Pressão por todos os lados em O Chão Sob Meus Pés

Ana Luiza Cardozo
Lado M
3 min readMar 31, 2020

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Um olhar mais superficial para Lola (Valerie Pachner), de imediato, aponta para o esteriótipo de executiva ambiciosa e inabalável. Uma visão mais atenta, porém, revela complexidades e nuances escondidas sob a postura fria da jovem. No longa O Chão Sob Meus Pés (The Ground Beneath My Feet), a diretora Marie Kreutzer traduz as pressões condicionadas às mulheres, por meio dos conflitos internos da personagem.

Lola dedica-se à carreira com afinco, área de sua vida na qual pensa exercer total controle. O perfil metódico e contido, exemplificado pelos exercícios físicos diários e rotina calculada, e a obsessão pelo trabalho, camuflam uma vida pessoal marcada por transtornos mentais e um “relacionamento proibido” com sua chefe. Conny (Pia Hierzegger), irmã mais velha da protagonista, sofre de um grave quadro de esquizofrenia. Como tutora legal, Lola se responsabiliza pelos cuidados da primogênita, tentando conciliar duas esferas da vida completamente intensas e distintas.

Os delírios de Conny passam a afetar o equilíbrio emocional da jovem, já sobrecarregada com as tarefas de seu emprego, que passa por turbulências com um importante cliente. O compromisso com a irmã, somado às poucas horas de sono, um ritmo frenético entre viagens, reuniões, planilhas e decisões importantes, fazem com que Lola apresente sintomas do temido burn-out. Para acentuar o estresse da personagem, ela vive um romance com Elise (Mavie Hörbiger), que deverá julgar uma possível promoção da subordinada, impactando diretamente na carreira da namorada.

Lola possui fixação pelo trabalho e é capaz de grandes esforços físicos e mentais para a ascender na carreira. (Créditos: Novotny & Novotny Filmproduktion GmbH)

Vemos uma mulher que se cobra incansavelmente pela entrega de resultados, a fim de conquistar seu espaço num ambiente de trabalho machista. Machismo este reforçado por seu colega de equipe, que não apenas assume, mas celebra cruelmente os privilégios masculinos. Neste mundo corporativo, a imagem, socialmente exigida, de uma profissional feminina, sóbria e eficiente, ainda corre o risco de ser manchada por sua orientação sexual.

Observamos Lola perdendo o que lhe é mais estimado: o controle de sua vida. O medo da loucura domina a protagonista. O terror psicológico ganha força com a atuação de Pachner, que expressa, com naturalidade, a rigidez e o desespero reprimido que acompanha a personagem durante a maior parte do filme. A austeridade da jovem também é representada pelas boas escolhas da diretora. Visualmente sóbria, na produção predominam cores frias, cenários minimalistas e ângulos sem grandes experimentalismos. Diálogos descomplicados e roteiro plausível são fundamentais para a construção de uma obra coerente.

A pressão sobre todos os setores da vida de Lola, faz de O Chão Sob Meus Pés um reflexo de situações comuns à grande parte das mulheres, fazendo uma forte crítica aos papéis sociais que nos são atribuídos.

Trailer de O Chão Sob Meus Pés

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Ana Luiza Cardozo
Lado M
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Internacionalista se aventurando pelo mundo do Jornalismo. Gosta mesmo é de contar e colecionar histórias!