Rádio Estudantil: Trajetória e percalços

Viviane Andrade
LabCon / UFMG
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18 min readDec 2, 2018

A importância e as dificuldades de um projeto experimental dirigido apenas por estudantes

Reportagem produzida por Mateus Santos e Viviane Andrade

Imagem retirada do site da rádio

A maneira de assistir ao futebol já não é mais a mesma para os estudantes de Comunicação que se juntam para narrar e comentar os jogos pela Rádio Estudantil. O projeto que nasceu da força de vontade de um estudante de jornalismo é hoje um meio de aprendizagem para diversos outros estudantes da área. Às quartas, quintas, aos sábados e domingos, dias que normalmente acontecem os jogos de futebol no Brasil, são momentos de encontro para a turma que, ao todo, conta hoje com 15 colaboradores.

Bastidores da transmissão do dia 17 de outubro. Apresentam-se da esquerda para a direita: Paulo Madrid, Bruno Amorelli, Renato Paim e Luiz Henrique. (Foto: Reprodução/Facebook)

Acompanhamos a transmissão feita pela equipe da rádio no dia 17 de outubro, uma quarta-feira à noite. Era o jogo de volta da final da Copa do Brasil, Corinthians e Cruzeiro. Às 21h já estavam reunidos no estúdio improvisado todos os cinco integrantes da equipe que iriam participar daquela transmissão: Bruno Amorelli, João Pedro Viegas, Luiz Henrique, Paulo Madrid e Renato Paim. Nos acomodamos em duas poltronas que se situavam entre a mesa técnica e a mesa da narração. E assim, pudemos assistir de perto a preparação dos garotos para a transmissão que estava prestes a começar. O grande jogo teria início às 21h45, até lá o grupo conversava livremente sobre as expectativas para a partida e ajeitavam o local. João Pedro, que coordenou a parte técnica, conferia os equipamentos e preparava os programas, enquanto o restante arrumava o material de apoio na mesa da narração.

Esses episódios, viabilizados pela existência da Rádio Estudantil, são de grande valor educacional e profissional. Através deles, os jovens desfrutam de um interessante ambiente de experimentação. Os estudantes vêm na web rádio uma oportunidade de colocar em prática os conhecimentos que, às vezes, são mais difíceis de exercitar na universidade.

“É uma área sem oportunidades para pessoas iniciantes, estudantes, já de fato começarem” afirma Renato Paim, graduando em Comunicação Social na UFMG. Renato participa das transmissões da Rádio Estudantil desde o início de 2018. Ainda que já tenha tido outras experiências na área através de estágios (na Rádio UFMG Educativa e na Rádio Inconfidência), o estudante admite a falta de oportunidades na área para os principiantes. Renato afirma que fazer narrações para uma rádio é algo que só se aprende fazendo. Ele vê na Rádio Estudantil um espaço para praticar e aprimorar seus conhecimentos radiofônicos.

Renato fala sobre a importância da Rádio Estudantil para a sua formação

O projeto que no final de 2018 completa 1 ano e meio de vida foi idealizado pelo estudante de Comunicação Social da UFMG, João Pedro Viegas. O jovem, hoje com 21 anos, conta que desde a infância se viu atraído pelo rádio. Na escola, aos 12 anos, João aproveitava os intervalos para brincar de locutor de rádio.

O verdadeiro contato com a mídia veio no segundo período da faculdade, quando ele fez a disciplina de Rádio Educativo, tal qual o possibilitou se envolver em projetos de rádios dentro e fora da universidade. Através dessa disciplina, João teve contato com um projeto de rádio de uma escola infantil de Contagem. Nesta ocasião, a memória afetiva do estudante foi acionada e fez com que ele se lembrasse do quanto gostava daquela mídia desde que era criança. A partir daí, João começou a pensar em como seria uma rádio administrada apenas por estudantes e se eles dariam conta do recado.

