Chapeuzinho Esfarrapado: a era feminista das histórias infantis

Thayna Iglesias
Lado M
3 min readDec 13, 2016

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Chapeuzinho Esfarrapado e outros contos feministas do folclore mundial é um livro simplesmente encantador. Enquanto lia, várias vezes pensei em como seria ouvir essas versões de histórias tão conhecidas aos sete ou oito anos de idade.

A coletânea, organizada por Ethel Johnston Phelps e ilustrada por Bárbara Malagoli, reúne 25 contos de diversos países e continentes. Algumas histórias remontam a tempos distantes, já outras são um pouco mais atuais, mas todas tem uma coisa em comum: são protagonizadas por mulheres inteligentes, corajosas e decididas!

O livro cumpre seu objetivo: “trazer exemplos de personagens femininas em quem as garotas podem de fato se inspirar”. Nada de Rapunzel esperando passivamente na torre mais alta. Nada de Bela Adormecida acordando com o beijo de um príncipe desconhecido. Em vez disso, temos mães corajosas que fazem de tudo para salvar os filhos. Esposas insatisfeitas que deixam os maridos só para comerem suas cebolas em paz. Princesas que libertam seus amores de maldições terríveis, recusam casamentos arranjados ou, ainda, deixam um castelo cheio de riquezas para trabalhar e fazer sua própria fortuna. São diversas situações em que mulheres, sejam elas jovens, adultas ou idosas, precisam usar suas habilidades para resolver problemas e encontrar seu final feliz.

Minha história preferida de Chapeuzinho Esfarrapado fala sobre três mulheres japonesas — uma jovem, sua mãe e a avó -, todas extremamente fortes, a ponto de levantarem vacas e arremessarem árvores. Elas mostram a um lutador famoso, machista e egocêntrico o quão fraco ele é perto delas, e o ajudam a ficar forte de verdade. No fim, ele aprende a ser uma pessoa mais humilde, se torna um fazendeiro como elas, e se casa com a jovem Maru-me. Sim, o casamento ainda representa, na maior parte das histórias, o final feliz. Mas a introdução do livro — muito explicativa e proveitosa para os adultos — explica que esses contos foram criados na perspectiva de sociedades rurais, onde o casamento era necessário para a sobrevivência, e simbolizava uma vida próspera, tanto para o homem quanto para a mulher. O que tornava esse elemento negativo era o fato de ser a única meta das personagens femininas, que apenas esperavam por seu futuro, sem tomar qualquer atitude ou decisão. Isso já não acontece nas histórias adaptadas por Ethel Johnston — o casamento é só um fim, uma consequência, e não o objetivo central das histórias.

Chapeuzinho Esfarrapado e outros contos feministas do folclore mundial é, com certeza, um livro para se passar de geração a geração — e enterrar de vez a velha história da donzela em perigo. Ele foi pensado e escrito para que as crianças, que já crescem em um mundo um pouco menos sexista do que aquele em que nós crescemos, continuem evoluindo para uma sociedade mais igualitária. Para as meninas, ele traz verdadeiras heroínas nas quais se espelhar. Para os meninos, a consciência de que as garotas são tão fortes e corajosas quanto eles, e não devem ser subestimadas. Para os dois, virtudes que qualquer pessoa, independentemente do gênero, deve desenvolver: generosidade, tolerância, persistência, entre tantas outras lições valiosas, que se revelam a cada capítulo.

Originally published at www.siteladom.com.br on December 13, 2016.

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