Nós precisamos impedir que o funil de referência venha dos mesmos mesmos homens brancos

Thaisa Fernandes
Latinx no Poder
Published in
22 min readJan 29, 2021

Baseado no episódio com Linda Ruiz David 🇲🇽🇵🇷

Bem-vindx ao Latinx in Power, um blog e podcast que compartilha histórias de líderes Latinxs incríveis ao redor do mundo, apresentado por Thaisa Fernandes. Nós conversamos com Linda Ruiz David, uma Engenheira Industrial da Cidade do México. Ela também estudou Italiano e Artes na Espanha, Alemanha, Áustria, França, Itália e Inglaterra.

Linda está atualmente trabalhando como Recrutadora Principal na Growth by Design. Ela fundou e liderou a primeira comunidade latinx e hispânica no Pinterest. Linda trabalha criando culturas de trabalho inclusivas, empáticas e divertidas. Ela também estava no Board for Latinas in Tech, trabalhou na IBM e General Electrics, entre outros.

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Onde sua história de vida começa?

Eu sou uma millennial mais velha, que na verdade parece ser mais jovem do que realmente sou. Eu nasci na Cidade do México, numa familia que é bicultural, minha avó era americana, meu avô era mexicano e meu lado paterno era latinx. Minha avó era de Porto Rico e meu avô era mexicano também.

Nós crescemos em uma família na qual todos realmente acolheram diferentes culturas e amavam viajar. Quando eu tinha mais ou menos um ano, minha família se mudou para Los Angeles, porque meu pai trabalhava para a Mexicana de Aviación, que era uma linha aérea que faliu há alguns anos.

Eu cresci de uma forma bicultural, falando inglês e espanhol, por isso eu não tenho sotaque. Eu sou questionada sobre isso todas as vezes que eu falo com um americano e eles dizem, “espera, por que você não tem sotaque?”. Na verdade, eu lembro de ter muita vergonha de falar espanhol em público, quando estávamos em Los Angeles, e de novo, quando estávamos no México e minha mãe falava inglês conosco, eu ficava sempre acanhada. Eu realmente aplaudo minha mãe por fazer isso. Você é apenas uma criança quando sente esses momentos de acanhamento, mas ela realmente não nos forçou a ser bilíngue o tempo todo que estávamos vivendo em uma parte diferente do mundo. Eu não acho que nós teríamos mantido a língua da maneira como eu e meu irmão fizemos se não fosse pela minha mãe.

Eu cresci em Los Angeles até meus 10 anos de idade. Nós amamos crescer lá, fazíamos parte do grupo de escoteiros das garotas e dos garotos. Eu gostava muito das atividades ao ar livre e dos esportes, todos esses tipos de coisas, mas crescer em Los Angeles nos anos 90 era bem complicado também. Eu acho que as pessoas estavam um pouco bravas, porque existia muita tensão racial, que nós estamos experienciando agora novamente. Nós, na verdade, acabamos nos mudando para a Cidade do México, porque depois do meu pai ter deixado a Mexicana de Aviación, ele comprou um posto de gasolina, e durante os protestos de Rodney Kings esse posto de gasolina foi destruído. É seguro dizer ainda que tem sido um grande gatilho ouvir os helicópteros aqui em São Francisco ou ver o estrago que tem sido feito, mas também apenas a violência contra os corpos durante os protestos que se tornam violentos — esses são protestos causados por injustiça e iniquidade no nosso país. Então, isso realmente me ajudou a fazer alguns trabalhos introspectivos e emocionais profundos, para entender por que isso é um gatilho. Eu apenas quero ser clara, não é a parte do tumulto que tem sido difícil para eu digerir.

Voltando à minha história, eu cheguei no México com 10 anos de idade, estava na quarta série. Eu era chamada de “la gringa” ou americana. Eu tinha um sotaque quando cheguei, claro, eu não consigo me lembrar, nunca ouvi meu sotaque, mas eu também gostava de praticar esportes com os meninos no intervalo, e eu realmente não via nada de errado também em ser a gringa ou ser uma tomboy ou praticar esportes. Eu apenas continuei fazendo aquilo, apenas continuei fazendo o que parecia certo e o que eu gostava. Esse é realmente o tipo de coisa que eu tenho feito em minha vida desde então.

