Eu Pixo Você Pinta, Vamos Ver Quem Tem Mais Tinta
Os protestos no muro são, muitas vezes, onde indivíduos privados ganham voz pública.
Assim que assumiu como prefeito de São Paulo, João Dória adotou como uma de suas primeiras medidas o início da Guerra contra os Pixos e Grafites, onde mandou que se pintasse de cinza as famosas artes de rua da cidade. A decisão agradou uma parte da população de São Paulo mas também fez com que os artistas se mobilizassem e começassem a pintar por cima das artes apagadas pelo prefeito, muitas vezes, com indiretas para o mesmo.
A pixação vem majoritariamente da população periférica, é uma forma de expressão artística que possibilita que pessoas invisibilizadas tenham voz, democratizando a arte. Os muros da cidade cinza, muitas vezes hostil a boa parte dos moradores excluídos dos benefícios da cidadania, acabam se transformando em grandes telas ao ar livre, nas quais a população da periferia consegue se fazer escutada, vista, saindo da invisibilidade incômoda. Os protestos no muro são, muitas vezes, onde indivíduos privados ganham voz pública. O que se encaixa no que Eugênio Bucci entende como esfera pública.
A cidade é para poucos, principalmente as metrópoles. É pensada pra ser assim, exclusividade das elites, da especulação imobiliária, dos que podem pagar por ela. Quando a periferia ocupa esse espaço ela se força a ser escutada e não mais ignorada. É um espaço onde denunciam as opressões que sofrem ou relatam sua realidade. Daí, o caráter de enfrentamento, resistência, apropriação, ocupação dos espaços públicos que a pixação e o grafite representam.
“A esfera pública se distingue como uma estrutura comunicacional que está relacionada a um terceiro aspecto da ação comunicativa: não se refere nem às funções nem ao conteúdo da comunicação de todo dia, mas ao espaço social gerado pela comunicação.” (HABERMAS, 1996 apud BUCCI, 2008, pág 11)
A Esfera Pública também pode ser interpretada como um espaço de sociabilidade. Quando o indivíduo da periferia pixa os muros ele vai além da linguagem, da mensagem passada, é uma busca por integração nos espaços que o exclui e hostiliza. A pixação e o grafite são canais que permitem a integração de setores sociais muito diferentes. É uma forma de unir as pontas de uma sociedade partida. Quando a elite passear nos seus carros vai enxergar a voz dos que não são vistos, vai ser afetada e atingida por uma realidade que não é a dela.
Apagar arte é apagar cultura, apagar cultura é desrespeitar o povo. A elite que comemora o ataque contra uma expressão popular que dá voz a tanta gente também é a elite que incentiva a desigualdade e a marginalização da população.
A arte do pixo é capaz de incomodar, fazer pensar, transgredir, criar espaços de sociabilidade, visto que traz pro cotidiano de classes privilegiadas um pedaço da realidade e da linguagem de uma determinada categoria social sobrecarregado com o peso da exclusão histórica e do silenciamento.
A pixação é uma forma de luta e resistência, um meio de denúncia para os que não tem privilégio na sociedade desigual.