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A renda nas redes

Clarice Nascimento
Linhagem
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4 min readJun 19, 2019

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O destino nos leva a encontros inesperados. No caminho de uma outra conversa, presto atenção nos espaços percorridos e a presença da praia com esse tema. Sento para conversar com a rendeira próximo a Beira-mar de Fortaleza e descubro outras linhagens da renda de bilro.

Raquel Campos, 32, nasceu em Mundaú mas hoje vive em Fortaleza. Assim como as outras rendeiras, a arte da renda de bilro está na família há muitos anos. Hoje, Raquel é a representação jovem da renda de bilro na cidade. Aos 7 anos, aprendeu com a mãe, Maria de Fátima, que aprendeu com a avó essa arte. Na época, a mãe não trabalhava fora, cuidava da casa e dos 11 filhos, juntamente com o pai de Raquel. A família morava em Mundaú e as rendas produzidas pelas mulheres eram uma forma de complementar a renda financeira.

A mãe, Maria de Fátima, sempre trabalhou com a renda de bilro. Ela veio morar em Fortaleza entre os anos 1999 e 2000, e ainda continua com a renda, fornecendo os produtos para a feirinha da Beira Mar e para uma loja na Avenida Monsenhor Tabosa. Nessas vendas, ela também compra as rendas de outras rendeiras de Mundaú para revender ou leva até elas a encomenda para trazer até a cidade. Já Raquel conta que veio para a capital durante o ensino médio, fez graduação em Letras e é professora de Português. Ela diz que lecionou durante muito tempo e ainda pretende voltar mas a renda é, hoje, a principal fonte de recursos.

Fazer renda de bilro é uma união de trabalho, prazer e amor / Foto: Ana Clarice

Hoje, Raquel comanda uma loja online presente nas redes sociais Facebook e Instagram. Denominada de Renda Cearense, surgiu em 2016, quando Raquel ainda dava aula, e decidiu montá-la com a mãe para vender mais e se aproximar de novas clientes. Porém, ela diz que não conseguia conciliar tantos trabalhos, principalmente pelas tarefas que trazia para casa. Quando deixou de lecionar, em 2017, ajudou o marido a montar um restaurante, que não vingou, e viu naquele momento a oportunidade de botar para frente a loja.

“Eu sempre pensei em levar pra frente esse projeto da renda ai eu comecei a focar [em 2017], disse ‘não, eu vou continuar no meu projeto que eu tinha das rendas’. [D]ai eu pensei no nome, antes era Raquel Campos e [lá na página] eu colocava as rendas ai eu pensei no nome Renda Cearense, mandei fazer logomarca, ai eu comecei a trabalhar fotos e eu faço.”

Segundo a rendeira, sua intenção é exportar a renda de bilro cearense para o mundo. Ela afirma que muitas pessoas fora do Estado apreciam a arte da renda e que, no Ceará, a renda ainda está muito presa ao passado. Raquel conta da experiência de expôr no Mercados dos Pinhões e entrar em contato com senhoras que frequentam o espaço. “Eu levo minha almofada e elas ficam ‘ah minha avó fazia’. Tipo assim, você acaba levando a pessoa a viajar no tempo, a lembrar da avó que fazia. É uma história, é uma tradição. Eu acho muito legal isso: ‘ai que legal uma pessoa jovem fazendo renda’”, comenta.

Além disso, Raquel acrescenta que a experiência mostra de perto o trabalho dos produtos. “Quando você faz e leva a almofada, você mostra como é que faz. Faz as pessoas valorizar o trabalho e vê como aquilo é feito, porque é uma coisa é algo que é feito ali a mão, com todo aquele trabalho, toda uma história por trás de uma renda daquela, é diferente de um trabalho que uma máquina faz”, afirma.

“Numa fábrica você faz uma peça e nunca… tipo assim nenhuma fábrica, nenhuma máquina vai substituir uma peça dessas, de como é feito. Pode até fazer parecido mas igual nunca vai fazer. Eu acho muito bacana isso e eu pretendo assim, o meu projeto é levar pra fora e é por isso que eu coloquei esse nome, renda cearense, porque assim é um pedaço da cultura do ceará que vai [pra fora]”

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Clarice Nascimento
Linhagem

21. Cearense, completamente escorpiana, sincera, determinada e pé no chão. Amante de livros, chocolate e praia. Escreve sobre esportes e cultura