Minha mãe, pai e minha família me apoiaram muito também nesse estilo de vida, eles falavam, “enquanto você não estiver machucando ninguém e estiver sendo respeitosa, crescendo e abraçando a verdade, você apenas está fazendo o seu negócio”. Foi muito divertido crescer no México também, especialmente durante a adolescência, quando você começa a pensar que é crescida. Lembro de começar a sair com 15 anos em Acapulco. Eu não acho que cresci rápido demais, mas acho que nós começamos a gostar de diferentes partes do que é ser uma adolescente de uma forma realmente respeitosa.

Eu fiz muitos amigos para a vida toda na escola, no ensino médio, na escola e também na faculdade. Eu continuo em contato com muitos deles, meu grupo de amigos no México é enorme. Quando conheci meu marido, ele disse que muitos deles se parecem comigo. Ele meio que notou que muitos dos meus amigos são brancos. Isso me torna parte de um grupo socioeconômico muito privilegiado — a maioria dos meus amigos, minha família e meu círculo de influência se parecem comigo. Isso realmente me fez perceber o quanto de diversidade estava faltando na minha vida, quantas perspectivas diferentes e diversas experiências vividas por pessoas, com diferentes contextos históricos, faltavam a mim.

Foi só quando eu finalmente me mudei para os Estados Unidos, em 2010, que fui capaz de começar a acolher pessoas não apenas de diferentes contextos raciais mas também de diferentes partes do mundo. Eu me mudei para San Diego em agosto de 2010 e amava a ideia de deixar a caótica, maluca e ocupada Cidade do México. Eu gosto de ser capaz de surfar e fazer atividades que são mais ao ar livre e mais sadias. Não apenas sair para baladas e beber. Eu realmente adotei mais o estilo da Califórnia, com o qual sempre me senti verdadeiramente conectada também.

Eu conheci meu marido mais ou menos seis meses depois de ter me mudado para San Diego. Nos conhecemos em um bar, ele é um homem branco da Georgia, seu nome é Keith. Na verdade, ele era um marinheiro naval quando eu o conheci, fazia parte de uma elite de operações especiais da força militar. Eu não tinha ideia do que era um marinheiro naval. Lembro de perguntar para algumas pessoas no trabalho o que eles faziam, um dos meus mentores disse, “ai, meu Deus, eles são o verdadeiro “partidão”, você deve mantê-los por perto”. Eu não tive exposição a nenhum militar no México, o que novamente prova o quanto de diversidade estava faltando na minha bolha de pessoas.

Cinco anos atrás, nos mudamos para São Francisco. Eu larguei meu emprego, que na época era para uma empresa de atum, uma empresa mexicana de atum que estava vendendo e distribuindo atum para os Estados Unidos. Eu estava ajudando eles com o desenvolvimento do negócio e operações, o que era muito divertido. Eu queria conhecer indústrias diferentes de perto, mas sabia que queria conhecer para mudar também para a indústria de tecnologia. O Keith conseguiu um trabalho logo de cara, o que foi ótimo; ele é muito qualificado e também muito inteligente, com um excelente histórico. E eu levei quatro meses para encontrar um emprego, na primeira vez, em uma agência de recrutamento na qual estava trabalhando com outras startups. Isso me deu uma exposição muito grande à cultura do alto crescimento de startups e a como me deslocar e navegar conversando com candidatos e aprendendo sobre seus históricos — e como isso se encaixaria em diferentes empresas e organizações com as quais nós estávamos trabalhando. Essa oportunidade foi, de fato, ótima.

O que significa ser latina para você?

