A Amiga Genial, de Elena Ferrante: um livro para você se identificar

Carolina Carettin
Lado M

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A Amiga Genial é o primeiro livro da série Napolitana, de quatro livros, escrito pela autora italiana Elena Ferrante, pseudônimo de uma escritora (ou escritor, quem sabe) que raramente dá entrevistas — quando dá é por escrito, como a que saiu na The New Yorker .

O livro começa com uma ligação do filho de Lila, uma amiga de infância de Elena, dizendo que a mãe desapareceu. A partir da fuga de Lila, Elena começa a escrever todas as lembranças que tem com a amiga, desde a infância em Nápoles.

Dividido em duas partes, a história se passa na periferia de Nápoles, em um bairro de trabalhadores que ainda sofre com as consequências da Segunda Guerra Mundial e é marcado pela violência, brigas entre vizinhos e morte. O bairro funciona como um microcosmo, no qual todas as necessidades dos jovens e crianças são supridas ali, e há a todo momento a vontade de conhecer o que existe além do bairro, além daquelas pessoas que os personagens conhecem desde sempre.

A relação do ambiente com as pessoas permeia A Amiga Genial. Os personagens se relacionam e se influenciam a todo o momento, assim como o bairro, os costumes e os acontecimentos passados.

Entre as personagens principais, por exemplo, há uma relação de dependência muito forte, como se elas precisassem uma da outra para se construírem e para existirem, mas há também uma constante competição entre elas.

Se na primeira parte conhecemos a infância das personagens, na segunda mergulhamos na adolescência. A partir daí. é possível observar melhor a relação de Elena com outras mulheres. Em sua mãe, por exemplo, Elena vê algo que ela teme: uma perna doente, o olho meio torto que não sabe para onde olha.

Pessoalmente, me identifiquei muito com Elena. A forma de agir, de pensar, a relação de esforço constante em relação aos estudos, o hábito de ler, a insegurança com o corpo. A lembrança mais nítida que tenho do começo dessas mudanças é de um dia estar tomando banho, olhar para as minhas pernas e perceber as coxas mais grossas e um quadril largo que parecia ter aparecido ali do dia para noite. Outra, é de um dia em que as minhas amigas chegarem na escola contando (sem que a protagonista do episódio soubesse) que uma delas tinha menstruado durante à noite e que o sangue era tanto que vazou no lençol e sua mãe precisou jogá-lo fora. Com certeza aumentaram um bocado o volume da menstruação da garota.

Também compartilho do sentimento quanto aos rapazes. Durante a adolescência eu não me achava bonita, não ficava com nenhum menino e demorei para ter um namorado. Fui aceitar meu corpo há pouco tempo e, hoje, o fato de não ter tido vários namoricos durante a adolescência não faz diferença (eu até dou risada), mas até os meus 15 anos foi meio assustador, como se eu precisasse de um relacionamento para me aceitar.

Ler A Amiga Genial me fez sorrir ao ver um grupo de adolescentes andando na rua, rindo alto e dizendo bobagens. Também me fez sonhar que eu estava velha, com um cabelo comprido, branco e grosso. No sonho, eu me olhava no espelho e ainda me via vinte anos, mesmo tendo atingido os 80.

Originally published at www.siteladom.com.br on October 2, 2016.

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Carolina Carettin
Lado M
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Jornalista, caipira de Araras, interior de São Paulo. É bailarina desde criança, ama ler e é fã da Rita Lee.