Tati Quebra Barraco: você não errou e a culpa não é sua

Carolina Munhão
Lado M
Published in
3 min readDec 12, 2016

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Foi no meio do seu show que a funkeira Tati Quebra Barraco recebeu a notícia da morte do seu filho. Yuri Lourenço da Silva foi morto na madrugada do sábado para domingo (11), em uma troca de tiros com a polícia militar, segundo informações da UPP da Cidade de Deus, Zona Oeste do Rio de Janeiro, onde Yuri residia. Em meio ao episódio, chama atenção o fato de que a mesma sociedade que se comoveu com a tragédia envolvendo o time da Chapecoense não tenha a mesma empatia com a tragédia familiar vivida por uma mãe que perdeu seu filho.

O que aconteceu com Yuri é rotina na favela. Ele era morador de uma comunidade pobre e era um homem jovem e negro — mais um para a conta da guerra às drogas. Porém, suas duas passagens pela polícia, com uma condenação por furto qualificado, já foram suficientes para que bombardeassem com mensagens de ódio e culpabilização as mídias sociais da Tati Quebra Barraco. Desde “foi merecido”, até a “antes ele que alguém de bem”, milhares de textos odiosos estão sendo mandados para a cantora.

Em nome de uma noção torpe de justiça, alguns comemoram a morte de Yuri, a dor da Tati Quebra Barraco e o fim de uma vida que acabou tão cedo. Celebra-se uma tragédia com argumentos de merecimento, ignorando qualquer possibilidade de humanização daquele que foi apontado como bandido. Yuri, sendo traficante ou não, tendo havido troca de tiro ou não, não merecia morrer. Se ele realmente estivesse envolvido com o tráfico, deveria ser responsabilizado e cumprir uma pena compatível com a lei, mas não ser assassinado. Para cada crime cometido por uma pessoa na sociedade, existe uma norma com suas próprias punições, sendo que a morte não é uma delas.

A bala que matou Yuri, segundo a ONU, mata em média 5 brasileiros por dia, em sua maioria negros e pobres. Mas, emocionalmente, também fere famílias, mães, esposas, filhas, que sofrem diariamente e não encontram conforto em uma sociedade que, além de não lhes dar suporte, também não lhes dá a possibilidade de viver seu luto, já que recebem em seus ombros a culpa de que elas não deram uma boa criação a seus filhos. Todavia, o que muitas vezes acontece é apenas estar no lugar errado, na hora errada e ter nascido da cor que a bala perdida sempre parece acertar.

Nessa situação, nos resta desejar que Tati encontre amor e paz no meio de tanta dor e revolta. Que possamos olhar a morte de Yuri como ela deve ser vista: como a perda de um filho, de um pai, um ser humano, para a violência diária que vitima PMs, mas também vitima filhos das comunidades. E quem sabe um dia, repensando a polícia, a guerra às drogas, a acessibilidade a oportunidades justas, nenhuma outra mãe tenha que se questionar também “onde foi que ela errou”.

Originally published at www.siteladom.com.br on December 12, 2016.

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