Eu estava pensando sobre isso, quando você cresce e vive fora dos Estados Unidos, você não pensa de fato, “ah, eu sou latina” — isso se torna uma parte verdadeira da sua identidade. Uma vez que me mudei aqui para os Estados Unidos, com frequência destacava isso para novamente trazer às normas dos outros como as pessoas latinxs se parecem ou soam. Quando penso sobre minhas amigas latinas, as pessoas que eu deixei no México ou nas muitas latinas de diferentes partes da América Latina que conheci aqui, penso em generosidade de espírito. Sinto um calor no meu coração só de pensar em quão autenticamente dedicamos nosso tempo e cuidado. Damos nosso apoio e, na verdade, apenas nosso amor a quem precisa. Eu penso em como somos generosos.

O que você faz hoje?

Depois de um ano trabalhando para essa startup, eu me aproximei de alguns contatos e aliados que eu tinha no setor de tecnologia, por exemplo na Lyft, no Pinterest e outras empresas com as quais havia conversado no ano anterior. Eu tive uma oportunidade criada para mim no Pinterest como recrutadora, uma vez que estava lá, o que foi um ano e meio depois de eu ter chegado em São Francisco. Foi quando eu comecei a ver, em grande escala, o quanto de concepções erradas havia ao redor desse problema de canalização.

Eles diziam, “nós não temos muitas latinas trabalhando aqui, porque não existem muitas latinas trabalhando em tecnologia”, e eu falava, “eu estou aqui”. Eu achava um pouco legal ser a primeira lá, a primeira latina a falar, “ei, existem muitas outras latinas aqui no Pinterest, por que nós não criamos uma comunidade para nós?”, ou “ei, existem muitas latinas no ambiente de trabalho, por que nós não saímos e nos engajamos de verdade de uma forma real ao invés de apenas criar oportunidades de emprego e esperar as pessoas se candidatarem?”. Nós sabemos que muitas dessas posições, o que os descritores da vaga fazem, são tão fora do entendimento que as pessoas não se candidatam. Isso aconteceu comigo esse ano, eu falei, “não tenho seis anos de experiência em diversidade, equidade e inclusão no trabalho, eu não tenho essa experiência”, e meu marido disse apenas para me candidatar e contatar pessoas que conheço melhor. Eu disse, “você está certo”.

Ainda que seja legal ser a primeira, não é legal ser a única. Quando eu comecei a construir nossa comunidade e a engajar pessoas na empresa para dizer, “ei, onde os seus amigos trabalham, onde eles vivem, como nós podemos fazer com que pessoas boas se engajem com pessoas boas para fazer com que esse funil de referência pare de vir das mesmas pessoas, que são predominantemente um homem branco ou um homem asiático?”.

Eu acho que, tornando acessíveis diversas formas criativas para as pessoas dentro do recrutamento para de fato começar apenas fazendo o trabalho, acho que existe muito medo ao redor. “Bem, como você sabe entrar em contato com pessoas latinxs?”, e eu respondi “do mesmo modo como nós fazemos com as outras pessoas”. Às vezes, eu adicionava um “Hola do Pinterest” ou “Olá do Pinterest”, o que realmente me ajudou a conseguir alguma adesão, porque muitas pessoas não recebem nenhum tipo de comunicação na sua língua. Então, sempre que eu podia, fazia isso apenas porque eu prefiro mais demonstrar do que não demonstrar, mesmo que seja imperfeitamente. Isso não é infalível, nem toda latina com quem trabalho se aproximou para vir à empresa, mas eu acho que comecei a construir essas relações de uma forma acolhedora, o que é outra coisa que latinas fazem muito bem. Isso realmente me ajudou a construir uma comunidade, e não apenas para pessoas latinxs, mas com pessoas de todos os tipos de contextos históricos, todas as partes do país, com experiências diferentes.

Começar a construir esses times e vê-los operar, vê-los exceder as expectativas repetidamente foi muito gratificante. O que acontece depois que eles passam pela porta, aquele ambiente, aquela cultura de dizer, “ei, eu tenho, através da minha experiência ou através da minha educação ou através das minhas ideias — eu tenho isso para adicionar”. De fato, ser capaz de trazer isso à tona foi muito gratificante. Assistir a essas pessoas crescerem por si mesmas, assumir seu próprio poder — foi ótimo. Depois, apenas começar a liderar e começar a trazer mais pessoas, foi apenas mostrar às pessoas, liderar pelo exemplo.

