Notas Sobre o Luto é o abraço que não pudemos receber

Carolina Carettin
Lado M

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Novo livro da nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie trata da morte de seu pai, em junho de 2020

Em todo o mundo, são 4,16 milhões de vítimas de covid-19 desde o início da pandemia. 4,16 milhões de famílias e amigos que não puderam chorar suas perdas como de costume. Em Notas Sobre o Luto, Chimamanda Ngozi Adichie escreve sobre a morte de seu pai, em junho de 2020. Em meio à pandemia, os aeroportos da Nigéria ficaram fechados, impedindo que a escritora participasse do velório e enterro.

O livro chega ao Brasil em um dos piores momentos da pandemia, com mais de 540 mil mortos e, por isso, toca tão profundamente. Com uma escrita precisa e simples, Chimamanda tenta nomear os vários sentimentos que aparecem no momento de perda.

Chimamanda com seus pais: Grace Ifeoma Adichie e James Nwoye Adichie.

“O luto é uma forma cruel de aprendizado. Você aprende como ele pode ser um pouco suave, raivoso. Aprende como os pêsames podem soar rasos. Aprende quanto do luto tem a ver com palavras, com a derrota das palavras e com a busca das palavras”.

Quando um ente querido morre, faltam e sobram palavras. Faltam aquelas para conseguir dizer o que sentimos e sobram as condolências de pessoas que, às vezes, não conhecemos. É impossível ler a obra e não lembrar de momentos que vivemos.

Quando meu avô faleceu, por exemplo, ainda dentro do quarto do hospital eu ouvi “Mas todo mundo vai morrer um dia”. A raiva era tão grande que eu queria bater na pessoa que disse isso, queria que tivesse sido ela ao invés do meu avô.

“Era tão próxima do meu pai que sabia sem querer saber, sem saber inteiramente o que sabia. Uma coisa dessas, temida durante tanto tempo, finalmente chega, e na avalanche de emoções vem também um alívio amargo e insuportável. Esse alívio se torna uma forma de agressão, e traz consigo pensamentos estranhamente insistentes. Inimigos, atenção: o pior aconteceu. Meu pai se foi. Minha loucura agora vai se revelar.”

Menos de um ano depois, a autora perderia sua mãe, em março de 2021. Em entrevista para o Roda Viva, Chimamanda diz que ainda estava tentando entender a morte do pai, quando sua mãe faleceu. “Mesmo agora, dizer isso parece tão irreal e estranho”.

Apesar de poucas as páginas de Notas Sobre o Luto são poderosas e tentam dar conta desse turbilhão de sentimentos que aparecem num momento de luto. É um livro importantíssimo, que nos abraça em um momento em que estamos distantes uns dos outros.

“Estou escrevendo sobre o meu pai no passado, e não consigo acreditar que estou escrevendo sobre o meu pai no passado”.

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Carolina Carettin
Lado M
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Jornalista, caipira de Araras, interior de São Paulo. É bailarina desde criança, ama ler e é fã da Rita Lee.