Até então, o estudante só tinha interesse e vontade de aprender. Em busca de conhecimento, no terceiro período João conseguiu uma vaga para estagiar na Rádio UFMG Educativa. Durante os meses de estágio, ele obteve experiências de técnica, de programação, de produção de pauta e apuração e de jornalismo, que o impulsionou a dar início ao seu projeto.

O Começo

Motivado pela autonomia e liberdade de elaborar suas próprias pautas, João Pedro foi instigado pela vontade de criar um lugar com apenas estudantes, uma turma da mesma faixa etária e com interesses parecidos.

“Querendo ou não quando você está trabalhando em algum lugar está sujeito a fazer coisas que não necessariamente se interessa. Então, se a gente tem ali uma galera da mesma idade, com mais ou menos os mesmos interesses, pode ser mais fácil trabalhar junto e fazer coisas que pessoas da mesma faixa etária vão curtir.” - João Pedro.

No início de 2017, João começou a comprar os equipamentos para montar a Rádio. Foi aos poucos, com seu salário que vinha da bolsa de R$400 na UFMG Educativa, sendo o primeiro deles uma maleta com 3 microfones, que custou R$150. As compras muitas vezes eram feitas virtualmente, parceladas, tendo sempre como objetivo um equipamento de qualidade, mas que coubesse no orçamento.

“Para entrar no ar em junho de 2017, a única coisa que faltava era um computador. E aí eu consegui comprar um numa loja de informática que tinha computadores usados. (…) Eu ficava pesquisando todo dia. Era uma empresa de telemarketing que não deu certo, e aí eles iam leiloar todo o equipamento deles. Consegui então comprar um computador bom por 500 reais.”- João Pedro.

Mas ainda havia o desafio de entender os softwares necessários para transmissão de uma rádio. Este aspecto não tinha sido levado em conta no início da empreitada e demandou um longo processo de muito aprendizado e pesquisa. “Vi vários documentários de web rádio, de técnica mesmo, pessoas que mostram tipo ‘aqui é o equipamento que eu gravo meu podcast’ e aí mostrava e falava os modelo, falava das conexões” relatou o estudante. Segundo ele, foi preciso assistir a diversos documentários, ler artigos, livros e publicações de rádios, pesquisas de universitários que fizeram projetos de experimentação em rádio.

O projeto se concretizou na base da experimentação, através de testes o estudante analisou o que dava certo e o que não dava. A rádio entrou no ar em junho de 2017, somente com a programação musical, apresentando ao longo do dia 5 programas que se diferenciavam apenas pelo estilo das canções. Tudo foi montado pelo jovem, que também criou toda a identidade visual da rádio.

Grande parte do processo de aprendizagem de João Pedro se deu no período em que ele estagiou na Rádio UFMG Educativa. Foi neste ambiente que o rapaz aprendeu a lidar com a parte técnica envolvida nos processos de rádio, tais como a operação da aparelhagem e dos mixers; as conexões dos cabos; os tipos dos aparelhos, suas especificidades e qualidade; a equalização dos áudios e das vozes e a manipulação dos programas de edição.

Além disso, o jovem buscou muito conhecimento por conta própria e aprendeu sozinho, através de vídeos, artigos e colegas, a utilizar os programas que sustentam a webrádio, como o programa de automação da rádio e o programa que faz as transmissões, além dos programas de designer gráfico, que ele utiliza para produzir as peças gráficas relativas ao projeto, que estão no site e nas redes sociais da rádio.

A Rádio

A Rádio Estudantil é uma webrádio criada com a intenção de ser um laboratório para que os estudantes tenham um local de troca de experiências, principalmente na área da Comunicação. Percebida a dificuldade de conseguir oportunidades de estágio na área, pela falta de prática que as empresas não deveriam, mas exigem de maneira demasiada, a rádio foi concebida para ser um ambiente de treinamento para os estudantes que almejam atuar no ramo.

Para João Pedro, que já tentou diversas vezes uma oportunidade nas grandes emissoras e não obteve sucesso, ter a possibilidade de vivenciar a rotina de uma rádio é um grande diferencial no currículo de quem quer se destacar no mercado de trabalho, cuja concorrência é intensa.