Eu lembro de uma pessoa que nós trouxemos que olhou para mim, nem mesmo foi longe para olhar, apenas apontou para mim e disse, “Linda, olha quão longe ela chegou, quanto ela tem feito nessa área”. E, realmente, a única coisa que eu queria fazer era trabalhar e trazer pessoas junto comigo, para que eles pudessem ver e perceber o que você sabe, o porquê de ser tão importante sentir-se balanceada, com times mais diversos; por que é importante para nós estarmos engajadas com as pessoas durante o processo e depois, porque nós somos pessoas e nós estamos em um negócio de criar oportunidade para pessoas. Então, apenas relembrar o pessoal que esse trabalho era super importante para mim e compartilhar minha história. Por que meu marido conseguiu um emprego em um mês, sem qualificações ou requerimentos, enquanto para mim demorou cerca de um ano e meio para entrar na indústria da tecnologia? Nós precisamos começar a dissecar isso e começar a dissecar como nós apresentamos essas oportunidades de crescimento. Nós precisamos começar por construir igualdade no processo de contratação, vamos nos lembrar de como qualquer disparidade poderia ser criada nesses times e tentar mitigar isso. Nós temos muito poder no que nós fazemos como recrutadores e como pessoas de recursos humanos, então vamos usar isso.

Quais são as ações que as pessoas podem tomar rumo a inclusão e diversidade? Como nós podemos ter mais aliados?

Existe muito medo das pessoas pensarem que elas aparecerão incorretamente. Eu tenho visto, durante meu tempo aqui na tecnologia, não participar de um evento LGBTQ porque você não é um membro dessa comunidade, ou não aparecer em um evento de afro-americanos, ou eventos de Juneteenth [Dia da Emancipação dos escravos, nos EUA], porque você não é parte daquela comunidade. Eu participaria, eu simplesmente quero aprender.

Eu também quero deixar claro que eu me importo em não participar e não ter essa confiança que você pode ter nessas conversas, porque você talvez não seja um membro dessa comunidade, mas você tem amigos, familiares ou pessoas com quem você se importa que estão nessas comunidades. Você vai ver como eles se sentem durante esses momentos de desigualdade ou de injustiça e como você pode ajudar a diminuir o fardo que eles estão carregando sobre algo que eles absolutamente não podem controlar, como a cor de pele. Eu acho que esses diálogos que estão acontecendo nas comunidades vão continuar acontecendo, e eu acho que se nós participarmos e nos envolvermos, nós também podemos nos educar sobre como ter esses diálogos com as nossas pessoas, familiares, colegas e amigos.

É muito importante agora, mais do que nunca, ter coragem para ter esses diálogos, já que nós gostaríamos de começar a nos soltar dos sistemas patriarcais, de como famílias são formadas e quais são as funções. Mulheres podem liderar — mulheres podem ser as líderes e devem ser as líderes de suas famílias e elas deveriam ser capazes de assumir poder. Nós devemos liderar esses diálogos relacionados, que vêm de um local de amor.

Eu tive um momento muito assustador, no qual eu compartilhei experiências vividas e o que o movimento Black Lives Matter queria dizer para mim com meu companheiro Keith e sua família, que é conservadora, religiosa e militar. Eu honro e respeito tudo que eles são e o que eles representam na minha vida, mas eu queria o mesmo respeito e a mesma observância em troca. Eu acho que mostrando isso a eles — foi por meio de uma carta, por meio de uma amorosa carta sobre as minhas experiências –, fui capaz de capturar de onde eu vim e talvez capaz de ser eu mesma, não ter remorso com eles em locais nos quais eu sentia que eu não podia antes. Nós não vamos conversar sobre política, mas nós vamos conversar sobre racismo sistêmico, o que eu experienciei por 10 anos que eu morei aqui. E está tudo bem ter que repetir para eu mesma e vamos fazer isso de uma maneira respeitosa sempre.

