O Bloqueio à Fantasia

carolina b. feltrim
literato

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Por anos, o mercado literário de fantasia foi rejeitado no Brasil e o menosprezo ainda sofrido não é uma novidade para ninguém. Apesar de obras fantásticas — no sentido de fantasioso — estarem cada vez mais consolidadas em meio ao público juvenil, não é incomum encontrar algum leitor autointitulado como “mais refinado” esnobando títulos com essa temática.

Isso ocorre porque é sustentada uma opinião mal infundada de que livros de ficção fantástica servem para serem meramente comerciais, fúteis, irrealistas e sem mensagens relevantes para nossa sociedade, o que difere de livros ficcionais de gêneros como drama, romance e afins — principalmente tratando-se dos clássicos. Mas por que será que o brasileiro, especificamente, costuma pensar desse jeito? O que está por trás da desvalorização e futilização das narrativas de fantasia?

Usando a cultura anglo-saxã como parâmetro para contextualizar essa diferença, podemos perceber que a maioria das narrativas de alta e baixa fantasia que fizeram sucesso vem de autores com essas mesmas origens e, pelo bem ou pelo mal, isso não é culpa só do imperialismo britânico-estadunidense. A verdade é que as narrativas mágicas estão intimamente ligadas à cultura da narração de histórias desses povos. Como podemos ver, “As Crônicas de Gelo e Fogo”, de George R. R. Martin, tiveram inspirações reais em conflitos que moldaram a história dessa mesma região. É uma trama extremamente complexa, atualmente elogiada pela crítica.

Então qual o motivo de alguns de nós insistirmos em chamá-la de superficial?

No Brasil, como em suas referências externas na composição da literatura — que hoje temos como clássica -, são predominantes os autores que aprofundam o psicológico e o realismo. Seriam narradores intrinsecamente fincados com os pés no chão, sendo poucos os que realmente se utilizavam de histórias fantasiosas para o enredo de seus livros. Também não há problema algum nessa abordagem psicológica dos autores clássicos. Não é à toa, aliás, que carregamos o nome de um dos melhores do mundo, conhecido inclusive pelo carinhoso apelido de “mago”. Entretanto, enraizou-se um preconceito dentro dos leitores brasileiros de que as narrativas que envolvem a prática de magia sejam vistas como infantis e rasas.

Mas ora, como não enxergam complexidade em enfrentar dilemas desesperadores (como seguir uma profecia ou isolar-se no egoísmo, situações onde personagens precisam — literalmente — dar a vida para outros), buscar por redenção e fazer escolhas quase que impossíveis? A fantasia abre margens para a construção de um terreno muito mais extenso e amedrontador para a abordagem de personagens humanos, que são imperfeitos, que evoluem e que precisam fazer sacrifícios diários para alcançarem seus objetivos.

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carolina b. feltrim
literato

Autora nacional, estudante de direito, desenhista & rainha da moda nas horas vagas. Sinto, logo escrevo.