Seja a mudança que você deseja ver no mundo

Tereza Alux
Ladies That UX PT
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6 min readMar 11, 2023

A Teoria do Caos determina que mínimas mudanças no início de um evento podem gerar profundas alterações no futuro. Como o simples bater das asas de uma borboleta em Paris, que pode resultar em um terrível furacão no Texas.

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A citação que dá nome a este artigo é de autoria de Mahatma Gandhi, que além de ser um personagem ímpar na história, liderando de forma silenciosa e bem-sucedida a resistência não violenta na luta da Índia contra o Raj Britânico, foi advogado, filósofo e especialista em ética política. Nessa citação, Gandhi nos força a reconhecer nossa responsabilidade, enquanto pessoas que pedem por uma transformação positiva no mundo, e vai além, inspira protagonismo.

Não fazemos por mal, mas a falta de protagonismo e de desejo pela ação é inerente ao ser humano. Não fomos feitos para sair da zona de conforto, mas sim para ficarmos seguros nela. Além disso existem sempre muitas outras coisas que precisamos dar conta na nossa própria vida, muitas responsabilidades que precisamos atender, expectativas que precisamos cumprir.. e entendo que ainda existe um peso no que se refere a insignificancia das nossas ações. Afinal, o que podemos fazer para salvar o mundo, não é mesmo? Ele é muito grande e existem muitas pessoas muito melhor capacitadas, com muito mais poder e influência.. entendo que as vezes é difícil identificar como podemos contribuir para um mundo melhor. Tolkien ilustra essas características de forma sublime, no diálogo entre Gandalf o cinzento, que é um mago, e Bilbo Bolseiro, que é um hobbit, raça que conceitualmente é menos ambiciosa, corajosa e importante que a raça humana no trecho a seguir:

Gandalf: “Estou procurando alguém para participar de uma aventura que estou organizando, e está muito difícil achar alguém.”

Bilbo: “Acho que sim, ainda mais por esses lados! Nós somos gente simples e acomodada. E eu não gosto de aventuras. São desagradáveis e desconfortáveis. Fazem com que você se atrase para o jantar. Não consigo imaginar o que as pessoas vêem nelas.”

E lá no fundo, ninguém gostaria de se atrasar para o jantar, certo? Ninguém está ansioso para passar fome, frio, sede ou qualquer outro tipo de necessidade física ou emocional que uma aventura pode proporcionar. Estou falando de aventuras de verdade, do tipo perigosas! Entrar na montanha-russa não conta.

A maior parte das vezes esperamos que as aventuras ou as mudanças que precisam acontecer para vivermos em um mundo mais justo e sustentável aconteçam sozinhas ou que alguém as provoque, sem que exista um grande esforço da nossa parte. Nos limitamos a fazer a nossa revolução por meio das redes sociais e esperamos que alguém resolva o problema do lixo, da violência, da poluição, do abandono ou da falta de perspectiva de vida. Problemas como as mudanças climáticas ou o fim da guerra nem se fala, deixamos para o pessoal da ONU resolver.

É preciso encararmos o fato de que essas mudanças não vão acontecer sozinhas. Precisamos assumir a responsabilidade e fazer algo para que elas aconteçam, mesmo com pequenas ações no nosso dia a dia, porque assim como a teoria do caos, um simples movimento, uma simples ação, pode alterar o rumo de toda a história, e não subestime o poder de uma atitude que parece pequena.

Um feedback bem estruturado que damos aos nossos colegas pode impulsioná-los a trabalhar com mais entusiasmo, assertividade e segurança no seu potencial; Executar nosso trabalho com carinho e dedicação mostra que disciplina e responsabilidade nos levam à prosperidade; O lixo que reciclamos ensina que cuidar do meio ambiente é dever de todos; Tratar os filhos com paciência e amor ensina que construir um bom relacionamento demanda esforço, mas o resultado é inestimável; Fazer um trabalho voluntário para beneficiar aqueles que não tem condições, ensina que nutrir empatia e respeito tem resultado positivo na comunidade em diversos aspectos, como econômico, de segurança, de saúde e de bem-estar.

As nossas atitudes, a forma como nos comportamos e os valores que carregamos são exemplos para as pessoas que estão ao nosso redor, e tem o potencial de encorajá-las a fazer o mesmo.

Ter consciência disso faz com que a gente pense duas vezes antes de tomar qualquer atitude que possa influenciar os outros a repetir um comportamento negativo.