Apenas ter esse diálogo e ter meu marido me apoiando imediatamente… Claro, ele me apoiaria, mas eu estava tão assustada que ele poderia não me apoiar e eu acho que todos nós sabemos que somos o lugar que mantemos nos corações de nossos amados. Eu acho que nós precisamos novamente intervir no poder e dizer, “ei, essa eleição foi realmente importante para mim, esses são os motivos, as razões pelas quais me importo, se você se importa sobre mim”.

Vamos carregar juntos, vamos dividir esse fardo e fazer esse trabalho emocional juntos, porque fazer isso individualmente, em tempos como o que estamos agora, numa pandemia, pode ser algo isolador. Eu acho que muitas pessoas estão lutando com problemas de identidade e valor próprio. Então, enviar minhas ideias e essa carta para minha família, em junho, foi visto pela maioria como algo valente e corajoso. Realmente, para mim não existe outra forma de operar nessa vida além de ser eu mesma.

Do que você mais sente orgulho?

Eu tenho muito orgulho de viver pelos meus valores, apenas aparecer e decidir mudar o mundo por meio de ações diárias de amor, compaixão e gratidão muitas vezes e dias. Essas ações são para mim; e está ok, eu pratiquei amor próprio quando eu percebi o quão esgotada eu estava e precisava de uma pausa do trabalho que estava fazendo por muitos anos. Eu tenho trabalhado duro e sem parar desde que eu me formei, em 2007, o que foi durante uma recessão difícil. Naquela época, também, eu acho que eu superei muita coisa, mas eu não tive tempo para parar ou intencionalmente frear.

Quando eu deixei o Pinterest, em agosto, vim de um lugar de privilégios, claro, por parar de trabalhar durante a pandemia. Uma ação que eu não acho que todos poderiam ser capazes de fazer e eu fiz isso levianamente; mas outra vez, eu acho que foi um dos maiores atos de amor próprio que eu fiz, isso apenas abriu um mundo de oportunidades para mim, fora.

Como eu posso fazer esse trabalho mais amplamente? Como eu posso crescer com isso e aprender com novos líderes? Como eu posso inspirar outros a irem mais fundo nas agências e realmente analisar as situações? Como eles podem ver quais fatores de estresse estão envolvidos no dia a dia do trabalho e como controlar o que é possível? Nós estamos vivendo em uma época na qual existe muito pouco a ser controlado.

Ser capaz de tomar essa ação, de segui-la e realmente viver por isso — eu acho que é o que mais me deixa orgulhosa. Com sorte, um dia meus futuros filhos, os amigos dos meus filhos e algumas gerações futuras possam se inspirar nisso. Eu pensei, quando tomei essa decisão, o mundo que eu vejo começou a se revelar na minha frente, eu juro, isso foi lindo. As pessoas me paravam na rua para elogiar meu cabelo encaracolado, as pessoas paravam na rua para conversar com o meu cachorro, isso foi uma interação linda com a minha comunidade, que eu adoro.

Talvez, eu não tenha parado para acolher esses momentos antes, mas eu acho que isso acontece quando você ativa parte de sua alma. É uma coisa espiritual. Eu não sou religiosa, mas eu encontrei esse meu lado muito espiritual esse ano e estou aprendendo a acolhê-lo. Eu gosto de sentir isso e me mover através disso. Tem sido mágico.

Como latinxs e pessoas que têm o inglês como segunda língua podem se sentir mais confortáveis durante um processo de entrevista? Quais são as coisas que podem ajudá-los durante esse processo desafiador? Você tem alguma dica?

Quando eu era uma recrutadora no Pinterest, sempre que trazíamos ou tínhamos uma pessoa latinx na empresa, eu tentava construir esse processo de entrevista para ter alguém do México, talvez eu almoçaria com eles ou teria alguém do time da comunidade latinx. Então, eles poderiam, ao menos durante a hora do almoço, descomprimir e falar com pessoas talvez na sua própria língua.

