Terrorismo, guerras e o dilema do herói em Assombro de Chuck Palahniuk

Gabriel Vinicius
Literamais
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4 min readFeb 21, 2017

Os leitores aqui do Literamais já sabem o quanto eu adoro a literatura de Chuck Palahniuk, a ponto de sua forma de ver a sociedade me influenciar completamente. Acabei o livro dele recém-relançado aqui no Brasil, Assombro, um romance de histórias que se interligam por meio de contos e poesias.

Para resumir a história do livro, um grupo de aspirantes a escritores se reúnem em um retiro , separados de tudo e de todos, para que esqueçam de suas obrigações diárias e produzam suas obras primas que os farão famosos e reconhecidos. Até aqui sem problemas certo? Certo, se não fosse a sabotagem que os próprios participantes fazem com eles mesmos, como jogar a comida estocada fora, quebrar as lampadas, entupir o vaso do banheiro, desregular a caldeira, pois quanto mais eles se autodestruírem, mais a sociedade os acolherão, pois adoramos o horror, os desastres, as tragédias, porque necessitamos de inimigos em comum.

O ditador da Alemanha Nazista Adolf Hitler, também acreditava que o conceito da guerra perpétua era a solução para a paz perpétua.

Em um dos melhores contos da coletânea chamado “Crepúsculo Civil”, uma série de assassinatos misteriosos começam a acontecer de madrugada em uma cidade, as pessoas assassinadas tem suas faces desfiguradas, como se um caminhão tivesse passado por cima de seus rostos. Mediante este cenário e como em qualquer caso misterioso, muitos boatos começam a surgir, envolvendo monstros e bestas como sendo os causadores das mortes, até que a população descobre que os ataques são feitos por bolas de boliche, jogadas de cima dos prédios. Em uma determinada noite, um homem consegue salvar uma mulher da morte e vira o grande herói prometido, o salvador, todos festejam seu nome, ele fica famoso, mas o que ele não imagina é que no fundo a sociedade o odeia, porque ele é o herói que fara a sociedade ficar fraca novamente, porque se muitas pessoas como ele começarem a aparecer em cada canto, as pessoas voltarão a se sentir em uma falsa segurança, voltando para as perigosas ruas. A sociedade não precisa de heróis, porque se eles existirem, os inimigos em comum, os indivíduos odiados que unem a sociedade em torno de uma causa irão desaparecer, fazendo com que algo pior aconteça, a sociedade entre em guerra contra si mesma. Thomas Hobbes, filósofo inglês dizia:

“ Durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de os manter a todos em respeito, eles se encontram naquela condição a que se chama de guerra; e uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens.”

O lema do partido INGSOC no clássico de George Orwell, 1984, já usava o conceito de que GUERRA é PAZ

Um caso bem atual no cenário político internacional é a relação entre EUA e Rússia. Mesmo que ambas estivessem lutando na Síria contra um inimigo em comum (Estado Islâmico), ambas sempre procuravam desculpas para ficarem se cutucando, imagina se a atenção de ambas estivessem completamente voltadas para a suas rixas particulares? Enquanto o EI for um inimigo em comum de EUA e Rússia, eles estarão mais ocupados em delegar tempo para brigas entre si e convenhamos que uma guerra contra o EI é muito mais “interessante” que uma guerra entre duas potências nucleares.

Imagina uma guerra entre as duas. OS EUA com 6970 ogivas no total e 1750 ativas e a Rússia com 7300 ogivas no total e 1790 ativas.

Infelizmente necessitamos de inimigos em comum, de um mal necessário, para que nos lembremos de nossa humanidade, de que somos iguais uns aos outros, para que nos ajudemos e nos mantenhamos vigilantes.

“Era justamente um herói, um messias, o que não queriam. O imbecil idiota que havia salvado uma vida que não era a dele. O que as pessoas queriam era um sacrifício no intervalo de alguns dias, alguma coisa para jogar no vulcão. Nossa oferenda constante ao destino aleatório.”

“ — O que interessa — diz a Irmã Justiceira — é que as pessoas precisam de um monstro no qual acreditar. Um inimigo de verdade, terrível. Um dos demônios em oposição ao qual elas se definam. Se não, somos só nós contra nós.”

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Gabriel Vinicius
Literamais

Graduando em Ciências Econômicas na Unicamp e aficionado em Ficção Científica