Mara, o Demônio do Sono

e como o gênero de horror é influenciado por suas próprias histórias.

Clara Dantas
LENS

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AVISO: Este texto contém spoilers de Mara; O Chamado; e Mama.

Mara é um filme de terror dirigido por Clive Tonge, lançado em 2018 e que parte de uma premissa bem simples: a existência de uma entidade sobrenatural que paralisa e ataca a vítima durante o sono.

À primeira vista, é impossível não lembrar de Freddy Krueger em A Hora do Pesadelo — um antagonista tão icônico que inclusive é citado diretamente no enredo. No entanto, estamos aqui para revisitar outras obras que, com certeza, também tiveram sua influência.

O Chamado (2002)

O filme nos apresenta Samara Morgan, uma garota com poderes paranormais que, após sua morte, persegue todos aqueles que assistiram sua fita amaldiçoada, matando-os após 7 dias.

Samara (que é uma versão americanizada de Sadako Yamamura, do original japonês Ringu, de 1998) representou um marco nos filmes de terror. Suas vestes brancas, em contraste com os longos cabelos escuros cobrindo o rosto, fazem parte de uma caracterização básica, mas que assusta até hoje.

Além disso, sua forma de locomoção — que remete à maneira como a garotinha tentou escalar o poço, pouco antes de morrer — não só causa estranheza, como também faz parte da identificação da personagem.

Mama (2013)

Mama, em vida, se chamava Edith Brennan e era paciente em um asilo. Através de um flashback, vemos sua fuga da instituição (carregando o filho recém-nascido) e a decorrente perseguição por parte das autoridades. Sem escapatória, ela decide se jogar de um penhasco, com a criança em seus braços.

A culpa guarde esta informação — pela morte de seu bebê a converteu em um espírito perturbado, que possui um instinto maternal (ainda que duvidoso) e uma certa obsessão por aquelas que acolhe como filhas.

Semelhanças com Mara

As referências a O Chamado não se limitam apenas à figura ou ao “andar” de Mara:

  1. Em uma das mortes, notamos uma televisão ligada mas fora do ar, assim como aparecia na fita amaldiçoada de Samara;
  2. Nos dois filmes, as vítimas passam por “fases” em uma linha cronológica aterrorizante, desde o primeiro contato até o ataque final (em O Chamado, são 7 dias até a morte e em Mara, são 4 estágios);
  3. As vítimas sonham com as entidades e são marcadas fisicamente por elas (Samara deixa hematomas e Mara, uma mancha vermelha em um dos olhos);
  4. Seus próprios cadáveres, por fim, ficam retorcidos, desfigurados, em posições não-naturais e com uma permanente expressão de pavor.

Já em relação a Mama, além do corpo demasiadamente magro e disforme, percebemos a culpa como denominador comum nas narrativas, visto que em uma, é o sentimento que atormenta o espírito; e em outra, trata-se da condição determinante para definir se haverá morte ou não.

Curiosamente, toda essa relação de conformidade está explícita desde o primeiro momento, refletida através da combinação entre os nomes:

Mama + Samara = Mara.

O que isso quer dizer? O gênero horror está fadado à repetição?

Não necessariamente. De fato, há semelhanças entre as personagens, mas cada uma delas possui um passado e, consequentemente, uma motivação diferente para atacar. Se verificarmos e compararmos obras dentro de qualquer outro gênero (ficção, ação ou romance, por exemplo), também encontraremos similaridades. É compreensível — e até esperado — que boas histórias se utilizem de fórmulas afins.

O fato de Mara fazer referência a obras anteriores ao seu lançamento pode ser visto, inclusive, como uma forma de cativar os fãs de horror, que consomem mídias advindas do gênero e notam as alusões como uma espécie de easter egg. Ou seja, conversa diretamente com seu público.

Uma coisa não se pode negar: todas as três cumprem bem seus papéis tenebrosos, sendo capazes de transcender seus próprios universos e imergir em nossos pesadelos.

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