Atualmente, a rádio conta com a participação de 15 estudantes de Comunicação, a maioria da UFMG, apenas um é estudante da PUC. As funções são exercidas majoritariamente por João Pedro, que além de coordenar, atua ativamente em todas as atividades. No atual momento, a estrutura física da rádio se encontra em um estúdio improvisado que o estudante fez na casa de sua mãe.

No início, a rádio se localizava num estúdio melhor estruturado, com isolamento e caixas de som, porém era localizado no Barreiro, o que dificultava a ida das pessoas, por causa da distância. Em virtude disto, João mudou a estrutura para a casa de sua mãe, que fica localizada na área central de Belo Horizonte, em frente à Casa do Jornalista, local de fácil acesso para todos os colaboradores.

A grade de programação diária da rádio se divide entre cinco programas musicais:

Imagem retirada do site da rádio

As playlists que tocam foram montadas por João Pedro a partir de músicas baixadas na internet e não contam com nenhuma locução a não ser as que são gravadas anunciando o nome da rádio, canais de divulgação e vinhetas. De acordo com o estudante, em virtude do tamanho ainda modesto da rádio ele não teve problema com os direitos autorais das músicas. Para fazer essa reprodução é necessário pagar uma taxa, baseada na forma de utilização e sua finalidade, ao Ecad — órgão responsável pela arrecadação de valores referentes aos direitos autorais.

Apesar de não ter tido problema com os direitos autorais das músicas tocadas na web rádio, João Pedro conta outras situações, envolvendo o YouTube e o Facebook, em que a transmissão foi cortada pelas plataformas por causa da violação dos direitos das obras.

A rádio conta ainda com alguns podcasts que podem ser acessados pelo site. O Falecast é um podcast sobre críticas de filmes, desenvolvido em uma parceria com estudantes da FALE que escrevem para um blog hospedado no Medium, o Fale de Cinema. Toda a preparação de tema e produção de conteúdo fica a encargo da equipe do blog, João coordena apenas a parte técnica, grava e edita os áudios dos programas. Já o podcast Nós Gostamos de Copa, foi realizado em parceria com a Rádio UFMG Educativa e a Rádio Terceiro Andar. Nos programas são feitas análises e comentários sobre as partidas da Seleção Brasileira de Futebol na Copa do Mundo da Rússia de 2018.

A programação musical só é interrompida nos dias de transmissão dos jogos. As transmissões são feitas no estúdio da rádio e podem ser vistas através do site, do Facebook e do YouTube.

A equipe acompanha o jogo através de uma televisão posicionada em frente à uma mesa utilizada para apoio dos microfones e dos papéis com as informações apuradas que são utilizadas ao longo da transmissão. A realização acontece dessa maneira em virtude da credencial exigida pela AMCE(Associação Mineira de Cronistas Esportivos) para fazer a cobertura esportiva dentro do Estado de Minas Gerais. Devido à burocracia para conseguir o credenciamento a Rádio Estudantil ainda não tem a possibilidade de acompanhar os jogos pelo estádio.

Com antecedência, são definidas e separadas a equipe e as funções (comentarista, repórter e narrador) de quem vai participar das transmissões. A apuração e preparação das informações fica a cargo de cada encarregado da função. Os repórteres que buscam se informar sobre o histórico do confronto, as informações dos times, as escalações, entre outras coisas e, da mesma forma, os comentaristas têm que estar ciente dessas informações, além das informações técnicas dos times. Toda a parte técnica da transmissão é feita por João Pedro, que fica numa mesa ao lado junto a aparelhagem que possibilita a gravação,tanto da imagem quanto da voz, e a transmissão ao vivo feita para o site da rádio e para as redes sociais.