Eu tenho esse exemplo específico de um grande amigo meu, Freddie, que estava viajando de Washington D.C. para a entrevista. Eu vi seu sobrenome, logo pensei que ele fosse latino. Meu amigo, que era seu recrutador, estava fora da cidade, mas eu contatei o time e disse “ei, posso dar as boas vindas a ele?”. Eu amo dar boas vindas às pessoas. Eu fui e fiz meu trabalho, nós ficamos conversando, eu mostrei para ele o local, então fomos para a sala e, ao invés de apenas cumprir as formalidades técnicas, eu perguntei para ele se falava espanhol, porque eu tinha notado que seu nome soava um pouco espanhol — ele falou que sim e nós começamos a conversar em espanhol por cinco minutos. Nós apenas aprendemos um sobre o outro. Eu sempre uso esse exemplo como uma razão, porque ele sabia que poderia ser ele mesmo, e como esse momento quebrou o gelo para ele. Isso fez com que ele se sentisse muito mais aliviado, para apenas ser capaz de ver alguém com quem ele conseguiria se conectar.

Eu acho que pessoas latinxs ou pessoas que têm inglês como segunda língua procuram recrutadores que são latinxs, afro-americanos, recrutadores que são bem abertos sobre nossa identidade. Se você vê alguém com quem você se conecta, entre em contato com eles e fale “ei, eu vou fazer uma entrevista, há alguma maneira de encontrar você?”. Ou até mesmo pergunte ao seu recrutador que você adoraria encontrar com alguém da comunidade latinx no Twitter ou no Pinterest, eles ficariam felizes em fazer isso. Nós sempre queremos oferecer isso para as pessoas, então pergunte sobre isso. Você não vai conseguir o que você não pedir e eu acho que é legal ter alguém com quem você possa de fato ter uma conversa autêntica, falar sobre o processo deles de entrar na empresa, suas experiências ou sobre a comunidade.

Uma vez que você está na empresa, eles ficarão felizes de compartilhar ainda mais, mesmo que você ainda não tenha uma entrevista lá. Entre em contato com pessoas que podem falar sua língua, se elas estão lá — e se não estiverem, apenas entre em contato com os recrutadores, mas seja consciente quando fizer isso. Eu sou muito empática, eu sempre respondo as pessoas que entram em contato comigo no LinkedIn, com exceção daqueles que falam meu nome errado ou parecem uma mensagem robótica que foi copiada e colada, com a qual eu tenho dificuldade em me conectar porque eu definitivamente sei que meu tempo é valioso também. Mas se essa mensagem for legal e estiver pedindo ajuda, é realmente difícil para mim dizer não.

Eu entrei em contato com o pessoal da minha rede que eu vejo nessas empresas, e cada uma delas me respondeu dizendo, “como posso ajudar?”. As pessoas geralmente querem ser legais, elas não querem ser babacas. Vamos construir algo sendo gentis uns com os outros. Não há nada de errado em ter um sotaque, não há nada de errado em não ser dos EUA, não há nada de errado em não ter estudado numa faculdade da Ivy League, não tem nada de errado em não conseguir o trabalho que você realmente gostaria de ter — há segundas chances. Se você se conectar e se você realmente construir relações com pessoas pelo caminho, você acabará exatamente onde deveria.

Como uma recrutadora, eu sempre digo que nós estamos construindo times, não empresas. Eu não queria construir o Pinterest; eu construí times ótimos, eu procurei pessoas que não teriam nunca se candidatado para nenhuma vaga às quais não eram qualificadas. Eu dei a elas tempo para se prepararem, eu dei a elas informações suficientes para passar pelo processo preparatório da entrevista e também um feedback. Quando não ia como pretendido ou planejado, eu acho que ser mais comunicativa com essa informação, e com tempo, isso tudo funciona no final.

