Em O Círculo, Emma Watson vive personagem surpreendente e complexa

Isabela Borrelli
Lado M

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A trama de O Círculo se passa em um futuro próximo, em que Mae Holland (Emma Watson) é uma garota frustrada profissionalmente que consegue a chance de trabalhar na empresa mais disruptiva do mundo: o Círculo.

No entanto, não é só um ótimo trabalho que é exigido dela, como também uma vida social ativa dentro do complexo da empresa (que mais parece uma minicidade) 24 horas por dia, além de uma exposição — e perda de privacidade — cada vez maior.

Pelo trailer, eu achei que sabia o que esperar. A personagem principal se veria frente a um dilema e, junto de seu namorado ou par romântico, tomaria uma decisão ética e correta e muito provavelmente implodiria o sistema. Nada novo.

Mas eis que eu estava muito errada — muito mesmo.

No começo de O Círculo, Mae nos é apresentada como aquela garota relacionável: ela é jovem, não é bem-sucedida e tem muitas frustrações. Tudo para ser uma personagem média, se não fosse a sua ambição. Ao conseguir uma entrevista para uma vaga no Círculo, uma das respostas dela que mais impressiona é para a pergunta do que ela mais tem medo. Na lata, ela diz que é potencial não explorado.

A surpresa vem um pouco do fato de que o pai da personagem sofre de esclerose múltipla — e isso poderia ser um fator decisivo na vida dela-, assim como de que ainda não é comum uma personagem mulher com ambições profissionais que superem o emocional, por exemplo. Aqui, eu admito que na hora achei a personagem insensível. Só depois eu parei para pensar: eu acharia isso se fosse um homem? Acredito que nem passaria pela minha cabeça.

Seguindo com a trama de O Círculo, obviamente, Mae é contratada. Ao passar dos dias no novo emprego, a garota começa a se destacar e sua presença no complexo do Círculo é exigida cada vez mais. Até que chega o ponto em que Mae vive no campus, onde passa não só a semana como os finais de semana. Ficar longe dos pais não parece exatamente um problema, e é perceptível a absorção cada vez maior da personagem pelo sistema.

Não só sua saúde é monitorada 24 horas, como ela passa a transmitir absolutamente tudo da sua vida: quando ela dorme, come, vai em festas, reuniões, etc., com direito a uma pausa de somente três minutos para ir no banheiro. Consequentemente, ela começa a se afastar dos pais e amigos — que não são do Círculo — e se torna o símbolo de um futuro em que a privacidade não existe mais.

Ao longo da trama, três personagens masculinos se mostram essenciais para a história. Eamon Bailey (Tom Hanks), no papel de um Steve Jobs descolado, faz o papel de grande influenciador de Mae. Ele claramente quer usá-la como garota-propaganda da ideia de vigilância constante e crê que tem a garota na mão. Outro é o amigo de infância de Mae, Mercer (Ellar Coltrane), que parece formar o casal óbvio com ela. Ele se opõe à obsessão dela em expor a vida pessoal e acaba se afastando. Já Ty (John Boyega) é o criador original do Círculo e acredita que a sua ideia inicial foi corrompida, mostrando-se como o caminho óbvio para a implosão do sistema.

Outra vez em que eu fui pega de surpresa: fiquei esperando Mae ter um caso com algum dos dois. Nada. Pode até rolar um clima entre ela e Ty, mas Mae claramente não tem relacionamento como uma prioridade.

O desenrolar da trama surpreende. Talvez mais por trazer uma personagem complexa, com crenças e ambições que não são muito comuns. Mae segue o que acredita que é certo e ela está sozinha nessa, pois os personagens masculinos que marcam presença não conseguem interferir conscientemente no destino dela. Se a decisão dela é certa ou não, isso vai de pessoa. Mas que ela tomou essa decisão sozinha e sem influência masculina, isso ela tomou. Agora é assistir e descobrir se você concorda com ela ou não.

Originally published at www.siteladom.com.br on June 21, 2017.

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