Os desafios sobre o teto de gastos e o aumento do risco fiscal

Miguel Boratto
Liga de Mercado Financeiro Bauru
5 min readSep 3, 2020

Análise de Notícias (20/ago a 02/set)

Nesta publicação, analisaremos as notícias referentes às duas últimas semanas do mês de agosto, as quais foram marcadas pela tensão no governo acerca do aumento do teto de gastos, pelas incertezas fiscais e pelo rombo nas contas públicas, de acordo com a reportagem publicada pelo site Senado Notícias.

Uma das grandes preocupações foi o aumento do salário dos servidores públicos durante a recuperação econômica após o crash da pandemia, o que poderia aumentar as despesas públicas em R$ 98 bilhões, segundo a equipe econômica. Em um primeiro momento, o Governo sofreu uma derrota no Senado, com a derrubada do veto de aumento do salário dos servidores. Após articulações, Rodrigo Maia (DEM), atual presidente da Câmara dos Deputados, argumentou pela necessidade de uma sinalização de responsabilidade fiscal e o veto foi mantido pela Câmara dos Deputados, na quinta-feira (20). Foram 316 votos pela manutenção do veto contra 165 pela rejeição. O veto impede aumentos salariais e a contagem de tempo de serviço para os servidores públicos das áreas da saúde, segurança pública, educação, entre outras, até 31 de dezembro de 2021. Essa proibição de aumentos e contagem de tempo de contribuição foi exigida pela Lei Complementar 173, de 2020, em troca do socorro financeiro de R$ 125 bilhões a estados e município em razão da pandemia de covid-19.

Com toda essa preocupação sobre extrapolar o teto de gastos, o mês de agosto apresentou a primeira desvalorização mensal (-3,44%) desde março, interrompendo a sequência de altas após o crash do coronavírus. Enquanto isso, os principais índices americanos apresentaram altas acima de 7% no mês.

Banqueiros, economistas e gestores de grandes fundos de investimento compararam Bolsonaro a Dilma, temendo que o governo gaste mais do que pode e, assim, “furando” o teto de gastos. Os olhos do presidente Jair Bolsonaro cresceram sobre o aumento de sua popularidade entre os mais pobres, como divulgado pelo Datafolha. Este, por sua vez, mostrou que a popularidade do mandatário atingiu os maiores níveis desde a eleição, graças, entre outras coisas, ao auxílio emergencial. Ao perceber um aumento na avaliação popular do governo em ótimo/bom de 32% para 37%, após anúncios de programas sociais e auxílio emergencial de R$ 600,00, o Presidente começou a focar em medidas populistas. Segundo o Datafolha, a pesquisa mostrou que 44% das famílias que recebem o auxílio só possuem esse benefício como fonte de renda. O governo havia proposto somente R$200,00, mas a Câmara converteu em um valor maior, o qual tem sido pago desde março.

O Governo já lançou o Casa Verde e Amarela, programa habitacional em substituição ao “Minha Casa, Minha Vida”, criado no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A meta é atender 1,6 milhão de famílias brasileiras de baixa renda até 2024. Com foco no Norte e no Nordeste do país, este programa visa oferecer juros menores para moradores dessas regiões. O Nordeste é a única região em que Bolsonaro foi derrotado na eleição de 2018.

Paulo Guedes tenta convencer Bolsonaro e o Congresso Nacional a “rebaixar o piso ao invés de furar o teto”, após o Presidente flertar com a irresponsabilidade fiscal. Sobre a questão, o Presidente perguntou “qual o problema?” e pediu “Patriotismo” ao mercado financeiro.

Ainda sobre os programas assistenciais, o Presidente Jair Bolsonaro considerou insuficiente o valor médio de R$ 247 mensais aos beneficiários do Renda Brasil, proposto pela equipe econômica. Este programa é uma ampliação do Bolsa Família que é uma das principais apostas do governo na área social. Para bancar o custo de R$ 52 bilhões do Renda Brasil, Guedes propôs a extinção de programas considerados ineficientes, como o abono salarial (benefício de um salário mínimo voltado para quem ganha até dois pisos). Bolsonaro criticou publicamente os planos de Guedes para o Renda Brasil em um evento em Minas Gerais. O programa social se tornou controverso na visão do presidente, que está trabalhando para aumentar sua popularidade. A discordância causou o adiamento do programa Renda Brasil e gerou incertezas sobre a permanência do ministro da Economia no governo, o que fez com que o mercado financeiro reagisse mal à notícia, fechando o Ibovespa na quarta-feira (26) em queda de 1,46%, a 100.647 pontos.

Enquanto o ministro da Economia busca economizar, Integrantes das Forças Armadas com cargo no governo obtiveram aval da Advocacia Geral da União (AGU) para acumular remuneração acima do limite de R$ 39,3 mil; desde 2018, a regra poupou R$ 518 milhões. A área econômica não está de acordo com a decisão e alerta para o possível impacto nas contas públicas que esta nova regra pode causar. Em outra questão, relacionada ao orçamento de 2021, o Governo recuou e propôs na última segunda-feira (31) que o orçamento da Educação seja maior do que a verba que será destinada ao ministério da Defesa. Em discussões internas do governo, os documentos elaborados pelo Ministério da Economia previam gastos maiores para as Forças Armadas.

A entrega do orçamento de 2021 foi realizada e o governo elevou a projeção de déficit fiscal para mais de R$ 233 bilhões e, embora queira evitar o aumento de gastos para 2021, o ministro Paulo Guedes não descarta essa possibilidade.

Além disso, houve também a proposta de salário mínimo para 2021, enviada pelo presidente ao Congresso, no valor de R$ 1067,00, o que representa uma ausência de aumento real no salário mínimo pelo segundo ano consecutivo. O sutil aumento de R$ 22,00 deve repor somente a inflação de 2020.

No dia primeiro de setembro, foi divulgada a queda histórica do PIB do segundo trimestre de 2020, o qual obteve uma retração de 9,7% em comparação ao primeiro trimestre do ano. Entretanto, no mesmo dia, o Ibovespa subiu quase 3% devido à expectativa de que a reforma administrativa seja apresentada nesta quinta-feira (3) ao Congresso. A prorrogação do auxílio até o fim do ano, no valor de R$ 300,00, animou os investidores que esperam que o consumo continue movimentando a economia.

Por: Miguel Boratto

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