Por que há tanta mulher com medo de se declarar feminista?

Lado M
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4 min readDec 14, 2016

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Por Helena Vitorino e Carolina Munhão

“É um termo muito forte”.

“Eu não acredito realmente que o mundo seja ‘homens contra mulheres’”.

“Eu prefiro me considerar como humanista”.

Essas três frases foram proferidas em justificativa de por que algumas mulheres não desejarem ser associadas ao feminismo. Elas foram pronunciadas pelas cantoras Kelly Clarkson, Taylor Swift e Bjork, três mulheres que, assim como muitas outras, não desejam ter sua imagem associada à luta ou ativismo em nome da causa feminista. Mas de onde vem esse medo tão grande de alguém te enxergar como feminista? Seriam essas justificativas realmente coerentes para quem não deseja trazer esse “rótulo”?

No livro Sejamos Todos Feministas, a escritora ChimamandaNgozi descreve a primeira vez em que foi chamada de “feminista” por um amigo com a qual ela gostava muito de conversar. Ele protestou: “Você é uma feminista!”, numa entonação claramente pejorativa, como se a estivesse ofendendo profundamente. E à época, por não saber o que era feminismo e muito menos o que fazia uma feminista, ela realmente temia que aquilo fosse algo negativo. E não é novidade que o termo “feminista” trouxe, praticamente desde que o feminismo existe, uma conotação muito depreciativa.

A palavra feminista esteve cronologicamente associada aos termos rebelde; violenta; mulher-masculinizada; mal-amada e/ou mal comida; aborteira. Estes são apenas alguns dos vocábulos que alcunharam por muitos anos as mulheres envolvidas na luta feminista, e só muito recentemente o termo vem sendo desconstruído. Seguindo esta linha, torna-se compreensível que mulher nenhuma gostaria de ter sua imagem, seu caráter e sua reputação associado a expressões tão desastrosas, e ao mesmo tempo, tão distorcidas. Não é de se surpreender que muita gente tenha medo de se declarar feminista.

Tem ainda quem considere o feminismo impróprio por acreditar que ele seja o oposto de machismo, como a cantora Taylor Swift e Lady Gaga o definiram, mas desvincular o conceito de “feminismo é o machismo travestido de saias” seja talvez um dos maiores esforços atuais para que a sociedade compreenda que, enquanto o machismo é um comportamento social oriundo do patriarcado, o feminismo é uma teoria social, desenvolvida nas academias e aplicada na sociedade em questionamento à submissão histórica da mulher. De uma vez por todas: não, feminismo não é uma cópia do machismo! Colocá-los como gêmeos proporcionalmente invertidos é se apegar de forma muito infeliz à semântica de duas palavras próximas.

A comparação com o humanismo é ainda mais distorcida do que a comparação com o machismo, e de uma forma surpreendente, o humanismo foi “defendido” em detrimento do feminismo por personalidades como Meryl Streep, Susan Sarandon e Madonna (sim, a mesma Madonna que há cinco dias deu um belo discurso feminista na entrega do prêmio Women in Music). A grande confusão se desenvolve sobre um desconhecimento do que de fato é o humanismo, que não passa nem perto da ideia de “valorização do ser humano e não do gênero”, como muitos acreditam, mas sim uma filosofia, que visa a racionalidade do ser humano refutando as explicações transcendentais e espirituais, que surgiu na Era Renascentista. Nada a ver com feminismo. Dizer “sou humanista e não feminista” é quase a mesma coisa que dizer: “sou ateu e não vegetariano”. Não existe conexão.

Uma mulher não deveria nunca ser obrigada a justificar seu “não-feminismo”, como aconteceu na final do MasterChef profissionais, nessa última terça-feira (13). A polêmica em torno do machismo no programa ganhou as redes sociais com a viralização de diversas atitudes machistas que a vencedora dessa edição, Dayse, sofreu. Ela foi ignorada em provas em grupos, seus talentos foram contestados diversas vezes e um dos seus competidores chegou a mandar que ela varresse o chão. Ao ganhar o MasterChef, Dayse declarou que, apesar de todas as polêmicas, ela não era feminista. Sua conquista estava sendo questionada e dada como esperada por conta das questões de gênero, dissociando o prêmio de seu talento.

Talvez Dayse não se reconheça mesmo como feminista por não entender o movimento, ou talvez ela não tenha sequer entrado em contato com alguma vertente. Mas, mesmo assim, ela precisou se defender para reforçar seu mérito, porque sim, ela ganhou exclusivamente por ser muito talentosa; e também para não sofrer mais desdém em um ramo que é tão dominado por homens. A conquista de Dayse apenas comprova que apesar das adiversidades todas que ainda somos obrigadas a enfrentar, as mulheres são tão (ou mais, no caso da Deyse) capazes de qualquer coisa que os homens já dominam. Dayse comprovou apenas o que nós feministas afirmamos.

“Feminista” não é um insulto, embora muitos ainda queiram classificar a luta pela igualdade e libertação como um tagarelismo pedante. E se existem aqueles que insistem em criminalizar este termo é porque as feministas realmente botam medo, já que está cada vez mais evidente nosso poder de mudança. Há muito mais feministas por aí do que podemos imaginar, e mesmo aquelas que não se consideram podem estar, inconscientemente, contribuindo para um mundo de oportunidade para as mulheres e desconstruindo, aos poucos, o patriarcado que as cercam.

Não tenha medo de se declarar feminista!

Originally published at www.siteladom.com.br on December 14, 2016.

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