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Família, eu cresci — e não só no RG

Isabela Borrelli
Lado M
Published in
3 min readFeb 22, 2016

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Mãe, eu cresci. Se eu sentir frio, eu vou colocar o casaco, não precisa me lembrar. Posso esquecer de levar o guarda chuva, mas quem nunca?

Apesar de você me ver sempre como seu bebê, eu sou maior de idade e não é só no RG. Faz algum tempo que eu aprendi a tomar decisões e a fazer escolhas — às vezes, elas não são as melhores, mas são com os erros que nós aprendemos.

Não estou aqui pedindo para que você observe de longe enquanto eu quebro a cara. Eu quero você perto para me amparar quando eu precisar. Mas eu estou aqui para que você entenda que eu posso atravessar a rua sozinha. E, por mais perdida que eu pareça, eu sei que vou me achar. Pode ser aflitivo não poder segurar a minha mão para me guiar pelo melhor caminho, mas o tempo passou e eu não sou mais aquela menininha de chuquinha de um lado do cabelo. Eu sou uma mulher que tem medo, sonhos, muitas ambições e alguma preguiça de vez em quando.

Vou conhecer todo o tipo de gente, me envolver com pessoas que você não vai gostar. Vou para festas e talvez eu não saiba como ou quando vou voltar. Mas vou deixar o celular ligado para receber suas mensagens furiosas de madrugada, por mais que eu fale que está tudo bem.

E isso vale para você também, pai. Não adianta bancar o indiferente e fazer cara de quem já sabe. A sua própria falta de palavras muitas vezes denunciam o seu choque. Talvez seja difícil aceitar não só que eu cresci como que os tempos mudaram e eu vejo isso estampado na sua cara quando eu saio com uma mini saia. Eu não sou puta, nem fácil, nem estou tentando ser quem não sou. Eu tenho minha sexualidade e não tem problema algum nisso.

Já decorei vários discursos de vocês, mas sei que vou continuar a ouvi-los diariamente. Isso não significa que eu não vá fazer uma careta ou outra enquanto vocês falam as mesmas coisas de sempre. Eu provavelmente vou continuar falando bastante palavrão e não vai ser uma bronca que vai me impedir de fazer alguma besteira.

E por falar em besteira… Vó, eu sei que na sua época podia ser horrível, mas tatuagem hoje é uma coisa normal. E, para ser 100% sincera, acho difícil eu parar na primeira. Vou ter uma ali e outra aqui. Apesar disso, não se preocupe, pois minha pele vai continuar a mesma que você abraçou e beijou com tanto carinho em todos esses anos. Você pode odiar, mas não tem como me impedir: o tempo já passou e eu não preciso mais da assinatura dos responsáveis.

Segundo a lei, eu sou responsável por mim mesma e isso é meio assustador. Eu cresci sim, família, mas ainda tenho medos. Como vocês também têm. Então, acho que é normal um desespero ou outro. Ainda não sei o que quero da vida e não sei se os meus planos vão dar certo… Estou começando a entender que, mesmo quem parece ter se dado bem, pode não saber exatamente o que quer nem o que está fazendo direito.

A vida é um achismo e eu acho que estou no caminho certo. Apesar de não ser certeza, né?

Afinal, eu cresci, mas não significa que eu quero ficar sem as broncas, comentários, discursos e opiniões totalmente sem noção e cheios de carinho e preocupação de vocês. Por mais que possam ser opiniões contrárias ou comentários ultrapassados, eu sei que eles vêm carregados de uma visão de mundo que eu ainda não tive, inclusive de uma época na qual eu não vivi.

Mas também não vão pensando que eu vou levá-los sempre em consideração.

Originally published at www.siteladom.com.br on February 22, 2016.

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