TCCs 2022
Onde surgiu a epidemia dos prédios neoclássicos
Estilo presente em vários imóveis de São Paulo e outras cidades brasileiras divide opiniões entre arquitetos
João Quartim
Colunas, pórticos, uso de mármore, pé-direito alto… Que paulistano nunca viu um edifício neoclássico na cidade?
O estilo surgiu na França no fim do século 18, reproduzindo elementos decorativos da Grécia Antiga como colunas, arcos e simetria. Como André Luís de Castro Albuquerque, Adauto Neto Fonseca Duque e Rômulo Soares explicam no artigo A pintura em foco: o neoclassicismo em uma abordagem historiográfica, publicado em 2008 na Revista Homem, Espaço e Tempo, o neoclassicismo veio junto com “as mudanças políticas, religiosas e culturais” da época da Revolução Francesa (1789).
Os artistas neoclássicos “buscaram substituir a sensualidade e a trivialidade do rococó por um estilo que fosse guiado pela lógica, solenidade e caráter moralizante”, escreveram os autores. Nesse sentido, o estilo representava ideários de “civilidade e formosura” para seus contemporâneos.
Da França, os neoclássicos se espalharam por várias cidades do mundo. E chegaram também a São Paulo. Coordenador do curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Armando Alvares Penteado (FAAP), Marcos Costa afirma que a arquitetura neoclássica já funcionou como o principal meio de expressão arquitetônica da elite paulistana. E mais recentemente se estendeu a bairros de classe média e média alta. “Em especial nos anos 1980, 1990 e até mesmo no começo deste século, (o estilo) tornou-se onipresente”, explica.
Mas o arquiteto, porém, tem ressalvas com a adaptação brasileira. “São edifícios que fazem uma leitura muito precária do neoclassicismo, especialmente de caráter mais afrancesado. É uma cópia muito tosca, muito limitada, que não permite grandes aprofundamentos estilísticos porque eles simplesmente não existem”, opina.
Para Mauricio Correia, estudante do quarto ano de Arquitetura e Urbanismo na Universidade Tecnológica Federal do Paraná , o estilo é uma cópia “do que já foi o auge na Grécia e em Roma”. “É algo deslocado do lapso temporal”, afirma.
Para ele, é possível trazer “a espacialidade das construções da época, o ritmo estrutural e usar mármore nas construções”, mas a adaptação do estilo na contemporaneidade é vazia. “Se você tirar os adornos das edificações neoclássicas não sobra nada, é tudo estético, com a idealização de uma superioridade.”
Mauricio acredita que a proliferação do estilo está relacionada à pressão do mercado imobiliário, bem como a um sentimento de inferioridade presente no Brasil. “Isso (o uso do estilo neoclássico em construções) é meio que a síndrome de vira-lata, de não estar contente com os próprios ideais construídos no País.”
Questionado sobre estilos de maior valor cultural e artístico, cita o modernismo. “Querendo ou não, é a maior influência na arquitetura”, afirma, lembrando que arquiteto suíço Le Corbusier — pseudônimo de Charles-Edouard Jeanneret-Gris (1887–1965) — veio ao Brasil ver as obras do carioca Oscar Niemeyer (1907–2012) para “copiar o que era feito” aqui.
Diferente é a opinião da arquiteta Monica Sciarra Mandelli, cujo escritório leva seu nome. Ela refuta a ideia de que o estilo neoclássico não possui aprofundamentos estilísticos. E diz “não ver por que” se criticá-lo. “Em Curitiba (onde reside), existem muitos desses prédios. São imponentes, clássicos, eternos. Representam o poder e a influência”, avalia. “Também são leves e harmoniosos.”
Para ela, o neoclássico pode ser recriado no mundo todo e nunca sai de moda.
A arquiteta também valoriza o estilo moderno, com linhas retas, concreto aparente, aço e vidro nas construções. “Foge de tudo que é tradicional e torna-se a arquitetura dos dias atuais, arrojada… tudo que é simples, mas não simplório.”
Cecilia Menezes, moradora de um Lindenberg (prédio de construtora do mesmo nome famosa por seus edifícios neoclássicos) em Higienópolis, São Paulo, também não vê motivos para se criticar o estilo. Em sua opinião, quem critica “tem que apresentar solução”.
Questionada se moraria em um apartamento moderno, ela responde: “Por que não?”. “Espaços abertos nas salas e cozinhas são agradáveis. Nos quartos e banheiros não gosto”, diz. “(Mas) acabamento clean também me agrada muito.”
*Esta reportagem foi feita a partir do trabalho de conclusão do curso de Jornalismo na FAAP de João Quartim. Intitulado ‘Análise comparativa da arquitetura e decoração em casas da elite paulistana’, foi orientado pelo Prof. Dr. Rodrigo Petrônio.