Minha Coisa Favorita é Monstro é obra-prima de Emil Ferris

Carolina Carettin
Lado M

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Lançado no Brasil pela Companhia das Letras, o primeiro livro de Emil Ferris, Minha Coisa Favorita é Monstro, já pode ser considerado uma obra-prima das graphic-novels.

Usando canetas esferográficas e hidrocor, a autora criou a história de Karen Reyes, uma garota que ama monstros e que registra sua transição para a adolescência em um caderno.

Além de todas as mudanças desse período da vida, Karen resolve investigar a morte de sua vizinha, Anka Silverberg, uma judia que fugiu da Alemanha nazista. A história se passa em Chicago no final dos anos 60, momento que dá um ar noir à narrativa, com Karen vestida de sobretudo como uma detetive tentando descobrir mais sobre o assassinato de Anka.

Ah! Já ia esquecendo que Karen se mostra como uma “lobismoça” em seus desenhos. Além dos monstros serem seus seres favoritos, ela quer se tornar um para fugir de sua realidade. Karen vive com a mãe e o irmão, Dezê, com quem faz passeios até o Instituto de Artes da cidade. São nesses momentos que a técnica de Ferris impressiona mais ainda: os detalhes das obras de arte, as intervenções que ela faz, incluindo as personagens nos desenhos, são incríveis!

Muito mais que um registro da vida de Karen e de suas investigações, a graphic-novel aborda questões como o racismo, enquanto fala da morte de Marthin Luther King Jr., feminismo, maternidade e sexualidade.

Com 416 páginas, o primeiro volume de Minha Coisa Favorita é Monstro ganhou vários prêmios como o Eisner e Fave D’Or , os mais importantes do mundo dos quadrinhos. A previsão de lançamento da continuação é para 2020.

A Autora de Minha Coisa Favorita é Monstro

Foto: Whitten Sabbatini

Emil Ferris lançou Minha Coisa Favorita é Monstro com 57 anos em 2017. Após ter sido rejeitado por 48 editoras, a autora conseguiu ser publicada e ainda recebeu prêmios e elogios de autores como Art Spiegelman, de Maus.

Ao Metro Jornal, ela contou como se sente em saber que sua história chegou a tantas pessoas.

“No meio da noite me pego pensando que, naquele momento, pessoas estão lendo o livro e as sinto próximas de mim. Posso sentir a energia delas e seu engajamento. Por um lado isso é muito honroso, mas também é uma responsabilidade, e talvez o segundo livro demore mais — mas esse é o tipo de conflito que você quer ter!” (risos).

A autora vive até hoje em Chicago, cidade onde se passa a história, e não teve uma vida fácil. Picada por um mosquito, Ferris teve uma infecção em função do vírus do Nilo Ocidental. Na maioria das pessoas, a picada não levaria a nada. Porém, estando com a imunidade baixa, é possível desenvolver doenças neurológicas. Em três semanas, a autora estava paralisada da cintura para baixo, sem falar e com o braço direito sem movimento. Era uma ilustradora freelancer, com uma filha pequena, mãe-solo e que não tinha mais como desenhar.

Foi por toda essa responsabilidade que a maternidade traz consigo que Ferris decidiu aprender algo novo e começou a estudar escrita. Depois de algum tempo ela voltou a desenhar e, após seis anos de trabalho, lançou seu primeiro livro.

A Tradução de Minha Coisa Favorita é Monstro

Para uma graphic-novel ser traduzida é preciso levar em conta todo o trabalho artístico do criador da história. O tradutor de Minha Coisa Favorita é Monstro foi Érico Assis, responsável também pela tradução de Garota-Ranho, também para a Companhia das Letras.

Já a parte gráfica foi feita por Américo Freiria e sua filha, Jéssica. Entre a criação de fontes, redesenho e aplicação de letreiros, tratamento de imagens e diagramação, o trabalho levou dois meses.

Comparação entre a página original e a tradução mostra o trabalho de Américo Freiria e sua filha, Jéssica.

Emil Ferris escreveu todas as letras à mão, o que faz com que as editoras estrangeiras criem fontes baseadas na letra manuscrita do autor, uma vez que refazê-las à mão seria muito caro e demorado. Américo criou quatro fontes baseadas na letra de Ferris. Além do texto padrão, há alguns que não seguem fonte alguma: são onomatopeias, letreiros, nomes de restaurante, capas de revista de terror e cartões que Karen escreve. Nesse caso, tudo foi refeito à mão por Américo e Jéssica.

O bom trabalho e dedicação, tanto da autora quanto da equipe de tradução, são claramente percebidos quando se lê Minha Coisa Favorita é Monstro. São imagens que fazem o leitor mergulhar nas páginas e entrar na história, aguçando a curiosidade sobre o que acontecerá com Karen e sua família nos próximos volumes.

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Carolina Carettin
Lado M
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Jornalista, caipira de Araras, interior de São Paulo. É bailarina desde criança, ama ler e é fã da Rita Lee.