Do algodão ao crochê: raízes de linhas culturalmente entrelaçadas

Áurea Caxias
Linhagem
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4 min readJun 19, 2019

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Nova Russas é um município de origem do início do século XX, quase centenário, que conta com aproximadamente trinta e dois mil habitantes e está situado no oeste do estado do Ceará, pertencente à região semiárida dos sertões de Crateús. Essa cidade é marcada por raízes históricas de desenvolvimento que são acentuadas na agricultura que, durantes muitos anos, teve como fonte de produção o algodão, base importante na economia da cidade. O algodão é símbolo estampado na bandeira novarussense e reflete importância na sua história. Atualmente, no elenco econômico, se destaca o crochê, que é um produto resultante do algodão. Pelo grande destaque , a cidade recebeu o título de “Capital Estadual do Crochê”, devido à popularidade do produto que recebe bastante procura.

O crochê é uma atividade artesanal, grande geradora de renda, não só para quem os produz, mas também para quem ganha a vida direta ou indiretamente por meio deste artesanato. A técnica vem enfrentando dificuldades em decorrência da crise econômica, como também caindo no esquecimento e desvalorização por parte da sociedade. Esse artesanato é feito com linha e agulha pelas mãos habilidosas e talentosas das crocheteiras, que, geralmente, aprendem essa arte desde sua infância e assim a repassam de geração a geração.

Naquela cidadezinha, a maioria das mulheres tem um conhecimento sobre o crochê, que aprenderam com sua mãe e essa aprendeu com sua avó, desse modo geracionalmente, muitas vivem apenas da confecção do crochê, que é um dinheiro de baixo custo e pouco valorizado na cidade, as artesãs sofrem por grandes desestímulos, um deles gerado pelos atravessadores — comerciantes que compram o crochê por um preço insignificante para a venda em outras regiões do país, onde o produto é mais valorizado e vendido por preços mais elevados.

Oito décadas entre linhas

Dona Maria Alves da Silva desde os seus 12 anos têm o crochê como sua principal fonte de renda. Hoje, aos 86 anos, permanece incansavelmente fazendo seu artesanato. Ela nasceu na localidade de Sítio Novo, interior do município de Nova Russas, a 387 km de Fortaleza e mora há 30 anos. Viveu também na cidade de Ararendá e distrito de Cachoeirinha. Maria aprendeu a fazer crochê com sua vizinha, quando criança, observando como a mesma fazia os pontos e se apaixonou por aqueles pontos e movimentos.

Dona Maria Alves de Sousa, 86 anos.

“Aprendi com uma senhora que morou perto da gente, quando eu tinha 12 anos, aprendi só olhando ela fazer, eu sentava e ficava olhando pra ela, eu achava bonito aquele ponto duplo, que passava a ponta dos dedos, achava muito lindo até que aprendi. Um dia fiz uma agulha de pau, aprendi com uma agulha feita de pau.”

Dona Maria então, entrou para uma associação, trabalhava coletivamente com outras mulheres e lá eram feitos projetos com o intuito de serem levados para fora do país. O grupo de mulheres, criado em meados da década de 80, é a Associação das Crocheteiras Novarussenses (ASCRON), uma organização não governamental que tem como objetivo contribuir com a autonomia econômica das mulheres crocheteiras, como também fortalecê-las a se libertarem dos atravessadores e ganharem a valorização de seus produtos, além da missão de preservar valores culturais importantes para o desenvolvimento do povo de Nova Russas.

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Áurea Caxias
Linhagem

Natural de Fortaleza, mas adotada por Nova Russas. Apaixonada por flores e fotografia, movida pela luz do litoral e o verde do sertão cearense.