Floresta Escura de Nicole Krauss faz pensar sobre encontros e desencontros

Thais Lombardi
Lado M

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“Um coração partido está mais cheio que um coração alegre, pois um coração partido tem um vazio , e o vazio tem o potencial de enchido com o infinito”

Assim como o nome, Floresta escura, esse livro é denso e repleto de caminhos tortuosos. Escrito por Nicole Krauss, uma autora norte-americana e apontada como uma das grandes escritoras da nova geração, Floresta escura faz referência a Philip Roth e Kafka, que é um dos grandes responsáveis pela segunda narrativa do livro, mas que também está ligada à primeira.

A história de Jules Epstein de 68 anos, é contada em terceira pessoa e de trás para frente. Sabemos que ele desapareceu após um “surto” de se desfazer dos seus bens e viajar até Tel Aviv para fazer uma grande doação a uma instituição que leva o nome dos seus pais. A partir daí conhecemos os seus momentos finais, sua história, seus filhos, ex-esposa e como ele foi levado até a cidade e como conheceu um rabino que acreditava que ele era descendente de Davi.

Já a segunda história, que é contada em capítulos alternados, é a de Nicole. Ela segue o tempo cronológico. Ela é uma escritora, vivendo uma crise no casamento, outra de criatividade, e em alguns momentos sente que está em dois lugares ao mesmo tempo, como se tivesse um doppelgänger ou fizesse uma projeção astral. Ela vai até Tel Aviv com a desculpa de buscar referências para seu novo livro, mas ela quer mesmo é fugir da sua vida por algum tempo e conhecer Friedmann, um professor aposentado de literatura fascinado com a vida de Kafka. Inclusive com a possibilidade de ele não ter morrido na Europa, e sim ter fugido para Israel e viver como um jardineiro.

O que Epstein e Nicole têm comum?

O judaísmo e o Hotel Hilton de Tel Aviv, em Israel, que é quase um terceiro protagonista na trama. Além disso, a escritora e Jules estão perdidos, não fisicamente, mas eles estão perdidos na própria existência. E o hotel é um ponto de partida para a tentativa de uma nova vida.

A forma com que a história segue pode até sugerir que, em uma hora ou outra, as histórias de pessoas tão diferentes vão se cruzar no meio do Oriente Médio e magicamente seus problemas serão resolvidos, como em histórias de fantasia, onde tudo fica bem no final. Mas não é assim.

Primeiramente não sabemos definir o que seria “ficar bem” para esses dois personagens e nem eles mesmos sabem o que seria o melhor para suas vidas. É um livro sobre encontros e desencontros consigo mesmo.

E outra: apesar do final das páginas, a história dos dois parece não ter fim ali. E isso é o que torna a existência dos personagens tão reais: a possibilidade de continuidade da sua vida.

A escrita de Nicole Krauss consegue nos levar para dentro da história e as referências com o mundo que conhecemos e vivemos, nos faz ficar mais próximos dos personagens. Mesmo sem tanto conhecimento e vivência do Judaísmo, e sem ter pisado em Jerusalém ou Tel Aviv, é possível sentir o clima, os cheiros e ver a as formas da cidade. A autora consegue transmitir até mesmo o anseio de mudança que os personagens têm.

Ou talvez o livro só ajuda a florescer a nossa inquietação e nossa necessidade de metamorfose.

Originally published at www.siteladom.com.br on June 3, 2018.

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Thais Lombardi
Lado M
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Cineasta, redatora, revisora, feminista e vegetariana. Gosta de ler, gatos, fazer crochê e destruir o patriarcado.