LAJE na Flip 2019: literatura, inovação e alto mar

Dri Kimura
Laje.ac
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6 min readJul 22, 2019

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Fomos a Paraty pelo que há em comum entre a natureza das histórias e a da inovação.

Lugar: o cenário que ambienta a trama

Perdemos os fones de ouvido ainda na rodoviária de São Paulo. Chegamos em tempo de ver nascer na Praia do Jabaquara o impressionante sol de sábado da Flip 2019. Então, estávamos Paraty a dentro. Passamos o sábado sem bateria e o domingo sem documentos. Foi de presença por inteiro a LAJE na Flip.

A Festa Literária Internacional de Paraty é o maior evento de literatura e artes da América Latina. A expectativa é que a expressão, o debate de ideias e o jeito de festa venham a céu aberto e ocupem as construções da cidadezinha de pouco mais de 35 mil habitantes entre Rio de Janeiro e São Paulo. Cada edição presta homenagem a um autor ou autora do Brasil. A 17ª Flip foi a vez de Euclides da Cunha, que pautou pelo viés dos sertões, da prosa nascida no jornalismo e da poesia motivada na política o encontro da literatura com a arquitetura, o design, a cenografia, o urbanismo, o teatro, o cinema, o mar e as pessoas.

Personagens: ecossistema de envolvimento

Começamos com um uber de preço fixo — combinado comercial das altas temporadas de Paraty — e café da manhã com direito a inventar o sanduíche. Queijo, tomate, orégano, abacate no pão australiano, ovos mexidos, torta holandesa. O Empório da Manu se encheu de gente obcecada por poesia e tinha policial fardado-armado querendo arrumar uma fatia generosa e gratuita do bolo de cenoura coberto com chocolate.

Desta vez, a programação principal saiu do cais para se projetar nas praças. A Casa Folha, do jornal Folha de São Paulo, pegou o mesmo lugar privilegiado de sempre, ao pé da ponte, e tinha Cinema da Praça, Livraria da Travessa, Casas Parceiras da beira do mar, lojas, restaurantes e cachaçarias aos montes.

Chamado: utopia — o sertão vai virar mar?

Do programa principal, almoçamos a mesa entre Ismail Xavier e Miguel Gomes. Falaram das rimas visuais no cinema de Glauber Rocha, de utopias e da velha indagação entre o sertão e o mar. Foi uma conversa muito sobre o que as representações artísticas têm que ver com o futuro e sobre o desejo despertado pela curiosidade nas alegorias. Miguel Gomes — o diretor que irá filmar “Selvajaria”, sua adaptação de “Os Sertões”, a partir da região de Canudos — não poupou elogios à prosa de Euclides da Cunha, racional e delirante, e o fechamento da mesa puxou os aplausos a partir da convocação de Ismail Xavier, por alguém que traga uma nova profecia, uma alegoria de novas esperanças.

“Há no filme movimentos em direção a um processo futuro, profetizado, que é a ideia de o sertão virar mar.”

Ismail Xavier

Tempo: presente praticado e futuros desejáveis

Pelas ruas, nos deparamos com as caixas de som das Casas Parceiras que, abarrotadas de público, transbordavam o conteúdo das conversas com a transmissão para fora. Descobrimos Ayelet Gundar-Gonshen, entrevistada por Mariana Mendes e traduzida ao vivo na ativação da TAG, um clube de curadoria de livros e associação de leitores. O romance de estreia da autora israelense, “Uma Noite, Markovitch”, já em 14 idiomas, conta a história de dois jovens no contexto de casamentos fictícios arranjados para buscar a salvação diante da Europa sob Hitler e o alcance da futura pátria judaica.

Gundar-Gonshen falou sobre construção de personagens e da relação entre pequenos indivíduos e os eventos históricos que os rodeiam. Uma percepção da literatura como forma de observar, investigar e modificar quem são as pessoas a partir da conexão entre suas narrativas pessoais e a história dos grandes eventos.

“As melhores experiências de leitura são aquelas nas quais você se vê refletido no personagem, fica com nojo, mas resolve olhar mais uma vez”.

