'Manual da Animação'— Carta-resposta

Rafa Milani

LabJor
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3 min readSep 16, 2019

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Em The Animator’s Survival Kit (publicado no Brasil como Manual de Animação, editora Senac, 2016), o autor, Richard Williams, fala um pouco na primeira página sobre o porquê do livro. Conta de quando tinha 10 anos e comprou um livrinho sobre como fazer cartoons. Daí ao primeiro filme, e logo que começou a pisar na água, se deu conta de que estava para mergulhar num imenso oceano. Sem saber nadar.

Williams foi então aprender animação. Foi ouvir palestras e conhecer animadores. No livro ele conta isso e fala das broncas que levava do animador Milt Kahl, de como aprendeu na marra algumas técnicas. E a história se mescla no que é biografia e no que é aula.

Williams exibe primeira ordem que dava aos estudantes em 'O Manual da Animação': 'Desligue a música!'. A ilustração mostra reação do animador Milt Kahl após o mestre lhe perguntar se ele ouvia música enquanto trabalhava. Foto/ Reprodução Twitter

O tom do livro é sempre o de um professor que mistura matéria e anedota. Técnica e uma história de quando ele trabalhou com Chuck Jones. Conhecimento e de onde ele tirou esse conhecimento.

É íntimo. Acho que nunca eu imaginaria descrever um livro sobre técnica de animação como íntimo. Mas Richard Williams fez por escrito a longa tradição da animação de se ensinar sentando do lado, pegando no lápis. Um professor que não é um mestre no palanque, mas que puxa a cadeira, conhece seu aluno e tem carinho por ele.

O ciclo de caminhada foi uma das lições mais relevantes de Williams, pois é um dos movimentos mais difíceis numa animação, ('Manual da Animação). Fonte/ Reprodução

Talvez o mais importante do livro não seja a técnica. Ele escreveu um manual de sobrevivência completo, que virou referência no mundo e didaticamente é uma obra impecável. Mas Williams era um completo e perdidamente apaixonado por animação. Sua eterna jornada de aperfeiçoamento da técnica só pode vir de um apaixonado. Dizem que só em seus últimos anos de vida ele finalmente dizia: “Acho que agora aprendi a animar”.

No Animator's Survival Kit, o amor pela animação transborda em cada linha de texto e em cada desenho. Williams foi esperto em chamá-lo assim. O divertido título o isenta do debate sobre se é um livro de técnica, uma autobiografia, uma aula redigida ou uma carta de amor.

Imagine, agora, quem dá seu tímido primeiro passo comprando esse livro. Como não se apaixonar por algo descrito com tanto carinho por um dos maiores animadores da história? Ele abre uma porta para um mundo novo e encoraja o leitor a mergulhar na aventura, convidando-o a se apaixonar e a experimentar a animação. Mostra que é possível a ele se expressar assim, mesmo que não haja um grande estúdio ou uma boa escola disponível. É como se Williams oferecesse a mão para que o animador comece sua jornada.

Muita gente começou só com isso. Lápis, papel e o Animator’s Survival Kit. Às vezes, o animador só precisa disso. Lápis, papel e a certeza de que esse amor pela animação é real e preenche cada página do livro de um professor, cujo propósito é perpetuar a arte que o cativou para sempre.

Ao mestre, o maior dos mestres da animação, com carinho.

Rafa Milani, 22, é aluna de Animação da FAAP.

Para acessar este texto em inglês, clique aqui.

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