Ilustração: Lucas Nóbrega

Entretenimento e Extrema direita

Live com Marcelo Alves | Disponível Aqui!

Vinicio Morais
LENS
Published in
6 min readJul 20, 2020

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O LENS — Laboratório de Pesquisa em Mídia, Entretenimento e Sociedade - recebeu, no dia 9/7, o professor da UFF/ESPM Marcelo Alves para uma conversa sobre entretenimento e sua relação com a extrema direita e discutir sobre quais são as relações criadas dentro desse ambiente.

Marcelo iniciou sua apresentação discutindo o conceito de Third Space (terceiro espaço) de Scott Wright para nos mostrar momentos importantes que passamos na comunicação política para nos localizar social e tecnologicamente para discutir o assunto. A ideia de terceiro espaço se refere a um novo espaço de conversação política na internet que aproxima as pessoas da política, mesmo que não manifeste uma real discussão sobre candidatos ou pautas nas configurações em que seria gerada produtividade. Isso se dá por dois principais motivos, ou como Marcelo intitula “viradas”.

Primeiro, Nina Eliasoph, no seu livro Avoiding Politics, fala que as pessoas não fogem mais tanto de política assim como se era entendido na década passada e em suas conversações cotidianas o assunto se torna mais comum do que se era esperado. A segunda virada é registrada por Robert Putnam, que discute o declínio das redes conversacionais das sociedades e atribui parte da culpa à emergência da comunicação de massa que vem iludindo e desacreditando as pessoas com relação ao engajamento político.

Partindo do conceito de third space para olhar a comunicação política nos espaços informais, Tim Highfield em Social Media and Everyday Politics (2016), cria uma conexão entre o ser pessoal hedonista e o ser político quando ele discute sobre selfies na cabine de votação ser um exemplo de um ato que é ao mesmo tempo pessoal e político,

é obviamente pessoal, no sentido de que se trata do individual, suas próprias ações e escolhas e sua experiência única de votação. É político, pois é um compromisso claro com uma atividade.” (Highfield)

Fonte: O Globo

Tim Highfield ainda afirma que mesmo que a selfie não seja partidária ou contenha um comentário promovendo uma campanha, ela se torna um artefato de orientação política com uma imagem que seu significado é sublinhado pelo contexto eleitoral. Marcelo Alves exemplifica a questão com as selfies que circularam na época das eleições presidenciais de 2018, com eleitores de Jair Messias Bolsonaro votando com a arma em punho.

O que leva ao próximo ponto: como as “informações” se espalham através de páginas que usam conteúdos da cultura pop e do cinema para vincular seus enquadramentos da notícia. O texto News via Voldemort, também de Tim Highfield, observa a relação entre os fandoms dos movimentos culturais (Ex.: pop, cinema) e a criação de páginas falsas de paródias (Ex.: Lord Voldemort, Estrela da morte e Rainha Elizabeth fake) que não são ligadas diretamente com política enquadram as notícias políticas com uma interpretação original e bem humorada dos eventos cotidianos. Esse diálogo com a cultura pop é responsável pela criação de uma gramática particular. A apropriação de símbolos e valores desvirtua figuras emblemáticas da cultura pop, subvertendo-as para a Extrema-Direita, criando uma figura que constrói seu próprio enquadramento de notícias sem o compromisso com a veracidade e com distorções.

Ilustração: Lucas Nóbrega

Em The Algorithmic Rise of the “Alt-Right”, Jessie Daniels fala sobre como grupos supremacistas estadunidenses sempre utilizaram tecnologias a favor de sua ideologia, a tecnologia digital cria novas fronteiras para isso e dá uma virada em temas como nazismo, racismo, supremacismo branco e levam esse discurso ao mainstream. Existem três funções que os algoritmos exercem para isso acontecer — a confirmação, a aceleração e a amplificação.

A confirmação é a ideia que os algoritmos agem para tentar compreender o perfil de pessoas que vão buscar por informações e vão entregar sites que fornecem opiniões pré-datadas e com conteúdo que confirma os vieses. A segunda função que os algoritmos potencializam é a aceleração, ou seja, a possibilidade de disseminação de ideias em alta velocidade, e a terceira é a amplificação, pensar os sistemas midiáticos de forma híbrida, a ideia de que as estratégias que não funcionam de forma isolada, mas surgem em grupos específicos (4chan, Reddit, Grupos de whatsapp) com função de se articular em todas as redes e atingir a “grande mídia” para sair em matérias jornalísticas, na imprensa tradicional, ou seja, tirar algo do 4chan e levar para o twitter e tirar do twitter e levar para o mainstream.

Revisionismo

Os cloaked websites consistem em uma forma difundida de ação por parte da Extrema-Direita, é basicamente a falsificação do discurso para confundir as pessoas, uma propaganda intencionalmente disfarçada e anônima que emula uma agenda política. Marcelo cita um exemplo que Daniels fala sobre o site “martinlutherking.org” que foi um domínio comprado pela KuKluxKlan para criar um site que parecesse com uma plataforma real de informação mas distorciam o conteúdo e criavam uma história falsa para difamar o Martin Luther King. E aqui no Brasil, esse processo de tentativa de reinventar a história a gente consegue ver com a ditadura.

Neste ponto, Marcelo fala sobre a ideia de janela de sobretom (Overtone window)— que é o limite do aceitável. Processo no qual se avalia de forma estratégica o limite do que se pode dizer e sustentar discursivamente de forma pública para que se possa correr abertamente na mídia, um processo de negociação para tentar alargar essa janela ("esticar a corda").

Outro conceito interessante para compreender esse fenômeno é o de Edgelord. Rodrigo Nunes utiliza-o para discutir o discurso do ex-Secretário de Cultura Roberto Alvim, quando ele testa o limite do aceitável ao usar a estética e o discurso nazista na propaganda do Estado Brasileiro, o que foi considerado uma quebra de fronteira: tenta alargar a janela do aceitável mas rompe a barreira e choca, o que resulta na excisão de Alvim do grupo, pois para funcionar esse processo precisa ser feito de forma mais sutil.

Angela Nagle, em Kill All Normies (2018), discute o fato de a Extrema-Direita subverter e se apropriar de símbolos da elite para transformá-los em seus próprios símbolos com objetivos de generalizar e normalizar o machismo, racismo e todo o discurso de ódio através da linguagem humor e dos memes. Um exemplo dessa utilização foi o Pepe The Frog, que a Alt-Right americana extraiu o personagem de um cartoon e o transformou em um símbolo da supremacia de ódio americana.

Um dos últimos tópicos discutidos por Alves é a ideia de redppiling, que se baseia em uma alegoria do filme Matrix, onde tomar a pílula vermelha (Red Pill) significa sair da simulação da matrix e ver o mundo real. Uma ideia professada pela Extrema-Direita para mostrar que conseguem observar a realidade que acontece na política e que isso os torna detentor da verdade, criando um comportamento de seita ao oferecer a pílula vermelha a outra pessoas, Marcelo Alves demonstra em sua fala que essa simbologia é bastante difundida no contexto da Alt-Right e da Extrema Direita brasileira, tanto no Facebook quanto em canais do YouTube.

O assunto é extenso! Para saber mais detalhes sobre o assunto, assista a gravação da live íntegra no YouTube, clicando abaixo. Não deixe de se inscrever no canal e nas redes sociais do LENS!

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