Sobrevivemos ao nosso primeiro ano. E agora?

Eduardo Missaka
Launchpad
Published in
7 min readApr 22, 2019

Uma vez li em um artigo que grande parte das empresas não sobrevivem durante seu primeiro ano de existência. Confesso que, em minha ingenuidade de (quase) Administrador, sempre achei que se tratava de um caso de amostragem ruim: grande parte dos negócios era construído sobre alguma ideia medíocre e uma execução ainda pior.

Um ano se passou desde que li aquele artigo. Não muito tempo depois, juntei-me a dois amigos engenheiros para vender nosso primeiro projeto de software. Honestamente, foi tudo uma grande aposta: eu não programava nada na época e meus sócios, apesar da excelente formação, nunca tinham desenvolvido um produto similar ao que vendemos. A experiência toda foi bem caricata, com direito à roupa social, cartão de visitas improvisado e catálogo mais improvisado ainda. Conseguimos. Começamos a aprender o que supostamente deveríamos desenvolver naquele dia. Uma receita para o desastre, não?

Tudo, porém, deu certo. É claro que não é aquele tipo de certo. Não o nível Rolex, Apple ou IBM de certo. Estava mais pro nível Edu de certo: funcionava em condições específicas de uso, mais ou menos de acordo com o escopo e com uma entrega ligeiramente atrasada.

Brincadeiras à parte, após alguns rounds de café, planejamento e programação, conseguimos entregar o projeto para o cliente de acordo com as especificações presentes no contrato. O cliente ficou feliz e nós também. Era a primeira vez que conseguíamos emitir uma Nota Fiscal. Agora, até a Receita Federal reconhecia a gente como algo sério e digno de ser devidamente cobrado pelos impostos. Nossa primeira vitória.

Eis que surge a possibilidade de fazermos um segundo projeto. Aprendemos com todos os erros do primeiro e implementamos uma série de mudanças em nossa forma de atendimento e execução. Metade do atraso e apenas alguns bugs, uma grande evolução em relação à nossa primeira experiência com projetos de software.

Com o final de nosso segundo projeto, o que antes eram 3 amigos tentando arranjar dinheiro para o fim de semana de repente acabou se tornando o que somos hoje. Novos clientes foram chegando e indicando amigos, tia, papagaios, empresas, sindicatos, etc. Cada um vinha com um novo problema de tecnologia específico a ser resolvido, capaz de aumentar em grandes números a produtividade e o valor gerado por suas atividades.

Desses problemas nasceu a Espresso Labs. E resolvendo eles nos tornamos o que somos hoje: uma casa de software totalmente focada em suprir a necessidade do cliente através de aplicações de alta qualidade.

Nesse mês a Espresso (pros íntimos) completou um ano. Sobrevivemos à burocracia, aos custos, aos prazos, aos fornecedores ruins, as parcerias infrutíferas, aos erros, ao ambiente econômico, à impressora que funciona as vezes, entre uma série de outros desafios. Arrisco-me dizer que sobrevivemos bem tendo em vista que nossa equipe cresceu de 3 à 14 pessoas em pouco tempo. Do lado financeiro, a situação parece igualmente promissora: estamos confortáveis (mas atentos) com nosso fluxo de caixa até o final do ano. Tudo isso sem nenhum centavo de caixa inicial.

Como fundador de empresa, sinto-me na obrigação de revisitar o artigo que li e entendê-lo com o viés da “experiência do primeiro ano”. E como hoje em dia raramente temos tempo até mesmo de aproveitar o café, resumi os principais aprendizados que tivemos em uma lista a la Buzzfeed. Espero que essa lista possa contribuir para alguém que, como eu, tremia ao assinar o primeiro contrato social da empresa.

O tempo é curto demais para se importar com conteúdo ruim.

Esse insight veio de uma pessoa que considero como exemplo em gestão de empresas de TI. Recebo diariamente uma série de recomendações de livro que vão desde espiritualismo até teses de doutorado. Aprendi que, para tudo que tange trabalho, deve existir um filtro: qual é a aplicação dessa leitura no meu trabalho cotidiano? Qual é a qualificação do autor para falar a respeito do assunto? Quais resultados tangíveis o autor conseguiu trazer?

Sobre esse tópico, é importante um adendo: estou falando apenas de livros com foco em produtividade. Sou particularmente eclético em minhas leituras pessoais, porém, para livros relacionados ao trabalho, utilizo o princípio de comprar o conjunto da obra e não o livro.

Sem você, a equipe sobrevive. Sem a equipe, você morre.

Existe um ditado na Administração que diz que sem um CEO a empresa provavelmente sobreviverá durante alguns meses. Se resolvermos manter o CEO e remover os analistas, porém, é bem provável que a empresa morra no dia seguinte.

Acredito que se trata de algo verdadeiro. Valorize cada um de seus funcionários, porque são eles que movem sua empresa. Não existe Missão, Visão e Valores se não há gente competente para colocá-las em prática.

Marketing não é mágica. É função de investimento.

Já escutei muitas promessas sobre as maravilhas do marketing de conteúdo e devo dizer que fiquei um tanto desapontado. Por alguma razão, as pessoas tendem a acreditar que, para conseguir acessos, basta ter um conteúdo de qualidade e magicamente uma legião de leads qualificados irá aparecer em sua porta implorando para ser atendido.

