Calma, respira: a importância de desacelerar para inovar

Walternor Brandão
LABHacker
Published in
5 min readNov 30, 2023

Num cenário cada vez mais dinâmico, gestores públicos costumam enfrentar a pressão de encontrar soluções rápidas para problemas emergentes. Entretanto, é bem comum que mais problemas emergentes sejam gerados justamente por essa busca apressada por respostas imediatistas. Se você olhar ao redor, talvez não tenha muita dificuldade para identificar soluções que não funcionam muito bem na sua instituição — quem sabe algumas que acabaram se tornando muito piores do que solução nenhuma.

A verdade é que deixar de investir tempo na compreensão aprofundada do problema costuma ser uma das mais ardilosas armadilhas para a inovação. Vamos falar sobre isso agora. Mas antes, para começarmos bem, respire um pouco, separe o seu café ou a sua água e vamos explorar com calma essa problemática. Afinal, se a questão é falar sobre tempo de qualidade para entender problemas, vamos começar direito, né? Pronto? Então sigamos: afinal de contas, por que entender completamente um problema antes de propor soluções é tão crucial?

Fonte: Freepik

1. Algum filósofo certa vez disse: “a pressa gera respostas superficiais”

Esse filósofo é todo e qualquer colaborador que tenha tido a oportunidade de trabalhar em um projeto que gerou uma solução inadequada para um problema mal compreendido. Quando a urgência é quem dita o ritmo do planejamento, as respostas tendem mesmo a ser superficiais. A pressão por soluções rápidas muitas vezes leva à adoção de medidas que, embora aparentemente eficazes, carecem de uma compreensão aprofundada. Essas soluções, ao invés de resolverem os problemas emergentes, podem agravá-los, resultando em consequências indesejadas e complicando ainda mais o cenário.

2. A pressa gera soluções ótimas para zero pessoas

Pior do que desenvolver um produto inadequado é produzir uma solução excelente que não serve para as pessoas que lidam com o problema no dia a dia. Seja por assimetrias de conhecimento, habilidade, desenvoltura com a tecnologia, ou mesmo tempo para aprender a utilizar a nova solução, não é incomum ver ótimos projetos sendo descartados pela falta de aplicabilidade. Desacelerar dá a oportunidade de compreender o problema da maneira mais completa possível: a partir da perspectiva dos atores envolvidos. Iniciando com empatia, a análise do problema ganha uma perspectiva humana, identificando as necessidades reais das pessoas envolvidas. Uma série de ferramentas podem ser colocadas em ação aqui, sendo o Design Thinking talvez a mais conhecida. De todo modo, seguir com uma definição clara do problema a partir da vivência dos atores permite uma análise mais precisa, abrindo caminho para soluções inovadoras, bem fundamentadas e com boas chances de serem colocadas em prática.

3. A pressa impede o Pensamento Sistêmico

A abordagem do Pensamento Sistêmico é uma peça-chave para desvendar as complexidades dos desafios emergentes. Ao reconhecer e explorar as partes interconectadas do problema, valoriza-se a compreensão das intrincadas relações que o permeiam. E isso é o tipo de coisa que só dá para fazer se houver tempo para entender como o problema em questão interage com todo o cenário da instituição. O problema trazido para você resolver talvez nem seja o problema mesmo: talvez seja só consequência de um problema maior. Esta análise mais abrangente não apenas revela as interações muitas vezes negligenciadas, mas também permite antecipar e mitigar possíveis efeitos colaterais indesejados das soluções propostas.

4. A pressa nunca está aberta à colaboração

Ao envolver diferentes setores, a colaboração cria uma sinergia única na instituição. Se houver tempo dedicado para ela no processo de inovação, a diversidade de perspectivas contribuirá para a formação de uma incrível rede interligada de ideias e abordagens. Essa interconexão é capaz de fortalecer a qualidade das soluções, promovendo uma compreensão mais holística dos problemas, de maneira que uma única pessoa ou grupo jamais seria capaz de vislumbrar. Ao invés de soluções fragmentadas, a colaboração gera estratégias integradas, considerando diversos pontos de vista e maximizando o potencial de inovação.

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Me dê um exemplo aí!

Tudo o que falamos até aqui reforça as vantagens de se dedicar tempo na compreensão de um problema antes de começarmos a pensar em uma solução para ele.

Em outras palavras, quanto mais apressada uma solução, menos refletida ela será — o que pode gerar uma piora do cenário inicial alvo da abordagem.

Pense no caso do ciclo vicioso do ar condicionado, por exemplo. Por conta do aquecimento global, muitas instituições sofrem pressão para refrigerar o ambiente em que seus colaboradores trabalham. A solução óbvia e apressada para esse problema seria instalar mais aparelhos de ar-condicionado — que proliferam em cidades quentes ao redor do mundo. Contudo, o mecanismo desses aparelhos gera ainda mais calor no ambiente externo, aumentando a necessidade de refrigeração. Percebe como essa seria uma solução apressada, que acaba fazendo parte do problema e ainda o piora?

Conclusão

A proposta deste artigo vai no caminho inverso do exemplo que acabamos de ver. Ou seja, abraçar o problema e não simplesmente fugir dele. A proposta é olhar bem de perto para o problema, até entendê-lo bem e só então decidir o que fazer. É como no caso do navegador brasileiro Amyr Klink: quando decidiu atravessar o Atlântico com seu barco a remo, o maior risco que Klink vislumbrava era capotar a embarcação e afundar em meio a grandes tempestades. A solução rápida e óbvia seria criar um barco incapotável, o que seria bem complicado tecnicamente, mas possível. Ou então, criar um barco projetado justamente para capotar nas ondas, mas não afundar — opção fruto de muito tempo investido em uma maior reflexão sobre o problema. E foi assim que Klink atravessou as tempestades, sem evitar o problema, mas encarando-o de frente com uma solução que jamais surgiria de uma análise apressada da questão.

Em resumo: compreender antes de agir é importante, especialmente na inovação em instituições complexas. Nesses casos, a pressa pode atrapalhar — e muito. Por outro lado, dar tempo para a colaboração e a compreensão profunda dos problemas é o caminho para gerar impactos positivos não só nas instituições públicas, mas para a sociedade em geral.

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