Libertem os mamilos do Facebook

Mariana
Lindíssima disse tudo
4 min readJun 5, 2018

O fenômeno da revolução sexual, de mãos dadas com a segunda onda do feminismo, teve início há mais de 50 anos. A nudez se tornou mais permitida e o corpo passou a ser, de certa forma, idolatrado e constantemente aperfeiçoado. A pressão estética que surgiu nessa época acabou, como tudo, pesando mais para o gênero feminino, apesar de não afetá-lo somente, e o corpo feminino se tornou um objeto a ser constantemente sexualizado, em qualquer situação. Agora, no século 21, me pergunto: Qual é, afinal, a nudez permitida? E, além disso, onde está situado nosso presente moralismo?

Em uma “sentada” apenas, podemos ver dez vezes mais conteúdo sensual do que cem anos atrás seria possível, tudo isso livremente e em websites e canais abertos ao público jovem. Desde filmes e videoclipes até simples pôsteres de filme, somos bombardeados com imagens de pessoas seminuas (em sua maioria mulheres) em posturas que poucas décadas atrás seriam consideradas sexuais demais. A moralidade se transforma o tempo todo, mas quanto exatamente? Uma ótima forma de analisar isso poderia ser através das redes sociais, mas só se ignorássemos os algorítmos e censura de material que acontecem lá.

Em meio aos recentes escândalos do Facebook envolvendo, entre mil questões, principalmente a invasão à privacidade de seus usuários e, por consequência, até alguns não-usuários, foi posto na mesa também o assunto da “censura” que a rede social estaria adotando. Embora o papo da vez tenha acabado concentrando conservadores em acusar o Facebook de ter ideais liberais e apagar conteúdos considerados “de direita”, isso não parece verdadeiro ao pensarmos em questões relacionadas a nudez, que fazem o website parecer ainda seguir uma moralidade de classe média cristã americana.

Diversos relatos de usuários expuseram essa visão machista da nudez nos ultimos anos. Recentemente, um grupo de mulheres sul-coreanas fizeram um prostesto contra a política de nudez do Facebook que tirou do ar contas de mulheres que expuseram os seios desnudos. Em uma das placas que carregavam, traziam escrito “Meu corpo não é material pornográfico”, fazendo referência à razão da exclusão de um dos perfis: o conteúdo pornográfico da foto. Os representantes da rede social decidiram manter a regra inalterada devido, segundo eles, à diversidade de usuários que a acessam. O grupo feminista, por sua vez, acusou o Facebook de estar sexualizando e objetificando o corpo feminino, de forma que não faz com o masculino, uma vez que mamilos femininos e masculinos possuem tratamento diferenciado online. Mais tarde, o perfil voltou ao ar.

Outro acontecimento cômico foi a censura por nudez, em março deste ano, do famosíssimo quadro “A Liberdade guiando o povo”, de Eugène Delacroix, presente em um anúncio publicitário para uma peça de teatro francesa. Mais tarde, a gerente do site em Paris comentou: “A obra ‘Liberdade guiando o povo’ certamente tem lugar no Facebook… Informamos imediatamente ao usuário que sua publicidade patrocinada está aprovada de agora em diante”.

Na página de Padrões da Comunidade da empresa, é possível encontrar as seguintes palavras: “ Nossas políticas a respeito de nudez ficaram mais flexíveis com o passar do tempo. Entendemos que a nudez pode ser compartilhada por variadas razões, inclusive como forma de protesto, para conscientização sobre uma causa ou por motivos médicos e educacionais. Quando tal intenção fica clara, abrimos exceções para o conteúdo. Por exemplo, embora restrinjamos algumas imagens dos seios femininos que incluam o mamilo, permitimos outras imagens, incluindo as que mostram atos de protesto, mulheres engajadas ativamente na causa da amamentação e fotos de cicatrizes pós-mastectomia. Também permitimos fotos de pinturas, esculturas e outras obras de arte que retratem figuras nuas.”

O comunicado soa irônico aos meus ouvidos ao relativizar a sexualização de mamilos femininos uma vez que essa erotização (ou objetificação) depende completamente de um contexto subjetivo. Qualquer um não poderia, afinal, publicar uma foto sensual dos próprios seios e adicionar uma frase ativista que impedisse que fosse excluída? Mais embaixo na página, o Facebook define nudez como “Genitália visivel; ânus visível e/ou imagem aproximada das nádegas completamente despidas, salvo se a imagem tiver sido manipulada em uma figura pública; mamilos femininos descobertos, salvo no contexto de amamentação, parto e momentos pós-parto, saúde (por exemplo, mastectomia, conscientização sobre o câncer de mama ou cirurgia de confirmação de gênero) ou um ato de protesto”.

Após um item focado em mamilos femininos e nenhuma citação aos masculinos e, entre a lista de conteúdo banido estranhamente subjetivo, encontrei o ítem “presenças de resquícios de atividades sexuais”, que não possui maiores explicações que isso. Anotem e me expliquem depois.

Não sou capaz de definir uma posição política do website de forma tão eficaz quanto bolsominions apoiadores de Trump conseguem, mas acho contraditório, por seus esforços em deletar discursos de ódio e apoio a movimentos de esquerda, a constante presença do Facebook em cima do muro da moral. Apoiamos o ativismo pela mostra de seios mas… não a mostra de seios, aparentemente. Mark Zuckerberg se diz idealista e pensar em um futuro melhor, mas querer agradar a todos só nós mantêm no presente, mesmo. Liberta nossos mamilos, Mark.

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