“Os filmes estão sempre representando o momento que a gente está vivendo”

Parceiros desde a faculdade, os diretores Juliana Rojas e Marco Dutra participaram da 6ª edição do Diálogos na Web

LabJor
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4 min readJun 20, 2020

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pedro a duArte

“O terror lida com o medo do desconhecido. Um monstro é aquilo que a gente não reconhece, mas que é humano. Só que esse monstro às vezes é algo dentro da gente, que a gente pode estar reprimindo, ou é algo exterior.” Assim a diretora Juliana Rojas comentou, na 6ª edição do projeto Diálogos na Web FAAP, sobre como as histórias de terror refletem a nossa sociedade.

Ela participou da conversa online com alunos e professores da FAAP em companhia do também diretor e roteirista Marco Dutra. Os dois se conheceram n Universidade de São Paulo, onde estudaram Cinema, e se aproximaram pelo gosto por filmes de terror. A dupla formada em exercícios da faculdade continuou na produção do curta-metragem O Lençol Branco (2004), que estreou na mostra Cinéfondation, do Festival de Cannes, e se consolidou nos trabalhos seguintes. Seu último filme, As Boas Maneiras (2018), fez parte da seleção do Festival Internacional de Cinema de Locarno, onde ganhou o Prêmio Especial de Júri.

Marco Dutra, no Diálogos na Web FAAP. Foto: Pedro A. Duarte

“Tem uma coisa muito bonita quando você dirige em parceria que é esse resultado. Não é um filme só meu nem só da Ju. Ele vira um filme que é resultado dos dois, da mistura de DNA. Para os filmes, isso é muito rico”, resumiu Marco Dutra.

No encontro com alunos de Cinema e Comunicação da FAAP, os dois diretores contaram sobre suas experiências e comentaram que o cinema de terror vem ganhando espaço nos últimos anos.

“Os filmes estão sempre representando o momento que a gente está vivendo. Às vezes a gente recicla, reinventa tipos de horror que já tinha no passado, mas sempre recontextualizando para a sociedade”, explicou Juliana.

Um reflexo disso está no debate sobre como as personagens femininas são retratadas no gênero de terror. Juliana disse que o número de mulheres produzindo e consumindo obras do tipo tem aumentado. “Por isso o conteúdo está mudando também”, disse. “As mulheres não querem ler conteúdo que seja machista.”

Juliana Rojas, na conversa com alunos e professores da FAAP. Foto: Pedro A. Duarte

A diretora citou como exemplo as final girls — termo usado para identificar a última mulher que enfrenta o assassino e sobrevive na trama para contar a história. “É uma figura muito usada no cinema dos anos 1980", lembrou. "No final só sobra a garota virgem, as garotas que transam morrem. Tem muito isso no cinema, mas também no de terror: filmes em que as mulheres são retratadas de maneira machista, como objeto. Ou esses estereótipos: o da puta e o da santinha que você pode casar." Segundo Juliana, o que se tem tentado agora é fazer filmes em que a mulher não esteja mais nesse lugar. "Mesmo filmes escritos por homem têm de ter o mínimo de consciência de que esse tipo de objetificação não é mais aceitável.”

Tais discussões se dão num momento em que o gênero terror ganha espaço nos mercados nacional e internacional, seja na quantidade de filmes como de séries e festivais de cinema. Juliana vê a popularização da internet como uma razão para o aumento. “Os fã de filmes de gênero são muito fiéis, muito apaixonados, e as redes sociais e os fóruns também ajudam as pessoas a se conectar e se organizar para exigir esse tipo de entretenimento.”

Em termos comerciais, no entanto, os filmes de terror continuavam a enfrentar problemas, antes mesmo da crise causada pela covid-19. Conseguir se manter em cartaz e atrair público para as salas estão entre as maiores dificuldades. “É um gênero que sofreu bastante preconceito”, explica Juliana. “Principalmente no cinema, por ser considerado filme B. Tem gente que não gosta porque causa desconforto, mas também por achá-lo intelectualmente inferior.”

Para tentar driblar o preconceito e passar uma ideia de maior intelectualidade, há quem tente chamar essa nova onda do gênero de “elevated horror” ou “pós-terror”. Mas Juliana disse não gostar desses nomes, pois o terror, ao longo da história, produziu obras marcantes. “A metáfora do horror já serviu para discutir questões sociais e de comportamento do ser humano não só no cinema, como na literatura. Desde Frankenstein tem essas discussões. É um gênero muito rico. E eu acho que agora está caindo um pouco o preconceito.”

Participantes da sexta edição do Diálogos na Web FAAP. Foto: Pedro A. Duarte

Formado em Cinema, pedro a duArte é aluno de Jornalismo da FAAP

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