A transmissão da Final da Copa do Brasil

Faltando poucos minutos para o início do jogo todos já estavam devidamente posicionados em seus lugares. João Pedro, sempre concentrado, ficava de olho na tela do computador operando os programas para a transmissão ao vivo no site da rádio e nas redes sociais. O resto do time se situava na mesa ao lado, conferindo as últimas informações e aguardando o início da partida. A formação completa para a transmissão contava com Renato Paim na narração, comentários de Paulo Madrid, Bruno Amorelli na reportagem do Corinthians e Luiz Henrique Cisi cobrindo o time mineiro. A programação musical desce, sobe o grito de Renato dando início a especial transmissão da finalíssima da Copa do Brasil na Rádio Estudantil.

A transmissão começa e a equipe se apresenta ao público, já comentando e exibindo o resultado da apuração que fez das informações do jogo, com informações técnicas, estatísticas e histórico dos últimos jogos e confrontos das equipes. Os papéis com as anotações ficam na mesa, sempre ao alcance para quando necessário e, é claro, celulares também a postos para conferir um dado ou passar uma informação de última hora. O estúdio conta com uma mesa grande e central em que está a equipe de transmissão, com seu material preparado para o jogo. Á frente dos jornalistas, um aparelho de televisão fixado na parede e sintonizado numa grande emissora mineira exibe o jogo e mais ao lado uma câmera pequena capta tudo que se passa dentro do estúdio entre a equipe de transmissão. Ao fundo, já fora do alcance da lente, uma mesa menor comporta os equipamentos técnicos,a mesa de som, o computador e atrás dela, João Pedro comanda a técnica da rádio, ajustando o volume dos microfones, se o retorno está funcionando e engatilhando os hinos dos clubes para quando sair um gol na partida. Paulo comenta sobre a decoração do estúdio: “Está faltando uma bandeira da Estudantil pra colocar nessa parede!”. E Bruno responde: “Em breve poderemos colocá-la no estádio”. Eles riem com a descontração, imaginando o quão longe pode chegar a Rádio Estudantil.“Em breve poderemos colocá-la no estádio”. Eles riem com a descontração, imaginando o quão longe pode chegar a Rádio Estudantil.“Em breve poderemos colocá-la no estádio”. Eles riem com a descontração, imaginando o quão longe pode chegar a Rádio Estudantil.

Se os rapazes estão nervosos com a transmissão da final, não aparentam esse nervosismo frente ao microfone. Impõem a voz e falam para o público com calma e propriedade. A transmissão é guiada pelo narrador, que chama os repórteres e comentaristas a adicionarem seus pontos sobre o confronto, que eles acompanham pela TV e narram ao vivo para os ouvintes da Rádio Estudantil, que acompanharam a transmissão no site da rádio e também via streaming no Youtube. Vez ou outra os profissionais gaguejam e se interrompem, a fala é interrompida porque foi iniciado quando o microfone estava no mudo, frutos desse processo de experimentação, que a Estudantil proporciona para os jovens que buscam essa experiência mesmo não atuando diretamente com isso no mercado, mas logo eles aquecem a voz e pegam entrosamento. O jogo começa lá na Arena Corinthians,no bairro Itaquera da capital paulista, e aqui no Lourdes em Belo Horizonte, a Rádio Estudantil dá início à narração da final.

O clima se mistura entre tensão e animação no estúdio da Web Rádio. Afinal, é o jogo decisivo de uma das maiores competições do futebol brasileiro, mas a sensação de estar participando da história de um jogo de tal grandeza parece contagiar os estudantes de jornalismo, que mostram excitação em cada fala. Pesa ainda o fato de ser um time da capital mineira na disputa do título.

A transmissão corre bem, os times mostram seu futebol com vontade, ambos querendo buscar a taça. Mas um percalço acontece no durante o primeiro tempo. “A transmissão está caindo no Youtube”, ele conta para a gente. Ele parece nervoso com o fato, mas tenta não demonstrar para os colegas que seguem realizando a transmissão. Ainda assim, Bruno percebe o nervosismo na técnica e enquanto o time do Cruzeiro ataca pergunta: “Tá caindo só no Youtube, ou site também?”, provavelmente esse é um problema conhecido nas transmissões. “Não, o site tá ok. Já estou resolvendo”, responde João Pedro que continua a explorar as ferramentas dos softwares de transmissão que usa. “Talvez seja o título do vídeo, João, coloca algo mais genérico.”, Bruno sugere. Momentos depois João anuncia. “Pronto. Parece que resolveu. Vamos torcer pra manter.”

