A pergunta que nenhum anarcocapitalista consegue responder

Esse texto do Izzy Nobre é a maior humilhação aos anarcocapitalistas que eu já vi. Com um exemplo simples e bem humorado ele expôs o maior tendão de Aquiles do anarcocapitalismo: o Estado SEMPRE vai existir!

Liberais Antilibertários
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3 min readApr 30, 2020

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E isso é um fato decorrente da própria DEFINIÇÃO de Estado. Enquanto houver contendas entre pessoas que não assinaram um acordo prévio especificando como tal contenda deveria ser resolvida, o Estado vai existir. Se a definição de Estado é a de que é uma instituição que obriga as pessoas a agirem de certo modo (mediante leis, punições, etc.), então sempre que houver uma ação restringida por um órgão coercitivo, partindo do ponto de vista da pessoa restringida, esse órgão está, na prática, fazendo o papel de um Estado. Afinal, este órgão esta obrigando-a a agir de modo que ela não queria. E isso independe do fato de que, do ponto de vista de outras pessoas, este órgão seja apenas uma agência de segurança contratada.

Tomando a definição de Hans-Hermann Hoppe de Estado [1], o problema acima exposto fica ainda mais evidente: Estado seria, segundo ele, toda instituição que detivesse o monopólio da resolução de conflitos em certo território. Bom, a pergunta natural subsequente à essa definição (e que surpreendentemente Hoppe não respondeu) seria: qual o tamanho territorial mínimo um agente monopolista de resolução de conflitos deve ter para ser considerado um Estado? Seria o tamanho de um bairro médio de alguma metrópole? Ou o tamanho de uma casa? Um membro da família que detém a última palavra naquela família, e que portanto obriga muitas vezes seus demais membros a agirem de modo que eles não gostariam, pode ser considerado a encarnação de um Estado? Ou a definição de Estado, na verdade, estaria em função do número de pessoas sob o guarda-chuva jurisprudencial do monopolista, e não em função da sua área de abrangência? Qual o número mínimo de pessoas que um Estado poderia abranger? Como já dito acima, Hoppe não respondeu tais perguntas, e se deu por satisfeito com a sua definição para construir toda uma teoria ética (como se elas não precisassem ser respondidas!).

Talvez foi tendo esse problema em vista que Robert Murphy — um anarcocapitalista de qualidade muito inferior a Hoppe — afirmou que na sociedade anarcocapitalista todas as ações seriam regidas por contratos prévios, não havendo, portanto, nenhum caso em que punições conferidas a certos membros da sociedade já não tivessem sido aceitas previamente por aquele membro em determinado contrato. Mas como pode uma teoria social depender de fundações tão erráticas? Sério que ele pensa mesmo que não haveria NENHUM caso de contenda cujos agentes não tivessem feito nenhum acordo prévio para decidir quanto à resolução de tal contenda, de modo que qualquer punição a um deles fosse considerada coercitiva? Mas isso é de uma ingenuidade abismal!

Por fim, um relato pessoal. Eu já fui anarcocapitalista por um tempo. Disciplinado. Dedicava horas por dia a leituras de autores anarcocapitalistas. Só fui perceber que tudo isso era bullshit quando me dei conta de que — caralho! — em várias circunstâncias haverá pessoas que serão coercitivamente restringidas, e que, portanto, não há nenhuma definição de Estado em que se possa ter a realização da utopia anarcocapitalista.

Tribunal privado da Nintendo julgando a fanfic hentai com a Kirby que um ancap escreveu

~ Tomas Heckman.

[1] Ver “Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo”.

Publicado originalmente em:
https://www.facebook.com/liberaisantilibertarios/posts/1890266541295094
17 de agosto de 2017

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