Tivemos algumas experiências utilizando várias estratégias de inbound. A realidade é que tivemos muito mais resultado utilizando as ferramentas tradicionais, como o Ads.

Acredito que o hype que existe em torno do desse conceito gira em torno de duas principais razões. Em primeiro lugar, existe a ilusão de que não custa nada fazer um bom conteúdo. Essa visão é predominante em startups e pequenas empresas, que não levam em conta o custo do tempo na hora de calcular o ROI.

A outra razão é que, supostamente, seria algo inovador no mercado e uma tendência em grandes empresas. Não nego que, em minha limitada experiência trabalhando em multinacionais, tenha visto boas estratégias de inbound com base em conteúdo. No entanto, também vi que o inbound era sempre acompanhado de um investimento pesado na aquisição de consumidor (CAC), muitas vezes superior a 50 reais por novo usuário. Olha que estamos falando de um mercado B2C e não B2B, como no caso da Espresso.

É claro que falo da minha experiência pessoal e que posso ter sido a exceção da regra, porém ainda não vi uma empresa triunfar apenas utilizando conteúdo. Se funciona para você, ótimo! Mas, infelizmente, para mim, a verdade continua sendo que não existe marketing sem investimento, nem que seja para impulsionar sua campanha de tráfego orgânico.

Não dá pra pensar em longo prazo sem pagar a conta de luz.

Pensar no longo prazo é lindo: falar de estratégia, de SWOT, de Forças de Porter, Matriz BCG, etc. Difícil mesmo é vender seu peixe para conseguir pagar os custos do barco. Não recomendo a nenhum empreendedor discutir o longo prazo sem antes pensar no que vai fazer a curto prazo, porque, infelizmente, as contas de luz, de coworking ou de marketing não esperam sua ideia explodir para aparecerem na sua porta. Por bem ou por mal, elas estão sempre com você.

Nesse sentido, é válido fazer uma reflexão: quais são as prioridades dessa semana? Desse mês? O caixa está baixo: o que devemos fazer? Temos um funcionário insatisfeito: qual o problema? Quais são os riscos jurídicos que a empresa corre atualmente?

Todas essas perguntas (e mais uma infinidade de outras tão complexas quanto) devem ser resolvidas antes de você marcar a sala de reunião para discutir seu Planejamento Estratégico do ano que vem.

A escassez é o melhor driver de crescimento.

Durante um curto período de tempo, trabalhei em algumas grandes empresas que recebiam generosos aportes de investimento. Investimento esse que ia para algumas iniciativas de caráter um tanto duvidoso. Custo nunca era um problema e esse, para mim, é um dos erros mais graves que um administrador pode cometer.

A constante pressão dos recursos limitados é o melhor mecanismo para incentivar o controle de custos e o aumento de faturamento. A escassez nos lembra o porquê de estarmos ali e nos força a pensar em formas criativas de enfrentá-la. É uma força que te tira constantemente da zona de conforto, afinal, não fazer nada significa a morte.

Gastar dinheiro dos outros é fácil. Difícil é gerar valor positivo para a sociedade.

Talvez esse tópico seja uma conclusão lógica para o assunto anterior. Infelizmente, o que vejo no mercado de startups é exatamente isso: um monte de empresas com cash flownegativo, que servem mais como case para PR (Relações Públicas) que como investimento financeiro.

Exemplos? É só entrar no Kickstarter. Ou ler a notícia sobre o fechamento da Juicero. Ou sobre o Ouya.

Muito marketing, pouco resultado. Quando não se tem compromisso com o dinheiro dos outros, é bem fácil parar de escutar seu cliente e passar o dia dando entrevistas.

Cada número conta uma história e pessoas gostam de histórias bonitas.

Nós, empreendedores, temos um problema: sempre que nos perguntam como está indo a empresa, temos um número grande na manga para disfarçar o real desempenho. Não é por mal: trata-se de uma história que contamos a nós mesmos para dormir um pouco mais tranquilos.

É difícil saber a real situação de uma empresa quando você tem uma fonte que, por definição, não é precisa. Uma coisa é escutar que a empresa faturou milhões, outra é, de fato, olhar o BP ou a DRE e chegar a uma conclusão empírica.

Mês passado, escutei de um amigo que sua empresa estava indo bem, afinal, havia movimentado mais de R$ 100.000,00 durante aquele mês. Na hora, dei os parabéns e fiquei positivamente surpreso com a notícia, já que há meses ele estava lutando contra o mercado.

Fui ingênuo. Percebi que ele falava de GMV (valor total transacionado em plataforma) e não de Receita. Sua taxa média nas transações era próxima de 7% e eu liguei os pontos: a empresa ia de mal a pior e, com certeza, faltou dinheiro para pagar as contas do mês.

Isso é apenas um exemplo de como é possível contar histórias diferentes através de uma assimetria de informações. Cada número conta uma história e, se analisado isoladamente, diz muito pouco sobre algo complexo como uma organização.

O melhor conselho é aquele que faz sentido para você.

Serei bem direto: não existe receita para o sucesso. Qualquer pessoa que tente te vender isso é, claramente, autor de algum livro de autoajuda ou possui alguns problemas com o próprio ego. O que podemos discutir são experiências individuais, isoladas e que podem funcionar até determinado ponto para um nicho de mercado bem específico.

Quem tem que descobrir o caminho é você. Isso significa questionar cada ação, cada ideia e cada conteúdo que você encontra no processo.

Inclusive este texto.

--

--