Sabe quando repreendemos alguém por ter jogado lixo na rua, estacionado em local proibido ou ter gritado com uma criança, e a pessoa responde “mas todo mundo faz isso”? É sobre isso que estou falando.

Retornando ao diálogo de Tolkien:

Bilbo: “Eu não gosto de aventuras. (…) Não consigo imaginar o que as pessoas vêem nelas.”

Gandalf: “Você vai ter uma história ou duas para contar quando voltar.”

Bilbo: “Você pode me prometer que eu vou voltar?”

Gandalf: “Não. E se voltar, você não será o mesmo.”

Uma aventura, realmente, não é uma experiência confortável. Tudo o que desafia o status quo vai demandar uma certa quantia de energia, esforço e coragem.

Malala não estava em uma situação segura quando enfrentou os talibãs locais, que impediam as jovens garotas de frequentar a escola.

Dalai Lama, líder espiritual mais importante do Tibete, que até hoje defende o bem-estar dos tibetanos utilizando a abordagem do “Caminho do Meio” com a China para resolver pacificamente a questão do Tibete, não se encontra em uma situação agradável e tranquila desde muito antes de ser exilado da China.

Claro que entendemos que Malala e Dalai Lama são pessoas excepcionais, apesar de um dia já terem sido consideradas comuns. Mas existem inúmeras formas de sermos ativistas daquilo que acreditamos que precisa ser mudado, respeitando o nosso horário de trabalho e as demais responsabilidades do dia a dia.

A exemplo de pessoas que dedicam tempo para ensinar uma profissão a jovens e adolescentes em comunidades carentes, para que tenham um futuro mais promissor; de pessoas que levam arte, dança, música e esporte para pessoas que não têm acesso, proporcionando uma melhor qualidade de vida e perspectiva de futuro; de pessoas que se dedicam a cuidar e a fazer companhia para pessoas idosas, que muitas vezes estão enfrentando uma solidão severa; de pessoas que se dedicam a apoiar e conscientizar pretendentes a pais por adoção, já que é uma experiência completamente diferente; de protetores de animais, que se desdobram para resgatar, acolher, medicar e encontrar lares para animais abandonados.

Ou seja, não é preciso ser a Malala ou o Dalai Lama, e colocar sua vida em risco, para viver uma aventura e provocar mudanças. O que precisamos são de pequenas-grandes ações, vindas de pessoas que realmente se importam.

Então a dica final desse artigo é: encontre uma causa pela qual você se importe, a que você acredita que precisa de mais atenção e força para mudar a realidade na qual vivemos, e faça um planejamento para contribuir com essa melhora. Não precisa ser nada que ocupe horas e horas do seu dia, ou que vá te levar a exaustão. Todo trabalho que executamos deveria ser prazeroso e divertido. Encontre luz nessas atividades e faça o que te faz sentir bem. A sensação de fazer parte de algo muito maior do que nós mesmos é maravilhosa.

Assim como disse Gandalf em seu diálogo com Bilbo, quando nos arriscarmos a viver uma aventura, corremos o risco de não retornar ou, se retornarmos, não seremos os mesmos. E ele tem toda razão. Qualquer mudança que nos propomos a influenciar no mundo causa, antes de tudo, uma transformação radical em nós mesmos.

E tudo pode ficar muito melhor, assim como nas histórias de Tolkien, se decidirmos encarar uma aventura.

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Esse artigo foi inspirado no projeto Design2020, 2021 e 2022 do Vitor Guerra, onde ele encoraja que façamos uma reflexão sobre a área de design no ano que se passou e em perspectivas para o ano que esta por vir.

Agradecimentos especiais para a vaniateofilo que me despertou para a importância desta citação em uma das nossas maravilhosas conversas rotineiras e para a Thaís Haro que revisou este artigo com tanto amor.

Recomendação de Leitura

  • Minha vida e minhas experiências com a verdade, Mahatma Gandhi, 2021
  • A arte da felicidade, Dalai Lama e Howard C. Cutler, 2000
  • O caminho do meio: fé baseada na razão, Dalai Lama, 2011
  • Eu sou Malala, Malala Yousafzai e Christina Lamb, 2013
  • O Hobbit, J.R.R. Tolkien, 1937

Recomendação de filmes

  • Efeito borboleta, Eric Bress e J. Mackye Gruber, 2004
  • O Hobbit, Peter Jackson, 2012

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Tereza Alux
Ladies That UX PT

Designer de Experiências, Professora e Diretora Global da Comunidade da Ladies That UX