Boas práticas para Product Designers com (e sem) TDAH

Uma história de como adaptei minha rotina após descobrir ter Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH)

Isabel Vieira
Ladies That UX PT
5 min readAug 16, 2021

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Iniciar esse artigo já foi um desafio e finalizar foi pior ainda. Assim como tudo na minha vida.

Até ser diagnosticada com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), para a sociedade eu era “apenas” uma pessoa irresponsável, que não era boa o suficiente e que tinha que gastar muito mais energia que as outras pessoas para qualquer atividade. Depois de começar a ler e entender mais sobre aquela condição que era parte de mim, minha vida mudou.

Comecei a inserir atividades e técnicas no meu dia a dia para me ajudar a lidar com o TDAH e esse texto é um pouco do meu aprendizado nesse meio tempo.

Foto de itens que a autora usa no seu dia a dia: um caderno com capa preta, uma caneta azul, uma caneta preta, um bloco adesivo amarelo, um polvo de pelúcia preto, fitas adesivas coloridas e um cubo mágico azul
Algumas coisas que ajudam no meu dia a dia.

E como a descoberta aconteceu?

Em meados de 2019 comecei a ter dores de cabeça quase todos os dias. Estava em uma empresa de produto que estava passando por um redesign e eu desenhava interfaces todos os dias. Ou seja, tinham muitos detalhes e muitas coisas para lidar ao mesmo tempo. Estava entrando em parafuso e resolvi buscar ajuda de um neurologista.

Expliquei para ele o que estava acontecendo, contei que já tive crises de dor de cabeça na adolescência e que já foi tratado como enxaqueca. Contei também da ansiedade, que me afeta o tempo todo, e da eterna sensação de incapacidade que ficava por não conseguir trabalhar da melhor forma.

Ele começou tratando como enxaqueca e ansiedade usando remédios focados em tratar essas doenças. Foram 6 meses com esse tratamento e nada de melhora. E havia sempre a reclamação de que não conseguia focar e ser produtiva.

Nisso, ele teve uma suspeita e começou a fazer perguntas sobre meu passado. A cada pergunta era um sim diferente e eu ficando mais e mais abismada com elas. Até que ele finalmente me disse: “Posso te dizer que é TDAH.” e minha cabeça explodiu.

Depois dessa descoberta, comecei a pensar em como poderia melhorar meu processo de trabalho e facilitar a rotina para minhas limitações. Com as adaptações que fiz, criei um flow melhor de trabalho, passei a documentar mais detalhadamente o que precisa ser feito e quais informações eu tenho para aquele projeto e me senti mais organizada no dia a dia, por isso sinto que até meu trabalho como designer passou a ser melhor.

Uma imagem de um mapa de empatia com características da autora que são parte do Transtorno de Déficit de Atenção e hiperatividade
Um mapa de empatia rápido que mostram alguns dos pontos que o médico usou para realizar o diagnóstico.

Quais adaptações fiz na minha rotina depois de saber do TDAH?

Com acompanhamento médico iniciei um tratamento focado em diminuir os efeitos do TDAH. Além disso, inseri algumas práticas que me ajudam a organizar pensamentos e lembrar de informações ou atividades importantes que precisam ser feitas.

  • Planner semanal e mensal: Comecei a usar planners físicos para lembrar do que preciso fazer sem ter que procurar em agendas online e não correr risco de me distrair com outras coisas (tipo apps, notificações, chats, etc) e esquecer o que ia consultar. Os deixo presos em lugares que fico bastante: do lado do computador e na geladeira da cozinha;
  • Post-its: Coloco post-its em lugares que preciso fazer alguma coisa, como no notebook para me lembrar que preciso consultar algo ou na estante para me lembrar de organizar alguma documentação;
  • Gravar reuniões: Tento gravar a maior parte das reuniões que participo e que terão informações relevantes para o meu trabalho, principalmente se forem com pessoas de difícil acesso (usuários e stakeholders). Revisito esses vídeos caso surja alguma dúvida para evitar parar para perguntar coisas repetidas às pessoas;
  • Mãos ocupadas: Costumo ter algo para mexer ou apertar enquanto estou participando de reuniões ou apresentações. Nisso, controlo minha hiperatividade e não fico usando o computador enquanto ouço pessoas falarem;
  • Anotações: Mantenho um caderno por perto para anotar insights ou perguntas que eu tenha, pois surgem do nada e há uma chance alta de esquecer rapidamente, por isso sempre anoto para lembrar depois;
  • Alarmes: Adicionei a integração do Google Calendar com meu Slack e recebo uma notificação um minuto antes de cada reunião, nisso, não corro risco de esquecer alguma por ser avisada muito antes apenas pelo Calendar;
  • Escrever no papel: quando tenho a cabeça cheia, eu costumo “gastar” essa enxurrada de pensamentos escrevendo em cadernos ou folhas que eu tenha por perto para desafogar um pouco o raciocínio e pegar coisas que fazem sentido para aquele momento. Nesse processo eu não penso muito e apenas escrevo.

Mas o principal é manter uma rotina de tasks e organização que me faça realizar ações de forma automática ou mais fácil, para evitar me distrair com coisas que não são prioritárias.

Foto com 3 blocos de papel para planejamento mensal e semanal e três canetas, uma azul, uma vermelha e uma preta.
Meus blocos de planejamento semanal e mensal. As cores das canetas significam: preto para tasks de trabalho, azul para tasks pessoais e vermelho para tasks urgentes ou atrasadas.

E no fim, o que melhorou na minha vida?

Depois que adotei essas técnicas no meu dia a dia, comecei a ter uma performance melhor no trabalho. Diminuiu muito as vezes que me sentia perdida e criei mais autonomia, sem depender da agenda de outras pessoas para conseguir respostas.

Também tive uma melhora significativa na minha saúde mental e autoestima, pois não me cobro mais a ser igual aos outros, pois nunca vou ser.

Me descobrir neurodivergente e me aceitar foi uma virada de chave na forma como lidava comigo mesma. E isso se refletiu em tudo na minha vida.

E se você, designer não-neurodivergente tem dificuldades de se organizar no dia-a-dia, essas dicas podem ser para você também.

Caso queiram ler mais sobre esse transtorno neurobiológico, recomendo os conteúdos do site da Associação Brasileira do Déficit de Atenção.

Deixo aqui meu agradecimento a Ana Carvalho, a Debora Carvalho e a Kaline Castro por me darem apoio e me “forçarem” a terminar esse artigo. E ressalto uma pessoa que sempre me inspirou e que também sabe como é lidar o TDAH todos os dias: Leandro Lima.

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Isabel Vieira
Ladies That UX PT

A Sr Product Designer that tries hard not to lose focus and speaks too fast. My favourite Hex is #FAFAFA because of that song from Talking Heads.