O jogo estava em pé de igualdade, mesmo com resultado adverso do primeiro jogo a equipe corinthiana não se expunha muito, e foi num erro defesa dos paulistas que o Cruzeiro conseguiu achar a oportunidade para abrir o placar da partida, com Robinho. Na Rádio Estudantil, alegria. Renato Paim narra com vigor o lance para os ouvintes e Luiz Cisi, não consegue esconder o contentamento na movimentação no placar ao trazer a reportagem do lance. E o primeiro tempo acaba assim: 1 a 0 para o time mineiro e a Rádio Estudantil sai para o intervalo. Tempo para beber uma água e rearrumar as anotações. João aproveita para avisar no microfone da Rádio: “Tudo certo com a transmissão agora”. Renato também usa o espaço e manda um abraço para um ouvinte que mostrou presença nas redes sociais durante o primeiro tempo.

Os membros conversam animados sobre como foi essa primeira etapa da transmissão. Bruno Amorelli revela: “Está sendo uma das partidas mais tensas pra mim aqui na Rádio Estudantil. Difícil lidar com a emoção”. Bruno é corinthiano de coração e faz para rádio belo horizontina a reportagem de um jogo em que seu time já começava atrás no placar. Do outro lado da reportagem Luiz Cisi também tem que lidar com a emoção. Não que ele seja cruzeirense, na verdade o jovem repórter torce para o maior rival do Corinthians, o Palmeiras, que havia saído da competição após perder nas semifinais para o time azul celeste.

Ainda assim, Bruno e Luiz exibem o quão sério levam a jornada na Web Rádio, através de comentários precisos e bom entrosamento com os outros integrantes na transmissão.

Os jornalistas se preparam, o segundo tempo começa, e desde o início é muito mais dinâmico que o primeiro tempo. O Corinthians pressiona insistentemente e Luiz Cisi quase não tem oportunidades de comentar: só o time paulista ataca. E a pressão rende frutos. Aos sete minutos, lance polêmico: jogador corinthiano derrubado na área e o árbitro manda o jogo seguir. Alertado pelos auxiliares ele consulta o VAR, o famoso árbitro de vídeo entra em ação. Renato relata com emoção o lance para os ouvintes:

Pênalti marcado e convertido por Jadson. Paulo Madrid, nos comentários ressalta seu prognóstico do intervalo para um jogo mais agitado para as duas equipes no segundo tempo e garante: “Essa partida ainda vai ter mais emoções”.

E isso não tarda a acontecer. O Corinthians ainda precisava de um gol para igualar o placar agregado das duas partidas da final e por isso tentou manter o ritmo do início do segundo tempo, pressionando e controlando as ações de ataque. Mas o time, como dito pelos integrantes da rádio várias vezes na transmissão, era limitado e logo perdeu intensidade. Em contraste, no estúdio em Belo Horizonte, Renato Paim não deixa a bola cair, e com vigor narra os lances, sempre passando a palavra para os companheiros, que correspondem na mesma vibração.

A partida já se encaminha para a igualdade vista na maior parte do primeiro tempo, mas não sem antes deixar as emoções lá em em cima. Aos 24 do segundo tempo, gol do Corinthians, o gol que levaria a partida para os pênaltis, e através de um lindo chute de fora da área que tira por um momento as palavras da boca de Bruno. O lance é narrado com exaltação, mas Renato nota algo estranho em Itaquera. O árbitro vai usar pela segunda vez na partida o árbitro de vídeo. Após a consulta, anula o gol do time paulista. Balde de água fria para os paulistas, mas que a Rádio Estudantil leva com emoção para o ouvinte.

