Desculpe, Professora, Discurso Não É Violência. Nem Mesmo Para Seus Neurônios

Os dados simplesmente não suportam a afirmação implausível de Barrett, de que discursos ofensivos dirigidos a estudantes universitários podem causar a eles dano fisiológico.

Igo Araujo Santos
Liberdade de Expressão em Debate
5 min readJul 31, 2017

--

“She blinded me with science” é uma canção maravilhosa dos anos 80, de Brit Thomas Dolby. Poderia ser a trilha sonora do artigo profundamente falacioso da Professora Lisa Barretts, que saiu no The New York Times, sobre liberdade de expressão. Ela escreve:

“Palavras podem ter um poderoso efeito no seu sistema nervoso. Certos tipos de adversidade, mesmo aqueles que não envolvem contato físico, podem deixá-lo doente, alterar seu cérebro — mesmo matar neurônios — e encurtar sua vida”.

Isso é, em partes, verdade. Sim, tudo que afeta seu comportamento, de palavras a revelações, deve ter um efeito no seu cérebro — a menos que abandonemos as bases de neurociência, de que mente e comportamento dependem inteiramente da atividade cerebral. Mas o resto é conjectura irrelevante.

Talvez discursos possam matar neurônios, mas a morte neuronal também é parte normal do desenvolvimento do cérebro. A afirmação “deixar você doente” vem de um artigo que reivindica “um crescente corpo de evidências… de que crianças criadas em famílias muito rigorosas apresentam tendências a doenças crônicas”. Sério? Houve algum experimento? Houve crianças postas aleatoriamente em famílias boas e famílias ruins e suas doenças rastreadas ao longo de 15, 20 anos? Er… não. Então, poderiam outros fatores, alem de estresse, serem responsáveis por essas diferenças? Talvez, mas uma correlação como essa não pode — não deveria — ser encarada como causal.

Isso tudo é baseado em correlações de pequenos efeitos

Os efeitos do estresse na longevidade vem de um estudo com babuínos, que concluiu: “fêmeas que passam por mais adversidades são também socialmente isoladas na idade adulta, sugerindo que processos sociais explicam, parcialmente, a conexão entre problemas em idades precoces e sobrevivência na maturidade”; “sugere”, sim; “prova”, absolutamente não. Por que alguns animais experimentam mais “adversidade” do que outros? Poderia ser algo sobre animais que também afetam sua longevidade? De novo, possivelmente “sim”.

O mesmo se aplica ao argumento “estresse afeta telômeros”, tirado de um artigo, cuja co-autora é a vencedora do prêmio Nobel de fisiologia e medicina, Elizabeth Blackburn. Diferentes níveis de estresse foram aplicados a diferentes grupos de mulheres? As mulheres foram agrupadas de acordo com o comprimento dos telômeros antes da aplicação do estresse? Bem, não. Elas foram escolhidas com base em ter uma criança saudável ou doente. Então, é só correlação de novo, e os efeitos não foram muito grandes. Além do mais, lidar com uma criança doente dificilmente pode ser comparado com ouvir uma palestra universitária com Milo Yiannopoulos.

Os dados simplesmente não suportam a afirmação implausível de Barrett, de que discursos ofensivos dirigidos a estudantes universitários podem causar a eles dano fisiológico. Em todo caso, não deveria importar: dano ou não, é irrelevante. Homens lutam por suas famílias quando estão em perigo, satisfeitos, mesmo que lutar seja perigoso. Muitos esportes são perigosos: pessoas surfam, escalam montanhas e navegam através dos mares, mesmo que esses esportes sejam arriscados — definitivamente muito mais arriscados do que as ondas sonoras emanadas por Yiannopoulos. E, ainda assim, nós participamos de esportes pelos outros “bens” que incorporam, como espírito de equipe, coragem, excelência e práticas saudáveis.

Se a academia não fosse uma paródia, Milo não teria uma carreira

O mesmo pode ser dito sobre dar atenção à Yiannopoulos. Nunca parei para ouvi-lo, mas ele, aparentemente, é civilizado, engraçado e ocasionalmente disparatado. No review de um filme, ele fez comentários maldosos sobre Leslie Jones, uma atriz de comédia afro-americana que é uma das minhas favoritas. Mas isso dificilmente pode ser qualificado como algo maior que grosseria e mau gosto.

Ele não provoca a audiência a partir para a violência. Ele não julga e condena todos os negros. Ele não grita “‘fogo’ num cinema lotado”. A recusa de várias universidade em recebê-lo mostra que há, de fato, um problema, que Barrett não consegue identificar. Yiannopoulos é necessário como um antídoto aos limites coercitivos à liberdade de expressão que existem na academia já faz alguns anos e atingiram seu pico recentemente.

A própria Barrett ilustra o problema:

“No começo da minha carreira, dei um curso que falava dos movimentos eugênicos, que advogavam pela procriação seletiva de humanos. Eugenia, em seu tempo, se tornou uma justificativa científica para o racismo. Para ajudar meus alunos a entender essa parte horrenda da história da ciência, propus que fizessem um debate dos prós e contras da eugenia. Os estudantes se recusaram.”

Há vários problemas nesse caso. Primeiro, eugenia não advogava pela procriação seletiva, que sugere algum tipo de curral de pessoas controlado pelo Estado. Eugenia era o ponto de vista que uma elite liberal e bem-educada avançou, nos Estados Unidos e Reino Unido, no começo do século XX. Francis Galton, o fundador do movimento, simplesmente apontou o que ele considerava ser possíveis problemas sociais, como a alta taxa de reprodução das pessoas pobres.

Muitos estados americanos agiram, no que agora é tratado como uma deplorável interferência nas liberdades individuais, para limitar o que viam como tendências reprodutivas ruins. E, sim, os nazistas perverteram a ideia até ficar irreconhecível. Os fatos subjacentes à eugenia são claros: várias características humanas são, até certo grau, hereditárias. O que houve de errado foram as ações compulsórias, e mesmo assassinas, que foram justificadas por esses fatos.

A academia faz eugenia mental

A preocupação de Barrett é, de fato, muito similar à de Galton. Ele queria proteger a sociedade de genótipos ruins; ela quer protegê-la do que ela considera ideias tóxicas. Ela e os outros que concordam com essa visão, obtiveram, em larga escala, sucesso. Seus estudantes simplesmente recusaram o debate, mesmo como um exercício acadêmico, sobre a desprezível eugenia.

Barrett parece considerar admirável a relutância de seus estudantes. Não é admirável; foi uma desoladora demonstração de censura social. Mostra os resultados da doutrinação, do condicionamento, que impediu os estudantes de mesmo dizer certas coisas, não importa o contexto. A resposta da classe é evidência da barreira ao questionamento livre, que deveria ter aberto os olhos da professora e seus colegas acadêmicos. Ao invés disso, ela se regozijou, mostrando que ela e seus semelhantes são, de fato, a raiz do problema.

Eles acreditam que certas ideias são indizíveis. Ele treinaram, de forma muito eficiente, os estudantes a pensar como eles. São, até, engenhosos o bastante para fazer uma leitura errada da ciência para justificar a censura proposital da liberdade acadêmica nas universidades. Mas palavras não são violência, liberdade de expressão é liberdade de expressão, e censura é censura, não importa como é posta em prática.

Artigo original: John Staddon
Traduzido por: Igo Araujo

--

--

Igo Araujo Santos
Liberdade de Expressão em Debate

Falso designer, escritor-wanna-be. Você não deve me levar a sério, mas deveria pelo menos me ouvir