a barca que vai lá na baía
Me lembrei da barca que retorna à Paquetá num fim de dia de semana, naquela serenidade cansada de um dia que decorreu sem surpresas. Ali se trocava o humor da alma.
Nos mais ou menos 40 minutos do catamarã, a vida tranquila acontecia entre as infindáveis fileiras de bancos. O grupo que joga cartas ao fundo, as senhorinhas que trocam reflexões sobre suas famílias, as crianças soltas, o vendedor de balas e biscoitos, o mar sujo, mas belo e plácido, a monumental estrutura da ponte Rio-Niterói do lado de fora, os barcos, os navios, o avião.
Tudo que era singelo e feito banal convergia ali, até que ia se aproximando do seu porto final, na fundura da Baía, onde, antes calmos, os corpos se tornavam ansiosos e inquietos. Recolhem as cartas, catam as bolsas, chamam pelas crianças, puxam pela coleira os cachorros que podiam partilhar a embarcação, aglomeram-se todos na saída e, tal como bois, saem em desritmada sintonia quando abrem as porteiras.
Essa interrupção temporária entre dois solos e a certeza de que estavam seguros dentro dos limites da embarcação me mostraram uma versão de paz que eu desconhecia. Apesar de eu me afeiçoar bem às intensidades, ali aprendi que a vida é bela em câmera lenta.