Por que ver a Clarisse de Souza no Fantástico é essencial no ano de 2021?
Profissional de tecnologia, sua família já quis saber “com o que você trabalha” hoje?
Para quem não conhece, o quadro Mulheres Fantásticas do programa de televisão Fantástico (da Globo) é um quadro que busca mostrar a história de várias mulheres, em tempos antigos e contemporâneos, que ultrapassaram o preconceito e abriram (e continuam abrindo) caminho para as mulheres ao redor do mundo.
Domingo passado, dia 03/01, entrevistaram ninguém menos que Clarisse Sieckenius de Souza, Professora Emérita do Departamento de Informática da PUC Rio, Membro do Comitê de Assessoramento para Ciência da Computação do CNPQ e criadora da Engenharia Semiótica, sendo uma das desbravadoras da disciplina Interação Humano Computador no Brasil. Já estava na hora da mídia popular do nosso país passar a dar destaque e reconhecer a potência dos nossos profissionais de tecnologia.
Dá uma olhadinha no trailer da entrevista.
Quando eu vi a reportagem passando na TV, é claro que fiquei feliz. IHC é uma das disciplinas fundamentais que compõem a minha profissão (UX Designer) e é ótimo ter uma representante da área ali falando, ainda mais uma mulher que merece tanto reconhecimento como ela, e sobre uma disciplina que é tão essencial nos dias de hoje, cujos profissionais brasileiros não são tão valorizados quanto poderiam ser.
Só não achei que essa exposição na TV fosse criar diálogo na minha família. E vou declarar pra vocês que eu adorei cada segundo daquela pequena conversa.
Minha família tem uma certa noção do que eu faço. São pessoas que não necessariamente trabalham ou lidam com tecnologia da mesma forma que eu, mas fazem um esforço para entender meu trabalho.
Quando a entrevista com a Clarisse começou, e foram falando da história dela, minha mãe na hora chamou meu pai para prestar atenção “olha lá a Isabela, bem! Ela faz mais ou menos aquilo ali, só que de outro jeito, né, filha?”. Disse que era uma das disciplinas que tinha estudado pra aprender UX. Me deu um orgulho danado, não vou negar.
Começamos a conversar um pouco e logo voltamos a atenção novamente para o que a Clarisse estava dizendo: sobre o problema da falta de mulheres da área, da falta de mulheres em cargos de liderança e um pouco das pequenos estereótipos que criam nas mulheres que trabalham com tecnologia. E todo mundo aqui em casa prestando toda a atenção possível. Coisas que eu mesma já tinha falado pra eles antes, mas que faltava alguém de fora dizer, pra que eles entendessem a magnitude da coisa.
Entendem por que é importante?
Quando as palavras “perspectiva”, “inspiração”, “meta” e “identificação” aparecem em contextos como esse não tem como não percebemos que a aparição de uma imagem e semelhança nossa em uma mídia tão popular como a televisão importa, e importa muito! Vira a chave não só na opinião que nós, pessoas inspiradas temos do nosso próprio futuro, como também gente que pode ajudar e dar apoio e incentivo para essa pessoa chegar lá, como família, amigos, colegas e por aí vai.
Como assim, Isabela?
Estou dizendo que se alguém como a Clarisse aparecesse bem antes na televisão, talvez eu não visse tantas colegas de colégio deixando de estudar. Mulheres que tinham sonhos parecidos com os meus largando a escolha do curso para seguirem alguma profissão tradicional que a família achasse mais segura. Amigas de trabalho brilhantes migrando de área porque não se viam capazes ou respeitadas na equipe em que se encontravam.
E repararam que ali em cima eu falei de pessoas? A importância da diversidade no mercado de trabalho, seja ela de gênero, classe econômica, cor, orientação sexual e condições humanas particulares é enorme! Só faz somar o time, e dá exemplos para diversas pessoas que não veem como crescer em lugares fora da sua realidade dominante, mostrando que é possível sim, e que, da mesma forma que a inspiração dela chegou lá, outras pessoas como ela estão tendo coragem e tentando também.
Certo, mas por que 2021?
A pandemia fez a gente mudar muito sobre um monte de coisas, incluindo o fato de que estamos mais tempo em casa. Nesse tempo, vi muitas mulheres precisando passar a se desdobrar para cuidar do trabalho, da casa e dos filhos no quarto de casa. Vi muitos homens casados ou pais na mesma situação de isolamento e home office não se importando com nenhuma dessas mesmas tarefas de casa e empurrando a responsabilidade toda para a cônjuge.
Duvida? Olha só essa matéria da Agência Brasil, que não me deixa mentir. É de Julho, quando a pandemia ainda estava na primeira onda por aqui:
Nas famílias mais humildes, a situação é ainda pior. Não só as mães, como geralmente as filhas ficam responsáveis pelo trabalho doméstico, impossibilitadas de continuar seus estudos com a mesma regularidade que poderiam (e que gostariam). Mais um dos muitos exemplos de situações desesperadoras que nos fazem tomar medidas desesperadas com base no medo e na falta de conhecimento, que resultam na falta de suporte e apoio.
Ver mulheres da área de tecnologia na televisão aberta é um gás, um fiozinho de esperança pra essa meninada menor de idade que está cuidando do irmãozinho e fazendo almoço, de que, se ela continuar se dedicando, vai poder trabalhar com isso também um dia.
Por isso quero agradecer aos meus pais pelo apoio de sempre e à Clarisse de Souza por ter cedido seu tempinho pra compartilhar seu conhecimento e falar do seu trabalho. Fez meu dia e fez minha família entender um pouquinho mais os motivos pelos quais eu não desgrudo do computador.
E pra fechar, gostaria de fazer um pedido: mulheres, não percam a fé, não deixem de dar exemplo e não deixem de mostrar seu melhor todos os dias. Muitos ombros te sustentaram e você será a sustentação de muitas mulheres que ainda estão por vir.
