Parlamento Aberto: estamos avançando, mas… ainda falta muito!

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5 min readSep 23, 2015

Tive a oportunidade de participar do evento anual de parlamento aberto, que neste ano aconteceu na Geórgia, no Leste Europeu, durante os dias 14 e 15 de setembro. O evento culminou com o fim da Semana de Parlamento Aberto (GLOW), quando parlamentos, entidades sociais e organismos internacionais de diversos países promoveram iniciativas diversas em prol da abertura legislativa. Aqui faço uma síntese não apenas do que aconteceu no evento, mas do cenário mundial em termos de implementação da política de parlamento aberto, pelo que pude apurar. A Conferência contou com a presença de parlamentares, especialistas em Legislativo, ativistas de transparência, membros de organismos internacionais e funcionários de parlamentos (gente como eu!) de países de todos os cantos, a exemplo do Chile, Estados Unidos, França, Lituânia, Letônia, Sérvia, Polônia, Jordânia, Malta, África do Sul, Austrália e Brasil, é claro.

Plenária da Conferência no Parlamento da Geórgia Alguns países estão avançando bastante na implementação de ações de parlamento aberto. Alguns deles têm apresentado seus respectivos planos de ação, a exemplo dos parlamentos da Geórgia, Chile, México e França, conforme enfatizado pela Julia Keutgen, consultora da PNUD (Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas). Outros ainda estão em fase rudimentar e inicial nessa questão. Por isso, o evento também teve a função de mostrar os benefícios institucionais, sociais e políticos de ações de abertura em parlamentos para o fim de sensibilizar os parlamentares de casas legislativas ainda não engajadas na iniciativa. Há outro conjunto de países que apresentam iniciativas de parlamento aberto de forma esporádica, ou seja, sem plano de ação mais sistemático. Por meio da visão comparada que pudemos obter das apresentações e das conversas nos coffees breaks, ficou claro como a Câmara dos Deputados brasileira é um caso à parte. Chris Doten, Gestor Sênior do National Democratic Institute, apresentou o resultado de pesquisa realizada em vários parlamentos sobre o nível de transparência e interatividade de cada um. Por meio do Mapa Mundial de Parlamentos Abertos, apresentado por Chris, restou evidente a posição de destaque da Câmara como um dos parlamentos mais transparentes e participativos do mundo, mesmo sem plano de ação — e é isso exatamente o que nos está faltando. Além disso, pudemos ver, de maneira mais específica, onde estão os pontos fracos da Câmara na abertura legislativa. Dados abertos sobre o trabalho das comissões e informações sobre o lobby realizado na Câmara são exemplos de conjuntos de informações ainda não disponibilizadas, ou disponibilizadas parcialmente. Mas a parte mais frutífera (e divertida!) do evento foi ver e ouvir as experiências promovidas pelas entidades da sociedade civil que trabalham com transparência legislativa em seus respectivos países. Lex Paulson, por exemplo, apresentou o projeto D21 — Democracy 2.1, uma nova forma de fazer enquetes digitais. Vimos a grande possibilidade de testarmos esse tipo de enquete no portal e-Democracia e, eventualmente, no Portal da Câmara. Ela oferece seleção de preferências mais ampla, menos binária e reducionista que as enquetes tradicionais, com possibilidade, assim, de obtenção de resultados mais fidedignos relativamente às complexas nuances da vontade popular. Também foi interessante assistir à apresentação do Mark Cridge, o novo CEO da MySociety, um instituto inglês sem fins lucrativos que realiza projetos consagrados de transparência e cidadania, a exemplo do consagrado TheyWorkforYou. Em especial, Mark apresentou o novo projeto da MySociety, o EveryPolitician, um mapa dos dados parlamentares de 207 países. David Gayou falou do Regards Citoyens, projeto francês muito criativo voltado à transparência legislativa. Uma das suas ações de destaque é o Fabrique de Loi, visualização do processo legislativo que permite ao cidadão compreender melhor as diversas e detalhadas alterações legislativas durante a tramitação de uma proposição. Bastante variado e aplicado a alguns países da União Europeia, o Kohovolit é outro portal de transparência legislativa destinado principalmente a facilitar a visualização de dados eleitorais e da atuação parlamentar. Foi apresentado pelo checo Michal Skop, um hacker muito atuante em diversos projetos, a exemplo do Mapa de Parlamentos Abertos, citado acima. Em outro painel interessante, Greg Brown, da equipe do National Democratic Institute, falou sobre os Princípios de Comportamento Ético Parlamentar. Esse documento, ainda em construção, é baseado em princípios que os parlamentares deveriam ter na sua conduta, a exemplo de trabalhar para servir ao público, comportar-se de forma a garantir os direitos humanos e a obediência à lei, garantir a integridade pública, agir sempre de maneira profissional e valorizar a diversidade e o pluralismo. Por meio de uma ferramenta colaborativa de consulta pública, qualquer pessoa pode participar e pitaquear sobre a elaboração do documento.

Scott Hubli, da NDI, e Ayanda Dlodlo, membro da Comissão Executiva da OGP. Scott Hubli (foto acima), Co-Presidente do Grupo de Trabalho sobre Parlamento Aberto, parte integrante da Parceria de Governo Aberto (OGP), ressaltou como as equipes de servidores públicos de parlamentos são cruciais na implementação de ações de parlamento aberto no mundo. Além disso, recomendou aos parlamentos a inclusão de processos colaborativos entre atores civis, legisladores e equipes de apoio parlamentar, para que os projetos de abertura legislativa possam avançar mais rapidamente e de maneira sustentável. Foi com muita alegria que ouvimos de Scott especial menção ao trabalho do Laboratório Hacker da Câmara dos Deputados, como exemplo de órgão que atua nesse sentido. Por isso, sugeriu ao final que outros parlamentos criassem órgãos similares em suas dependências, com o objetivo de atuarem como escritórios responsáveis pela implementação da política de parlamento aberto. Por fim, anunciou-se a Cúpula Mundial de Governo Aberto, que acontecerá de 27 e 29 de outubro, quando enfoque especial será dado às ações do Grupo de Trabalho de Parlamento Aberto. Está previsto, por exemplo, o lançamento da Rede de Colaboração Tecnológica entre parlamentos e entidades sociais para estimular a soma de esforços no desenvolvimento de projetos de transparência e participação social em casas legislativas. Quando apresentamos o trabalho do Labhacker no painel “Construindo Ferramentas de Transparência Legislativa com a Sociedade Civil”, destacamos o protótipo criado pelo Lab como contribuição a essa rede, ou seja, a nova versão do Wikilégis (imagem abaixo), ferramenta do Portal e-Democracia destinada a receber sugestões dos cidadãos sobre os textos legislativos em discussão na Câmara.

Já ensaiando tal modelo colaborativo, qualquer pessoa, de qualquer país, pode auxiliar no desenvolvimento do Wikilegis, acessível em formato aberto. A ideia é que parlamentos, entidades civis e organismos internacionais, trabalhando em rede de maneira colaborativa, possam diminuir os custos de desenvolvimento de projetos similares, permitindo assim o usufruto de seus benefícios por todos. Se quiser saber mais sobre a Conferência de Parlamento Aberto, acesse a página oficial do evento. É isso aí.

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