Kristen Roupenian

Acontecimento: o encontro entre formadores de opinião e tomadores de decisão

A LAJE é parceira do Projeto Livro ao Vivo, da plataforma de conteúdo literário As Gêmeas Produções. Com 30 anos de mercado editorial, Simone Ruiz levou a iniciativa para a Flip 2019 para promover conversas e palestras entre pessoas que rendem livros. As apresentações de livros em vários formatos incluem convidados dos mais diversos ambientes, de artes a negócios, para falar de literatura em ficção e não-ficção.

Ao final de sábado, acompanhamos a palestra de Elena Crescia, curadora do TEDx São Paulo, sobre Coragem e Vulnerabilidade, a partir do tema levantado pelo TED “O Poder da Vulnerabilidade”, da pesquisadora americana Brené Brown. Crescia apresentou exemplos e bastidores de eventos do TEDx, contou dos desafios na hora de encontrar a melhor forma de contar uma história para um grande público e falou da importância de seu propósito de vida: contribuir para que as pessoas com grandes ideias possam compartilhar mais e com mais pessoas.

O evento Livro ao Vivo subsequente na Casa Mar foi o encontro entre Sergio Pugliese, do Museu da Pelada e da Approach Editora, e os empresários Pedro Salomão (Rádio Ibiza) e Cello Camolese (Zazá Bistrô, Vezpa Pizzaria e Cervejaria Devassa). Uma conversa sobre empreender no atual cenário do Rio de Janeiro, sobre as iniciativas já em transformação do contexto carioca de negócios e sobre as habilidades para liderar mudanças.

Nova narrativa: o sertão que vira mar

“Quando escrevemos, estamos investigando a própria memória, a memória alheia, e a invenção”.

Miguel del Castillo

Ainda no sábado, logo antes de jantarmos de frente para a livraria, com pinot noir e vendo passar pessoas que rendem livros, Simone Ruiz nos convidou a levar a palestra da LAJE para o Pery e conversar sobre histórias como estratégia de inovação al mare, em plena navegação.

“O amor pelo mar não seria o bastante para desbravar o mundo sem o desejo de se aventurar aprendido nos livros. Sem a leitura, eu teria passado a minha vida inteira passeando pela costa de Paraty. Foram os livros que me fizeram querer explorar vários outros lugares”.

No domingo, a Rua da Praia amanheceu inundada. O mar veio concretizar a imersão que começou cultural e caminhava para um mergulho literal nas águas de Paraty. Compramos roupas de banho na feira do cais e foi assim: a conversa mais a céu aberto no chão mais volátil e incerto.

Epílogo: era uma vez

Deixamos a Flip de uma rodoviária abarrotada e com aquela mesma sensação que vem quando terminamos de ler um livro dos bons: a gente não sabe dizer exatamente o que, mas mudamos completamente.

Diante de um enredo complexo, com personagens cheios de particularidades e um cenário transformado pelo tempo, as mudanças sutis é que fazem a diferença. É preciso estar atento aos detalhes, se entregar sem garantias e ligar um evento a muitos outros.

Ouvimos dizer de mesas que, ainda na programação principal, trouxeram à tona críticas a Euclides da Cunha. E houve a convicção de Miguel Gomes quando contou de ter comprado em Lisboa uma edição de “Os Sertões” que ele lê todos os dias.

Nas histórias, superamos o “ame-o ou deixe-o”. Não há espaço para o que é definitivo, fechado. A arquitetura do enredo rompe a linha reta com o delírio e a beleza para partilhar uma ideia que se teve, os sons que nem sempre se ouvem, as características a mais.

Isso sem falar do aspecto revolucionário das histórias quando se renovam à semelhança com o mar que inunda a cidade no último dia de uma Festa Literária. Com todos os seus detalhes caprichosos e suas pessoas dispostas a celebrar histórias de valor e construir novas narrativas.

O final é constantemente um recomeço.

Quer saber mais sobre storytelling como estratégia para inovação? Conheça nosso Workshop, em São Paulo ou no Rio de Janeiro.

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a LAJE é uma plataforma de inovação e aprendizagem que gera soluções de negócio ágeis e abertas, para que pessoas e organizações prosperem a partir de seus propósitos, desenvolvam habilidades do agora e cresçam na mudança.

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