Isso realmente alimenta essa grande bondade, que é a de que nós estamos todos juntos nessa. Nós não estamos competindo por dinheiro na área de tecnologia. Nós estamos apenas realmente representando, construindo e presentes como nós mesmos. Nós estamos agregando e falando com latinas na tecnologia, especificamente, eu sempre as encontro nesses eventos; e você sempre se identifica como Linda, do Pinterest, ou Thaisa, do Twitter. Eu sempre tento pensar, “a que essa empresa realmente importa?”. É ótimo identificar as pessoas para que, talvez, caso eu queira trabalhar no Twitter no futuro, poderei falar com a Thaisa, mas essas empresas não nos tornam melhores — nós estamos tornando essas empresas melhores, ao verdadeiramente aparecer e utilizar essas oportunidades.

Eu imagino que trabalho voluntário também tenha um grande papel na sua vida, você pode compartilhar conosco mais detalhes sobre sua experiência sendo voluntária?

Eu fiz um trabalho voluntário no conselho da Latinas in Tech por quase dois anos, o que foi realmente gratificante. Elas estão sempre procurando por pessoas, para até mesmo ter ideias de eventos futuros, e estão sempre pedindo feedbacks, então eu estou me voluntariando nesses tipos de organizações que são dedicadas a aumentar a representação nesses espaços.

Eu fui procurada há algumas semanas por uma idealizadora, que é uma mulher preta. Seu nome é Jules, ela fundou uma empresa sem fins lucrativos chamada AFARA, que significa em inglês “Alliance for Anti Racist Action”. Ela queria que eu ajudasse a construir a cultura para seus voluntários que estão começando e estão oferecendo muito tempo e talento para o que nós estamos tentando alcançar, que é, novamente, fazer a ponte desses diálogos entre pessoas. Eles estão tendo uma abordagem realmente multicultural, que eu amo também.

Se você não construir essas culturas de empresa intencionalmente, isso meio que apenas acontece com o tempo, então as coisas podem começar a ficar preocupantes; e se você não tem alguém para conversar sobre isso ou sente que você não pode trazer esses problemas à mesa, isso pode quebrar. Esse é o trabalho que eu sou super dedicada a fazer e eu realmente espero construir não apenas uma cultura para o time, mas a estratégia e a base de como nós iremos abordar essas experiências transformadoras.

Educar não apenas a empresa, mas também pessoas e família. Como nós podemos facilitar diálogos entre famílias pós-eleição? Como nós podemos criar mais líderes e agentes transformadores para nos sentirmos novamente empoderados e corajosos para falar “ei, família, vamos nos reunir e conversar?”.

Vamos nos dar conta de onde tudo isso está vindo e para onde nós podemos de fato conduzir isso, que é unidade. Durante o Dia dos Veteranos, eu estava pensando sobre o conceito de família com que eu cresci durante os anos; eu acho que os americanos pensam sobre as famílias dentro de quatro paredes. Eu acho, como parte de minorias mal representadas, que nós pensamos de uma maneira mais abrangente e a realidade é que eu aprendi um conceito de família por meio do meu marido e também por meio de seu trabalho no exército. As pessoas no seu pelotão, no seu treinamento, as pessoas com quem ele estava trabalhando quando estava servindo são uma comunidade enorme. Aprendi com ele também como lutar sinceramente pelo o que é certo, mas era diferente. Então, eu me corrijo, penso que isso não é verdade, porque o conceito de família não é apenas eu, ele e nosso cachorro Teddy e seus pais. É realmente maior — e isso me ajudou a expandir meu entendimento sobre aquilo também. Quando eu penso sobre família, eu penso sobre comunidade; eu acho que família podem ser pessoas que eu acabei de conhecer.

Eu acho que existem tantas organizações que precisam de apoio neste momento, não apenas financeira, mas é sempre bom dar junto. Se você pode ajudar esses diálogos e conviver como uma família, dê seu tempo, dê seus esforços, isso realmente abre um novo diálogo inteiro. Eu realmente sugiro às pessoas terem muitos recursos, mas apenas encontre um e envolva sua família a participar nisso. Fazer isso juntos é realmente importante, a base da comunidade latinx; eu tenho feito parte do seu círculo de doação por uns anos agora, é como uma contribuição monetária. Eu estava primeiramente meio que assustada, mas aí quando você começa a doar em círculo o impacto é tão maior. Realmente não dói nada. Dar uma olhada nessas organizações e escolher uma como família é algo que eu realmente encorajaria as pessoas a fazerem.

