e eventos para curtir a dois.
Os responsáveis pelo AdoisBH, através de estratégias comunicativas, transformam a publicidade em algo mais próximo do consumidor, ou seja, humanizam as propagandas aproximando os locais divulgados do consumidor, incentivando-os a interagirem e criarem relações afetivas com os espaços. É comum perceber entre os comentários das publicações na página do AdoisBh, seguidores compartilhando as informações com seus amigos e familiares, geralmente acompanhado por frases como: “Olha que lugar legal para irmos com as crianças”, “Nossa minha filha vai amar esse lugar”, “Vamos de galera”, entre muitos outros.
Com vídeos e fotografias, os criadores de conteúdo do AdoisBH procuram sempre incentivar a interação do público mensalmente, por exemplo, a publicação do dia 2 de junho vem como uma pergunta: “Qual o melhor caldo de BH”? ou a publicação do dia 6 de maio: “Qual o melhor bar/restaurante da sua região ?”. Esse tipo de post são os que mais atraem comentários e likes, uma vez que os seguidores têm a oportunidade de interagirem mais diretamente com os criadores, manifestar sua opinião, além de que, no caso de estabelecimentos, utilizam da visibilidade da página para divulgar seu negócio de uma maneira gratuita. Essas estratégias de interação são observadas somente no AdoisBH, os demais perfis mantêm-se um pouco mais distanciados do público nesse quesito. Também é o único entre eles que possui uma quantidade significativa de produções em vídeo.
Acumulam mais de 87 mil seguidores e um total de 684 posts desde seu surgimento. Ao analisar suas métricas é possível perceber que a popularidade entre os seguidores da página é de 45.86%. Um número mediano se compararmos ao Pula BH, que possui mais de 63 mil seguidores e tem cerca de 51% de popularidade. O SouBH não fica para trás, contabiliza cerca de 71% para mais de 5 mil posts ao longo dos anos.
Já em contraponto com o AdoisBH e com certa semelhança com o Pula BH, o SouBH tem uma dinâmica de funcionamento diferente: o site é tão importante — talvez até mais — quanto a página no Instagram. Apesar de ser o maior em número de seguidores, a ênfase do produto não é totalmente focada na rede social. O site, que faz parte do Portal Uai, comporta a maior parte do conteúdo e, principalmente, da renda. O diferencial econômico do SouBH não se repete no AdoisBH, onde os próprios idealizadores do projeto arcam com os custos na maior parte das vezes. Nenhuma de suas publicações são marcadas como “propaganda paga” ou até mesmo são divulgadas parcerias com os estabelecimentos a serem divulgados, algo que foi relatado por Paloma que ocorre de forma oposta no Instagram do Pula.
No instagram, o SouBH tem uma média de duas publicações por dia, podendo aumentar para três ou quatro nos finais de semana. Essa frequência diária de publicações é extremamente importante para a política de engajamento do Instagram, conforme mostram os números apresentados acima, uma vez que ele privilegia as contas que possuem uma periodicidade volumosa estabelecida. Com visuais simples, as publicações são, geralmente, formadas por uma foto do assunto em questão com uma caixa de texto. O ponto importante, no entanto, está no “para onde” essas publicações do SouBH levam o público. As postagens do SouBH funcionam em três etapas principais: publicação no feed do Instagram, Story no Instagram e matéria no site. A publicação no Instagram é simples e pragmática: contextualiza o leitor sobre o evento, dá as informações essenciais e, no final, sempre direciona para o Story, onde está o link para a matéria. O Story, por sua vez, é ainda mais simples: contém a mesma imagem da publicação, título e o link para matéria no site. Cada uma dessas etapas direcionam o público para a pageview no site, gerando volume de acessos e, dessa forma, rendendo financeiramente com as publicidades, como observado nas figuras abaixo:
Mas qual o porquê de começar esse processo no feed do Instagram? Segundo a Paloma, do PulaBH:
“O formato de feed, hoje, é o que mais eu consigo garantir um engajamento legal. Por ter conseguido criar a rotina de fazer determinado número de posts por dia. Eu tenho a obrigação de soltar determinado número de posts por dia.O mais difícil de entender é a logística do Story: tem dia que o story chega a 9 mil pessoas, e tem dia que chega a mil”.
A partir disso, fica claro a opção por publicação no feed: consegue chegar a mais pessoas, gera mais engajamento e é mais estável.
Há, também, algumas publicações publicitárias ao longo do feed no Instagram. Afinal, para os produtos da agenda cultural, essa é a principal forma de financiamento e sustentação do projeto. O SouBH também não podia deixar de usar seu enorme alcance na rede. Tendo tudo isso em vista, este é o produto com mais possibilidades de retorno financeiro. Colocando em contraponto com o PulaBH e AdoisBH, que focam quase integralmente no Instagram e a esse novo modelo de comunicação, o Sou ainda mescla essa nova tendência ao “jornalismo tradicional”. Tentando achar um meio termo possível.
A agenda cultural de Belo Horizonte
Com peças personalizadas e criativas, a suas diferentes maneiras, os projetos de agenda cultural de BH proporcionam uma experiência única aos seus seguidores, uma oportunidade de conhecer a cidade e seus diversos atributos sob perspectivas variadas. Os criadores de conteúdo aproveitam de suas habilidades jornalísticas para explorar as plataformas digitais e mostrar o que há de melhor na capital mineira de forma a se aproximarem do público com recomendações de qualidade, mas sem perder o caráter objetivo. O jornalismo cultural encontrou nas redes sociais a possibilidade de constantemente se expandir, tanto no quesito popular quanto profissional. Cada um com suas especificações, mostram ao público que não é caro se divertir, como é o caso do PulaBH, que existem eventos para todos os gostos, como aponta o SouBH, e para todas as idades, conforme o AdoisBH. “Minha vontade é alcançar mais pessoas ‘pra’ elas saberem que elas podem frequentar mais eventos culturais, elas entenderem a importância da cultura […] eu queria muito que a cultura fosse disseminada de uma forma mais ‘normal’”, completa Paloma Morais.
- Confira a entrevista na íntegra com Paloma Morais, do PulaBH:
