Por que ler o que eu escrevo?

E por que eu quero ver o que sai daí também

Leonardo Ritta
Leonardo Ritta
3 min readJun 19, 2020

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Sempre me pergunto qual a reação das pessoas quando a Medium avisa que eu postei um texto novo. Não por vontade de ter sucesso, mas para saber o que provoca nas pessoas aquilo que eu fico maturando dentro da cabeça.

Ainda não sigo muitas pessoas, mas tenho uma sensação boa quando o aplicativo me avisa que postaram algo novo. Algo que saiu das entranhas, que podia estar há dias sendo germinado ou que saiu dum soco só. Nunca se sabe. Pode vir um poema, um ensaio, um tutorial, um diário.

A internet, apesar de todos os problemas de ser, ainda, uma terra sem lei, vem sendo uma plataforma razoavelmente justa de divulgação de conteúdo. Embora quase 40% dos domicílios brasileiros não tenham acesso a internet, sabemos que o alcance do que se produz online é bastante grande.

E o pessoal parece gostar de experimentar. Pelo visto, agora todo mundo virou escritor, fotógrafo, designer, poeta, cozinheiro, decorador, degustador de alguma coisa.

E sabe qual é o problema desse movimento? Nenhum.

Todo mundo já deve ter ouvido alguém dizer algo como “já pensou se o cara que vai descobrir a cura do câncer tá lá num vilarejo no meio da Índia, sem acesso a nada?”. Pois, apesar de parecer ser verdade, podemos adequar a uma realidade um pouco menos mirabolante: já pensou quanta gente talentosa por aí não tinha coragem ou sequer meios de divulgar o que faz? Agora a gente tem uma rede que funciona razoavelmente bem para o usuário médio. Custa caro -todos os nossos dados e uma fotografia clara das nossas cestas de consumo-, mas o usuário parece estar disposto a pagar a conta.

Pensar em algo que ache digno de compartilhar é difícil e exige algum nível de desembaraço. Eu resolvi escrever novamente (depois de um blog tosquinho e muito útil na época de colégio) mirando o processo e não o resultado. O exercício frequente da escrita faz bem para a minha organização mental e, de quebra, talvez eu possa compartilhar assuntos interessantes sobre tópicos (nem tão) interessantes também.

Não significa que eu seja o alecrim dourado a ser laureado com o Nobel da Literatura. O que eu busco é mostrar para as pessoas que têm a paciência de me ler que, dentro dessa cabeça de cabelo grosso, há fumaça. É uma forma de me conhecer e de filtrar se algo que eu falo entra em harmonia com o que quem me lê pensa.

É por isso que eu vibro com a criação de amigos e de conhecidos. Fotografia, poesia, culinária, marcenaria, absolutamente tudo que possa mostrar um pouco mais da expressão de quem se dispôs a sair da toca.

Existe, por fim, uma virtude intrínseca naquilo que é feito por gente comum. Esse conteúdo (sendo ele bom ou nem tanto) nos ajuda a forjar nosso gosto, a entender o que nos toca e o que não mexe conosco. Aos poucos, nos introduz a outras formas de criação. As pessoas que criam geralmente foram inspiradas por grandes nomes das suas respectivas áreas e poderão ser o elo que liga esses nomes com um público ainda mais diverso. É uma alimentação natural deste ciclo.

Cortázar disse, numa conferência, que

“no se le hace ningún favor al pueblo si se le propone una literatura que pueda asimilar sin esfuerzo, pasivamente, como quien va al cine a ver películas de cowboy”.

Se não sairemos lendo Hegel assim, de largada, talvez possamos começar lendo o que nosso colega tem a dizer. Afinal, entendemos melhor quem fala a nossa língua.

Há muita coisa boa sendo feita, e cada vez mais coisa boa sendo compartilhada. Todo mundo, de repente, virou fotógrafo, cineasta, escritor.

Que bom!

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Leonardo Ritta
Leonardo Ritta

Para escrever bem, é preciso ter a coragem de escrever mal.