O jogo se encaminha para o fim em igualdade no placar. O Corinthians não mostrava sinais de que tiraria mais forças para um outro gol e o Cruzeiro, contando com o resultado construído na ida das finais não se preocupava em pressionar. Mas a partida foi decidida pelos pés do craque cruzeirense. Bola perdida pelo cansado Corinthians no ataque e resposta rápida armada pela esquadra celeste até os pés do uruguaio Arrascaeta que com classe toca para gol encobrindo o goleiro Cassio. É o fim do sonho para o Corinthians. Nas ondas da Web Rádio Estudantil o título do Cruzeiro foi selado pelos pés de Arrascaeta.

O árbitro apita e dá fim ao jogo e à final. Cruzeiro campeão da Copa do Brasil 2018. Mas ainda tem o pós jogo, comentários e o trabalho de pós produção da transmissão. A Rádio Estudantil continua a vibrar na Internet e não pretende parar tão cedo.

Veja aqui a transmissão completa pelo Facebook

As dificuldades encontradas

Simultaneamente ao período em que João buscava conhecimento, outra procura ocorria: mão de obra para ajudá-lo a impulsionar o projeto. Os seus primeiros convidados foram aqueles colegas que ele já tinha contato a partir da universidade e do estágio. O estudante explicou seu projeto a alguns conhecidos que aderiram a ideia e passaram a contribuir com o conteúdo da rádio. De início a rádio tinha somente programação musical, o estudante baixava as músicas na internet e colocava a gravação no ar.

Com a participação de outras pessoas, João pôde diversificar e daí surgiu o primeiro programa não musical, o Estudantil Esporte Clube. Criado junto a outros estudantes que na época mantinham uma página de assunto parecido no Facebook, o programa entrou no ar dia 31 de julho de 2017. Dentre os principais assuntos, eram apresentadas e discutidas notícias sobre diversos esportes, nacionais, internacionais, mercado de transferências e também esportes femininos. A transmissão ocorria ao vivo, duas vezes por semana de 11h às 12h. Isabelly Morais, famosa por ser a primeira mulher a narrar um jogo da Copa do Mundo na televisão brasileira, é graduanda em Comunicação Social na UFMG e teve uma breve passagem pela Rádio Estudantil. A estudante, de 20 anos, integrou a equipe do Estudantil Esporte Clube por algumas semanas e nos contou um pouco de sua experiência por lá.

Isabelly fala da importância de sua participação na Rádio Estudantil

Veja aqui uma transmissão do Estudantil Esporte Clube no Facebook.

O programa durou apenas 6 meses, encerrado por incompatibilidades nas agendas dos estudantes que precisavam aliar os estudos, o estágio e as obrigações na rádio. Circunstância que ocorre todo semestre e reflete na rotatividade dos colaboradores da rádio.

Esse fato é uma das maiores dificuldades da rádio, segundo João Pedro. O jovem afirma que por ser um trabalho voluntário, sem remuneração, acaba sendo menos priorizado e ele não tem como cobrar muita responsabilidade dos envolvidos.

Hoje seria equipe […] o desafio maior, porque estrutura já temos. Principalmente por ser voluntário, porque quando você se dispõe a pagar, todo mundo quer e todo mundo faz com boa vontade. Você tem o poder de cobrar mais da pessoa se ela não atende às suas expectativas, porque você tá remunerando ela. Ela tá sendo paga pra fazer um negócio de qualidade. A partir do momento em que é voluntário, a prioridade cai muito. Pra mim é uma prioridade alta porque é uma coisa minha, que eu criei e quero manter o nome, manter a qualidade.”, desabafa o estudante.

Mas essa é apenas uma das diversas dificuldades da rádio. O que é natural, por ser um projeto estudantil e que conta com o esforço de apenas uma pessoa na coordenação geral. O fato de João estar na centralidade de tudo dificulta o crescimento da rádio, dado o tamanho das responsabilidades e a quantidade de tarefas que existem e que exigem uma equipe maior. Mesmo com todo esforço que João coloca no projeto é necessário uma quantidade maior de pessoas para atuarem junto a ele e, assim sendo, possibilitar a ampliação de conteúdos e programas. Porém, esta situação conflitua com o carácter voluntário do projeto, os colaboradores o vêm como local de experimentação, algo que acaba sendo passageiro.

