As Transexuais também estão no cárcere

Isabela Borrelli
Lado M
Published in
3 min readNov 28, 2015

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Se a prisão já é um assunto dificilmente discutido, a situação de transexuais nesse ambiente é menos ainda. Para começar, uma pessoa que é transexual possui uma identidade de gênero diferente da que lhe foi designada e, se tiver condições financeiras, por exemplo, opta pela cirurgia de mudança de sexo. Muitas vezes, a falta de compreensão da sociedade acerca desse assunto gera preconceito e desrespeito, e na prisão não é muito diferente.

Thalita Tozi, mestranda de Direito Penal e Criminologia na Faculdade de Direito da USP, realizou uma pesquisa em 2010 sobre a realidade de transexuais nas prisões, na qual teve a oportunidade de entrevistar algumas delas do Centro de Detenção Provisória II (CDP II), de Pinheiros. Segundo Tozi, algumas entrevistadas relataram abusos principalmente por parte dos policiais, que as mandavam correrem peladas, especialmente as que tinham peito, rebolar durante a revista, entre outros.

No entanto, as denúncias de violências físicas e psicológicas não se restringem a agentes carcerários, uma vez que, segundo Natália Sanzovo, mestranda em Direito Penal e Criminologia pela Faculdade de Direito da USP e pesquisadora da questão das transexuais que cumprem pena de prisão nos presídios masculinos, a própria administração penitenciária também tem parte nisso. Exemplos dessa violência são que muitas unidades obrigam a transexual a raspar o cabelo antes de entrar na prisão e também não respeitam a orientação sexual de cada uma.

Nesse caso, Sanzovo comenta: “O desrespeito com o principio corolário da Lei de Execução Penal, o da individualização da pena, é não questioná-las sobre sua orientação sexual ou identidade de gênero e colocá-las nas mesmas celas que demais presos homens”. Como consequência, muitas vezes as trans são expostas a abusos dos demais presidiários que as identificam como “mulherzinhas da prisão”, submetendo-as a estupros, obrigação de limpar celas, entre outros.

A experiência de Thalita Tozi no CDP II de Pinheiros foi diferente em relação ao convívio entre as trans e os outros presos, já que ninguém mexia com elas. “Elas que se organizavam lá dentro, então tinha uma cela só para o grupo das trans. Agora, com as facções, a organização geralmente é feita por eles”, acrescenta. Em relação às facções criminosas, Thalita afirmou que o PCC, por exemplo, não abusa das trans, mas também não permite a participação delas no grupo.

Em relação à organização das transexuais em prisões femininas ou masculinas, em maio deste ano duas resoluções com um conjunto de normas e diretrizes que garantem direitos LGBTs no sistema prisional carioca foram assinadas. Apesar de se dirigirem somente ao Estado do Rio de Janeiro, as normas já foram consideradas um grande avanço por incluírem também a possibilidade de travestis e transexuais escolherem entre a prisão feminina e a masculina.

Ao mesmo tempo, Natália Sanzovo afirma não existir uma regra: existem presídios que estão implementando alas específicas para a população LGBT, outros não. Por mais que essas resoluções sejam importantes, já existe uma determinação nacional do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e do Conselho Nacional de Combate à Discriminação, que determina o encaminhamento das trans para unidades prisionais femininas, o que, em geral, não é posto em prática.

Apesar disso, existem alguns exemplos positivos em relação a essa questão: “Em Minas Gerais, por exemplo, a adoção de um espaço separado para abrigar a população LGBT já existe desde 2009, no Presídio de São Joaquim de Bicas e desde 2012 no Presídio de Vespasiano”, cita Sanzovo.

Originally published at www.siteladom.com.br on November 28, 2015.

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