O que te mantém acordada à noite?

Há muitas coisas. Eu sempre fui uma pessoa apreensiva, sempre tive essa cara de preocupada desde que eu era pequena. Obviamente a COVID ainda está no topo da minha mente. Eu acho que o que está acontecendo aqui nos Estados Unidos é realmente sério, os EUA são um grande líder no continente americano; nós todos no México e Brasil estamos olhando para esse país para meio que liderar. Liderar e abrir o caminho — assim, quando as coisas não melhoram aqui, elas não melhorarão nos nossos países. Ver os números aumentando no México e Brasil, assim como pensar na disparidade lá, o que é realmente ruim aqui também. Eu sinto que existem muitas divisões, que de uma maneira colocam as pessoas na direção de sentirem ódio. Isso me deixa bem nervosa, o fato das pessoas estarem tão divididas e tão apáticas.

Eu sinto que agora as pessoas não estão percebendo que nós estamos neste país e neste planeta juntos, realmente não existe uma maneira de optar por outra coisa. Muito desse estresse talvez tenha se acumulado para não existirem esses diálogos ou talvez eu não falar no trabalho ou talvez não pedir o que é merecido. Essa uma vez, há muito tempo atrás, fez com que eu tivesse muito estresse acumulado, que eu sempre ouvia as pessoas falando “nossa, você parece estressada”. Eu tenho problemas com fertilidade, para falar a verdade, meu marido e eu estamos tentando fertilização in vitro por alguns anos e eu estou aberta a isso, porque eu sei que muitas mulheres fazem isso. Na verdade, eu tive um grande apoio de amigas que estão nessa mesma jornada. Esse era o meu caminho, e foi muito útil compartilhar isso, porque eu não me sentia sozinha.

Estou começando a fazer as coisas por mim e começando terapia. Apenas tirando um tempo intencional para me curar e me recuperar; e também para usar minha voz e continuar sendo uma defensora de criar esse mundo que eu realmente quero. Nós vamos começar um novo ciclo muito em breve, sobre o qual eu realmente estou animada, mas eu me preocupo muito de meus filhos não terem orgulho da herança cultural deles, que eles apenas queiram focar em uma parte de suas identidades, que, em algum momento, eu perdesse minha energia e me tornasse apática, dizendo, “está tudo bem se você não quiser falar espanhol”. Não está tudo bem para mim. Eu acho que tudo está em nós e apenas quero continuar a dinâmica que eu acho que muitas de nossas comunidades possuem hoje em dia, de cores que se uniram durante a eleição, e que estamos fazendo isso juntos.

Nós não estamos tirando o mérito de outras comunidades, nós não estamos competindo, nós precisamos encontrar unidade, não apenas com comunidades de cor — nós precisamos de aliados e companheiros para fazer isso e apenas rezar para que nós tenhamos resistência para continuar. Isso é uma parte do que nós falamos sobre autocuidado, primeiro a máscara de oxigênio. Esse não será o primeiro ano ruim que teremos, nós temos feito muitos danos ao planeta, e eu acho que haverá muito o que curar nessa questão também. Além disso, a respeito de nossas comunidades, disparidades, injustiças e muita correção, isso poderá ser doloroso para muitas pessoas, mas acho que eu apenas quero que todos mantenham o ritmo e encontrem esperança. Como meu amigo Jabari disse outro dia, nós devemos continuar escolhendo a esperança — e eu realmente quero que nós continuemos escolhendo a esperança.

Espero que você tenha gostado desse podcast. Nós teremos mais entrevistas com líderes Latinxs incríveis toda primeira terça-feira do mês. Confira nosso site do Latinx in Power para ouvir mais. Não se esqueça de compartilhar comentários e feedback, mas sempre com gentileza. Te vejo em breve.

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Thaisa Fernandes
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