Olhando para trás, mesmo com pouco tempo de trabalho, João consegue perceber alguns erros que cometeu ao iniciar o projeto. Segundo ele, a pressa impelida pela euforia de colocar a rádio no ar rapidamente o fez se descuidar de um planejamento, que hoje ele vê que seria imprescindível para começar. Essa falta de preparação acarretou alguns erros, dentre eles a elaboração da identidade visual da rádio e as peças gráficas que deixaram a desejar no início do projeto. Da mesma maneira, a falta de cuidado ao selecionar as faixas musicais já resultou em diversas músicas sendo tocadas com problemas. João cita também a inexistência de um processo seletivo para ser colaborador na rádio, qualquer estudante que demonstrava interesse ele deixava participar, fato que ocasionou muita dor de cabeça,uma vez que ele confiava tarefas às pessoas e elas não correspondiam, nem davam satisfação. Atualmente, os interessados a colaborar devem enviar uma carta de apresentação e são brevemente entrevistados e analisados.

Ambições para o futuro

Questionado se tem interesse em futuramente transformar o formato da rádio para AM ou FM, João Pedro se mostra descrente das possibilidades. No início do projeto isso era um desejo:

“Desde o começo, quando eu não sabia nada, eu queria que ela fosse FM. Eu pensava assim ‘pô, que legal se a gente colocasse aqui uma antena no topo da casa e transmitir e tal’”. João Pedro

Porém, ao pesquisar sobre como obter uma frequência FM o estudante percebeu o tamanho da complexidade envolvida.

Quem libera as concessões para rádios comerciais no Brasil é o Ministério das Comunicações. Segundo o órgão “O interessado em obter a concessão de uma emissora comercial deverá comprovar capacidade financeira e técnica para executar o serviço.” Há bastante burocracia envolvida no processo. Além do estudo de viabilidade física da área onde será instalada a rádio, é preciso apresentar balanço patrimonial, demonstrações contábeis, além de documentos referentes à comprovação de idoneidade da entidade interessada em obter a concessão.

“Aí eu pensei: ‘vou fazer no AM, que é menos complicado’” contou o estudante. No entanto, o sinal AM (Amplitude Modulada) está com os seus dias contados no Brasil. Em nome da evolução e da qualidade de som o país adotou a migração do AM para FM e diversas emissoras já foram desligadas ou transferidas de frequência.

Os obstáculos para conseguir uma concessão radiofônica, aliados às facilidades de ter uma rádio na internet conformam João a continuar nesse modelo. Esse cenário atual de novos gêneros radiofônicos é apresentado na tese da pesquisadora Nair Prata, doutora em Linguística Aplicada pela UFMG. Em sua obra “ Webradio: Novos Gêneros, Novas Formas De Interação” a autora afirma:

“É cada vez maior, hoje em dia, o número de emissoras na web representativas de grupos que dificilmente teriam o amparo da legislação para um espaço no dial. Na internet, no entanto, podem montar suas estações radiofônicas e transmitir suas programações sem maiores complicações.” (Prata, 2008, p.58)

Em virtude disso, os objetivos futuros são pensados com foco em ampliar e melhorar os produtos da web rádio.

Pensando nos próximos passos da Rádio Estudantil, a principal aspiração seria ampliar o leque de assuntos abordados. Atualmente, devido aos interesses da turma envolvida no projeto, a rádio anda centrada muito no ambiente esportivo. “A gente virou quase que um portal de futebol” critica João Pedro. O desejo é acrescentar temas como cultura, política e cinema, por exemplo. João conta que tem contato com as distribuidoras de filmes em BH. “Seria possível ir nas cabines de imprensa, assistir os filmes e escrever as resenhas.” afirma o estudante. Além disso, outra ambição é intensificar a cobertura esportiva, que atualmente é feita assistindo aos jogos em uma televisão no estúdio. Cobrir as partidas diretamente dos estádios é o que o grupo da rádio almeja.

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