Como é ser mulher e viajar sozinha pelo mundo afora?

Flora Cruz
Lado M

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Há quatro meses, eu voltei do meu mochilão de 93 dias pela América do Sul e Central, planejado e executado sozinha. Mesmo depois de tanto tempo, ainda me perguntam: “Não foi perigoso ir sem ninguém?” e “Como arranjou coragem para ir, sendo mulher?”. Curiosamente, essas mesmas perguntas sempre vem repetidamente de mulheres diferentes, com histórias e experiências divergentes. Percebi, então, que o medo de ser mulher é algo que assombra a todas igualmente, sem distinção.

Infelizmente, sinto dizer que vivemos em um mundo machista e ele continua sendo no Chile, na Estônia ou na Indonésia. Toda vez que eu subia em um ônibus para atravessar alguma fronteira, eu sabia que teria que me preocupar com a roupa que iria usar e com quem sentaria do meu lado. Eu dormia sabendo exatamente onde estava o canivete na minha mala e como eu levantaria para ir ao banheiro sem me esfregar no passageiro do outro assento.

Nos albergues com quartos mistos, eu me preocupava em não me trocar na frente dos homens e dormia sempre com um lençol em cima do meu corpo, mesmo no calor do Equador. E mesmo com todas essas preocupações, ainda sofria assédios verbais dos guias de turismo, recebia cantadas inapropriadas dos donos de albergues e propostas indecentes de europeus que acham que mulher brasileira é prostituta.

Eu odeio decepcionar vocês, mulheres esperançosas que me perguntam se é perigoso viajar sozinha, esperando uma resposta negativa. Odeio ter que dizer que a coragem que eu tive não é menor da que nós precisamos ter todo dia. Mas sim, é perigoso, para as mulheres sempre é um risco. E sim, claro que é preciso coragem, mas já não precisamos diariamente?

Então viajem, viajem sabendo dos perigos, sabendo que ainda vivemos em mundo machista e tomando as precauções que homens não precisam tomar. Mas vão com a cabeça erguida, cheias de coragem, mostrando que podemos sim ser donas do nosso nariz e enfrentar qualquer obstáculo que coloquem a nossa frente.

Porque vale a pena.

Vale a pena conhecer o mundo pelos próprios olhos, testar seus conhecimentos e limites. Vale a pena curtir a sua própria companhia e perceber que o amor vem de dentro. Se deparar com gentileza atrás de compaixão genuína vinda de pessoas incríveis que vão fazer parte da sua vida pra sempre. Vale a pena ver maravilhas da natureza que te deixem sem ar e te façam questionar seu papel no mundo. E crescer, se sentir insignificante e invencível ao mesmo tempo, com a responsabilidade que a liberdade e independência trazem.

O mundo é grande, gatas, e é nosso. E se querem que a gente zere a vida no modo hard, então zeremos.

Originally published at www.siteladom.com.br on September 20, 2016.

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Flora Cruz
Lado M
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Feminista, jornalista e mochileira, não necessariamente nessa ordem. Acredita seriamente que tudo pode ser resolvido com um sorriso e uma dose de senso crítico.