Uni duni tê: o sonho encantado da decisão assertiva, requer um bom treino!

Carlanareis
labsit
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5 min readNov 26, 2021

Outro dia, fui com meu marido visitar uns amigos em São Paulo e não sabíamos se íamos fazer um bate e volta ou ficar por lá para o dia seguinte. Eu, que detesto arrumar malas, me deparei com a dúvida sobre os possíveis desdobramentos daquela visita e cedi à facilidade de levar de tudo um pouco. Do moletom ao salto alto, daquela bagagem sairia uma mulher preparada para qualquer ocasião.

Simples, rápido, prático e fui!

Voltei no mesmo dia, de mãos vazias e com um prejuízo de ter tido não só uma mala cheia, mas também outros pertences, todos roubados.

Já repararam que decisões acompanham a gente o tempo todo e em qualquer tipo de atividade? Desde criança somos convidados a escolher. Algumas situações podemos até nos esquivar e escolher “pagar par ver” quais serão as consequências. Às vezes, são um pouco frustrantes!

Transportando isso para o universo dos projetos, sabemos que não é tão simples assim como decidir o que levar numa mala. Nesse sentido, o universo das decisões é muito mais complexo e com infinitas variáveis.

Um Product Owner, por exemplo, recebe uma enxurrada de informações, ideias, drafts, absorvem todos os conteúdos, prioriza as demandas, alinha com o cliente, orienta o time de desenvolvimento e acompanha as entregas. Algo processual que caberia em uma receita de bolo, se não fosse o fato de estarmos lidando com pessoas e seus anseios.

Como equilibrar as diversas expectativas de todas as partes interessadas? Como combinar prazo, custo e qualidade? Qual a ordem de priorização de um backlog? Quais interesses atender? Qual melhor decisão adotar?

No livro Decisões inteligentes, Hammond, Keeney e Raiffa defendem que existem 8 elementos que formam uma decisão: problema, objetivos, alternativas, consequências, trocas, incertezas, tolerância a riscos e decisões interligadas. Os autores afirmam que “a maneira como se formula o problema orienta a decisão” e chama atenção para uma armadilha psicológica, quando as primeiras ideias conduzem diretamente a decisões finais. “As primeiras ideias a emergir em nossa mente quando iniciamos o processo decisório podem ter impacto marcante sobre a escolha final. E isso pode, sem ao menos pressentirmos, distorcer o curso da decisão e nos levar à decisão errada.”

Notem que os pontos de destaque são distantes e completamente interligados: a dor e a solução. Distante, pois a dor é o início — o gatilho que faz surgir uma ideia, e a solução é o final — a ideia pronta.

Existe um case clássicos de Kahneman e Tversky (1981) que demonstra como a forma de comunicar define a escolha. Nele, pessoas foram divididas em dois grupos para decidirem sobre o melhor programa de prevenção para uma determinada doença que atingiu 600 pessoas em uma cidade.

Para o primeiro grupo, apresentaram as seguintes alternativas:

  • Programa A: 200 pessoas serão salvas
  • Programa B: 1/3 de chance de 600 pessoas serem salvas, ou 2/3 de chances de nenhuma ser salva.

Já para o segundo grupo, foi apresentada as seguintes alternativas:

  • Programa I: 400 pessoas vão morrer
  • Programa II: 1/3 de chance de ninguém morrer e 2/3 de chances de 600 pessoas morrerem.

Note que o problema é o mesmo, mas o que muda é o enfoque. O primeiro grupo optou pelo programa A, enquanto o segundo pelo Programa II. Ou seja, a escolha é influenciada pela forma com que a situação a ser decidida é apresentada. Sua descrição, impacta na decisão.

Voltando para o universo dos projetos, podemos nos questionar sobre como entender melhor os objetivos do cliente, o que levou a solicitar determinada solução e se a ordem de sua prioridade de fato irá resolver o problema apresentado.

Para isso, alguns processos e metodologias ajudam a conduzir o time e o cliente a entender melhor seu projeto e a tomar a melhor decisão. Entre eles:

  • Branstorming
  • Mapa mental
  • Árvore de decisão
  • Design thinking
  • Lean inception

Mas, se ainda não estiver seguro com nenhum dos frames de decisão, deixo aqui algumas dicas para que possa seguir seu processo de levantamento do problema, antes mesmo de desenhar uma solução. Inclusive, a nova edição do PMBOOK surge com foco ainda maior na entrega de valor e de resultado ao negócio e aos stakeholders e, para isso baseia-se em princípio que valorizam a performance. Então:

  • Liste claramente os objetivos que pretende alcançar;
  • Convide pessoas com repertório diferente para participar do processo de decisão — Diferentes pontos de vista enriquecem o debate;
  • Permita que novas alternativas de solução surjam e sejam debatidas — Ideias motivam pessoas para ação e para novas reflexões;
  • Entenda com quais interesses o projeto está lidando — Quais pessoas irão se beneficiar com o projeto? De que forma? Qual são suas expectativas e receios?
  • Analise as consequências das escolhas — O que estou priorizando neste momento irá resolver ao problema levantado ou estou já solucionando um problema futuro?
  • Entenda a cultura do seu interlocutor — Motivações particulares podem ser influenciadas por diferentes culturas e comportamentos de decisão;
  • Busque superar as barreiras de comunicação presente em um processo de diálogo:
  1. Barreiras semânticas podem impactar o entendimento coletivo. Evite jargões da profissão quando não conhecidos por todas as partes e opte por uma linguagem comum a todos;
  2. Barreiras humanas dizem respeito a forma como a mensagem será recebida pela outra pessoa. Então, fique atendo às atitudes de quem fala e de quem recebe a mensagem. Saiba lidar com algumas diferenças individuais, personalidade, sentimentos, crenças, valores;
  3. Ouça com empatia para captar além do que foi falado — Fique atendo à mudança de postura, tom de voz e olhares. Mesmo no silêncio podemos obter percepções;
  4. Faça as informações circular e se tornar comum a todos, o processo de comunicação faz parte de um bom entendimento e consequentemente de uma boa decisão!

Chamon, E. M. Q. O. 2008. O trabalho, seus sentidos e a comunicação: aspectos e relações (p.149–187). In: Almeida, P. E.; Chamon, E. M. Q. O. Gestão integrada de organizações. Brasport, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

https://pmisp.org.br/pmbok-guide/

Kunsh,M.M.K. 1986. Planejamento de relações públicas na comunicação integrada. 2.ed. Vol. 17. Summus Editorial, São Paulo, SP, Brasil.

Nutt, Paul C. 2001. A taxonomy of strategic decision and tactcs for uncovering alternatives. European Journal of Operational Reserch

Reis, Carla N. A. e Hansch, Marilia Rosalice. 2019. “Demonstração das estratégias adotadas para superação das barreiras de comunicação no projeto de Digitalização do sinal de TV aberta no Brasil

Yu, Abraham Sin Oih. 2012. Tomada de decisão nas organizações: uma visão multidisciplinar. In: Sousa, Willy Hoppe e Shibata, Inácio Hideo — Cap 6 — Decisões políticas. 1ª Edição. Editora Saraiva Uni

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