A despedida…
Encontrava-se parado naquela esquina havia muito tempo, não sabia direito o que lhe aguardava. Na última vez que foi dada a chance de vê-la, não pôde perguntar nada. Não teve coragem para fazê-lo. A chuva, que antes trazia uma sensação de quase acalento, aumentava segundo após segundo, seus olhos perdidos não tentavam lutar contra a água. Desde que pudesse habitar mais uma vez o mesmo lugar que ela, tudo estaria bem. Sua camiseta branca e seu tênis estavam encharcados, o céu anunciava uma espécie de música alta quando se sentou no banco sujo e ainda mais molhado do que o que vestia.
Quando a criatura apareceu e começou a se aproximar, os olhos dele faiscavam de tanto que brilhavam. Andava descalça e com um vestido longo e branco, os fios de seu cabelo estavam perfeitamente colocados em seus devidos lugares como se sobre ela a chuva não tivesse efeito.
Havia levantado assim que a avistou e agora podia sentir a respiração dela e um hálito fresco e doce, na mesma medida que mortal, saindo de sua boca sempre que ameaçava falar. Já devia saber que não ficaria ali por muito tempo, mas cultivava mais esperanças por ela do que por sua própria vida.
- Vim me despedir.
Buscou as palavras certas, mas foi interrompido pelos dedos da mão dela cobrindo sua boca.
- Hoje só eu falo.
A criatura, que era considerada como um demônio por todos e vista como um anjo por ele, colou os dois corpos e o conduziu para sua última dança. Não precisava saber fazer nada porque ela sabia fazer tudo. Giravam pela chuva até o permitir que caísse sentado ao banco. Logo acabou com o espaço que passou a existir entre eles e sentou-se também.
Deu aquele que seria o último e também o primeiro beijo. Sabia que estava selando um pecado e que a partir do momento em que os seus lábios feitos das chamas do inferno o tocaram, havia o condenado a morte e lhe entregaria a ela pessoalmente.
Quando o beijo chegou ao fim, olhou-o uma última vez. Sentiria falta daquela face, tão pura e tão curiosa.
- Preciso ir embora, mas ela não demora a vir te buscar.
Saiu andando pela rua ainda mais devagar do que quando chegou. A observava sem conseguir dizer uma palavra, sentia-se fraco como se tivesse levado consigo sua vida. Ansiava por saber quem estaria vindo buscá-lo. Não recusaria. Iria a qualquer lugar desde que lhe fosse concedido o poder de ver aquela criatura pecadora, mas angelical, novamente.